Cinema sem festivais neste ano de imagens desfocadas
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 15 de abril de 1990
E os festivais de cinema, hem?
Depois do dia 16 de março, com a extinção da Embrafilme / Fundação Nacional de Cinema e as duras imposições do Plano Brasil Novo - levando também os benefícios da Lei Sarney - ninguém mais sequer se atreve a falar em festival de cinema. Afinal, se há o lado positivo, cultural e mesmo econômico, em eventos destinados a promover, divulgar e (às vezes) estimular negociações de filmes, o custo e o glamour com indispensáveis mordomias que cercam os eventos fazem com que os mesmo sofram, agora mais do que nunca, cortes viscerais.
Aliás, na história dos festivais de cinema no Brasil, nunca existiu nenhum evento que tivesse conseguido, até hoje, estabelecer uma sólida base financeiro-administrativa, vivendo em cada ano as incertezas do momento. Mesmo o Festival de Gramado, em 17 edições - e turisticamente o de maior repercussão - ou o de Brasília, 22 edições em um quarto de século, sofreram sempre com imprevistos. Por exemplo, o Festival de Brasília, no ano passado, só teve sua (modesta) concretização definida menos de um mês antes da data final - e um organizado cineclube de uma cidade vizinha - o Porta Aberta, acabou sendo a alavanca central para que o então ministro da Cultura, José Aparecido, liberasse pouco mais de NCz$ 200 mil, com os quais o competente Marco Aurélio Guimarães, ajudado por uma pequena equipe (na qual estava a curitibana Christina Gebran) realizasse um festival exemplar.
O mais importante evento do Hemisfério Sul - o FestRio, só sobrevive graças à garra e prestígio de Ney Sroulevich e seus companheiros, mas assim mesmo, após o suadouro que foi a edição de 1988, a solução para o ano passado se encontrou com sua transferência para Fortaleza, onde graças à mão firme do governador Tasso Jereissati, houve a 6ª edição do festival.
Para 1990, apenas incógnitas!
A Prefeitura de Gramado ainda nada pode informar sobre a 18ª edição de seu festival - que de princípio só seria realizado após a Copa do Mundo - quando, tradicionalmente, o evento aconteceria entre março/maio, no máximo. Do RioCine Festival, cuja quarta edição no ano passado foi restrita e só saiu graças à ajuda da Fundação Banco do Brasil, não há informações também - o mesmo ocorrendo com relação ao FestRio, apesar deste ter sua importância maior: caso deixe de ser efetuado, o Brasil perderá a chance de continuar a ter uma mostra competitiva internacional de Classe A, ou seja, somente com filmes inéditos na disputa dos Tucanos de Ouro. Acapulco, no México, e até o ano passado, Mar Del Plata, na Argentina (que nos anos 50/60 tinha um festival internacional) estão de olho na vaga.
O colunista Alcy Ramalho Filho, da "Gazeta do Povo", que com a ajuda da Lufthansa / Texaco, conseguiu improvisar um modesto festival em Curitiba, em setembro do ano passado, também não sabe se haverá condições de repetir o evento, afinal, neste momento de recessão, corte e economia, nem poderosas multinacionais podem prometer subvenções e patrocínios. E com relação ao festival de Brasília, nem pensar por enquanto!
Além do mais, há uma questão básica: com a total paralisação da produção de filmes, mesmo que venham a acontecer alguns festivais, o que será exibido? No máximo, há dois ou três filmes em fase de conclusão - pois os demais já foram mostrados. Portanto, o panorama é desolador.
Enquanto isto, no Exterior, o calendário de festivais é extenso, conforme relatamos em outro bloco, nesta mesma página.
LEGENDA FOTO - O comando do FestRio, que conseguiu viabilizar já seis edições do maior acontecimento cinematográfico da América do Sul: Ney Sroulevich, Cosme Alves, Hamilton Costa Pinto e Jean Gabriel Albicoco.
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