Dominguinhos, cada vez melhor e mais romântico
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 03 de maio de 1987
Pela sua própria popularidade de Norte a Sul e opções de utilização nos mais diferentes gêneros musicais, além de "sozinho fazer um baile" - como dizia um velho acordeonista de São José dos Pinhais - este instrumento tem uma popularidade única. Afinal, piano é ainda imagem de música de elite (mesmo quando no popular) e o violão é mais para ser ouvido do que dançado - restando, portanto, ao acordeom, a função de estímulo aos arrastapé da vida
Se isto trouxe uma imensa popularidade e difusão a este instrumento de origens européias e que chegou ao Brasil no século XVIII, nas mãos dos imigrantes italianos e alemães, por outro criou também um (injustificado) preconceito, associando-o à música de menor qualidade.
Foram precisos anos de luta para que acordeonistas populares, saídos das faixas mais humildes e com repertórios simples conseguissem provar a qualidade do acordeom e sua força de comunicação. Hoje, no Nordeste ou no Sul há acordeonistas excelentes - e o marketing jovem que Renato Borghetti conseguiu ao ser o primeiro instrumentista brasileiro a ultrapassar a casa das 100 mil cópias vendidas em seu primeiro LP (Som Livre, 1984), foi importantíssimo para valorizar o instrumento.
Em termos artísticos, junto à faixa universitária, jovem, dez anos antes um outro acordeonista, José Domingos de Morais, pernambucano de Garanhus (12/2/1941), já havia conseguido quebrar preconceitos ao ser reconhecido e elogiado por superstars urbanos - baianos como Caetano Veloso e Gilberto Gil. Sem jamais negar suas origens populares - especialmente a do padrinho Luis Gonzaga, que o estimulou em seu início de carreira, quando, aos 6 anos, com seus irmãos Morais e Valdo, já tocava sanfona de oito baixos nas portas dos hotéis e nas feiras de Garanhuns e Cuaruaru, Dominguinhos soube ampliar seus espaços.
Hoje, sem perder um público popular imenso - que o obriga a fazer longas excursões pelo Nordeste, Dominguinhos sabe cultivar também admiradores em outras faixas, buscando, para isto, aprimorar cada vez mais o seu repertório. Para tanto, contam as parcerias com poetas inspirados como Abel Silva, com quem divide a mais bela música de seu novo elepê ( "Seu Domingos", Continental). Em "Sempre Você", Dominguinhos usa sua habilidade harmônica, voz certa em versos românticos e belos, num canto de amor emocionante pela simplicidade e ternura:
"Penso em você quando chove/ penso em você se faz sol/
Quando falo com amigos/ quando vejo futebol
Quando me ponho em silêncio
Quando pego o violão/ você vem no pensamento
pulsa no meu coração."
Uma canção de amor, rasgada e declarada, que encerra de forma brilhante:
"De noite quero teu beijo/ de manhã te acordar
de tarde te dar carinho/ de madrugada te amar"
Com outro letrista inspirado, Nando Cordel, Dominguinhos faz outro hino apaixonado, apropriadamente intitulado "Fogo de amar".
"Você pensa que meu coração agüenta/ tá distante desse amor
Fico triste quando você vai embora/ Sinto falta de calor"
Guadalupe, compositora, parceira e mulher de Dominguinhos, também não poderia faltar em outra faixa de título apropriado""Ninguém vai nos separar":
"Que saudade é essa agora/ que maltrata, que machuca o meu peito
Toda vez que vejo ela meu coração dispara
e logo quer parar"
Apesar de todo o romantismo bem brasileiro, Dominguinhos sabe que o seu público quer forró. E forró não falta neste disco, seja com músicas de Ceceu ("A Procura do Forró"), o divertido "Casamento no Juazeiro" (Morais Moreira), "Gandaiera" (João Silva) ou "Danado no Forró" (Luizinho Calixto/Eurides), neste com participação do violonista Zé Menezes citado, explicitamente, por Dominguinhos.
Romântico, alegre, bem produzido, Dominguinhos está ótimo neste "Seu Domingos", um disco de MPB com gosto de Brasil. Acordeonista, cantor e compositor, Dominguinhos é grande brasileiro.
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