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Em Campos do Jordão, o festival que deu certo

Normalmente considerado um homem difícil e mal humorado, o maestro Eleazar de Carvalho, cearense de Iguatu, 74 anos - completados no último dia 28 de junho - revelou-se um verdadeiro show-man, simpático, acessível e bem humorado no domingo, quando do encerramento do XVII Festival de Inverno de Campos do Jordão. No paradisíaco ambiente do auditório de 2 mil lugares, entre pinheiros verdejantes e com o sol do cair da tarde refletindo-se pelos grandes vitrais, o clima que marcou o fechamento de mais uma edição do melhor dos festivais de música erudita que acontecem no Brasil não poderia ser mais propício a que não só o seu diretor artístico, mas também todos que, de uma forma ou outra, envolvem-se neste projeto estivessem felizes. Afinal, durante um mês, foram aproximadamente 40 mil pessoas que aplaudiram 46 concertos do mais alto nível realizados em Campos do Jordão, enquanto 120 jovens instrumentistas, vindos de várias partes do País, recebiam aulas com mestres de renome internacional, inclusive cinco professores estrangeiros. E, na tarde de domingo, a orquestra de bolsistas, mais o coral do Teatro Municipal de São Paulo, mostraram a beleza do quarto movimento da 9ª Sinfonia de Beethoven, tendo como solistas a soprano Celine Imbert, e contralto Lenice Prioli, o baixo Zuinglio Faustino e o tenor José Antônio Marçon - que substituiu, na última hora, o internacional Aldo Baldin, tenor catarinense que reside na Alemanha, e que amanheceu doente - impossibilitado, portanto, de fazer o recital. Os aplausos a Marçon foram tamanhos que, como disse o maestro Carvalho, nascia ali um novo astro do canto lírico. Como primeira parte do programa, a emocionante "Alvorada" da ópera "O Escravo" de Carlos Gomes - somente com a orquestra de bolsistas e, no final, após o maestro Eleazar ter chamado ao palco o governador Franco Montoro, um cívico encerramento com todos cantando o Hino Nacional. Entusiasmados, ficava já marcada a data de abertura da XVIII Edição do Festival - 4 de julho de 1987, com a promessa formal de Cláudio Molina, diretor de comunicação da Souza Cruz, que, mais uma vez, a empresa estará na parceria, viabilizando este projeto cultural. xxx Continuidade, Competência e Entusiasmo. Eis o tripé que faz, desde 1970, Campos do Jordão, ter no mês de julho um festival musical que cresce a cada ano. Seus 50 hotéis permanecem lotados não só por participantes do evento mas por interessados em músicas vindo de várias partes do País. O clima da cidade, climaticamente já europeu, tem uma conotação cultural que faz dela um paraíso em termos sonoros, com estudantes, nomes famosos da música e simples apreciadores conviverem ao longo dos concertos no auditório Arrobas Martins ou, nas ensolaradas manhãs de domingo, nos concertos ao ar livre na praça Canivari - na qual, normalmente, se apresentam as bandas sinfônicas dos vários municípios paulistas. A partir deste ano, a cidade ganhou mais um espaço cultural: o desativado cinema Abernéssia foi restaurado pela Souza Cruz e além da programação musical no mês de julho servirá como cine-teatro durante o resto do ano, numa programação a cargo da Estância de Campos do Jordão, cujo prefeito, João Paulo Ismael, ganha, assim, mais um instrumento cultural para a animação da cidade. A continuidade no Festival que somente durante o governo Maluf não teve a direção do maestro Eleazar de Carvalho (substituído pelo mestre-de-banda José Coelho de Almeida, ex-diretor do Conservatório de Tatuí) - é um dos aspectos que faz o evento se consolidar nacionalmente. "Feliz cumplicidade", como diz o simpático secretário de Cultura de São Paulo, poeta e jornalista Jorge Cunha Lima, entre o Estado e a iniciativa privada no caso o Projeto Carlton - viabiliza o Festival em termos econômicos (este ano, seu custo foi ao redor de Cz$ 11,5 milhões, dos quais Cz$ 4,5 milhões cobertos pela Souza Cruz). Nem mesmo a ausência do internacional violoncelista Antônio Meneses (que se casou há um mês e cancelou, assim, sua vinda ao Brasil), ou a impossibilidade de investir US$ 30 mil para trazer o pianista Ivo Pogorelich, diminuíram o brilho do Festival. Ao contrário, foram concertos - chegando a sete, nos fins de semana - que mostraram um diversificado panorama da música clássica, através de solistas, conjuntos de câmera e orquestras. LEGENDA FOTO - Bem humorado, o maestro Eleazar de Carvalho apanhou um gorro de pele - que um fã atirou no palco - e, com um toque russo, regeu um dos concertos do Festival de Campos do Jordão. (Foto Lau Polinésio/Visual.)
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
13
30/07/1986

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