Em teipe e livro a poesia de Quintana
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 06 de maio de 1986
Como seus 80 anos - a serem comemorados no próximo dia 30 de julho - impedem que Mário Quintana, gaúcho de Alegrete, poeta maior do Rio Grande do Sul e do Brasil, esteja viajando, Arakén Távora teve uma feliz idéia para levar a sua imagem, suas palavras e, especialmente, sua poesia, a todo o Brasil. Produziu emotivo videoteipe com Mário Quintana e escreveu um livro didático, simples, gostoso de se ler. E, sempre que possível, está exibindo o teipe para platéias de estudantes. Em Curitiba, fará isto, nesta semana, para turmas do 2º grau dos colégios Positivo e Dom Bosco, que se interessaram em receber esta importante contribuição.
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Ao lado de Carlos Drummond de Andrade, Mário Quintana é o grande poeta vivo do Brasil de sua geração. Um homem maravilhoso em sua obra, terno e repleto de lirismo que em toda sua vida tem se dedicado à poesia e à comunicação com os homens, com os mais felizes textos:
O poeta canta a si mesmo
porque num seu único verso
pende - lúcida amarga -
uma gota fugida a esse mar incessante
do tempo
No livro "Encontro Marcado com Mário Quintana" (L&PM, Porto Alegre), Quintana faz deliciosas revelações. Por exemplo, lembra que durante 5 anos foi prático de farmácia em Alegrete, ajudando seu pai, o farmacêutico Celso Quintana. Recorda o poeta:
- "Naturalmente o meu pai me passava as coisas que não tinham muita responsabilidade, porque eu era guri. Eu fazia soluções que, se colocasse um pouco mais ou um pouco menos dos ingredientes, não fariam mal ao doente. O que acontecia é que o remédio ficava turvo depois. Mas eu era bem consciente. E atribuo esse cuidado que tinha com a medida exata, o cuidado que tenho com a forma dos meus versos. Atribuo o cuidado extremo com a forma da poesia de Carlos Drummond de Andrade à sua habilidade métrica, pois ele estudou Farmácia. Assim como Alberto de Oliveira, que também era farmacêutico e outro dos nossos grandes parnasianos, mestre da arte poética no Brasil."
Como em sua poesia, escrita, também quando Mário Quintana fala, as palavras adquirem um sentido de perenidade, de intensa beleza. Eis, por exemplo, este trecho em que fala do ofício do poeta:
"Para mim, ser poeta significa ser gente. E ser gente, no meu caso, significa ser eu mesmo. É uma afirmação do meu eu. A poesia para mim não é uma fuga da realidade, como alguns pensam: é um aprofundamento em si mesmo. A poesia, para mim, é um instrumento de reconhecimento do meu mundo, do mundo dos outros e, talvez, dos outros mundos..."
O poeta é belo como o Taj-Mahal
feito de renda e mármore e serenidade
O poeta é belo como o imprevisto perfil
de uma árvore
ao primeiro relâmpago da tempestade
O poeta é belo porque os seus farrapos
são do tecido da eternidade
LEGENDA FOTO - "Vou revelar a vocês um segredo: descobri outro dia que o Quintana na verdade é um anjo disfarçado de homem. Às vezes, quando ele se descuida ao vestir o casaco, suas asas ficam de fora."
(Érico Verissimo)
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