E já vai longe o tempo das grandes orquestras
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 19 de janeiro de 1991
Tomando uma cerveja com o poeta Hermínio Bello de Carvalho, no bar do Hotel Araucária, o músico e maestro Roberto Gnatalli, 41 anos - um dos 34 professores que há duas semanas orientam aulas para 850 alunos da IX Oficina de Música de Curitiba (Solar do Barão, até o dia 25), lamentava:
- "A última apresentação que consegui fazer com a Orquestra de Música Brasileira foi no projeto "Viver Vinícius", patrocinado pelo Centro Cultural do Banco do Brasil, há exatamente um ano. Depois, todos os projetos que estavam engatilhados - participação no Free Jazz, etapa paulista, concertos em várias capitais e mesmo a gravação de um segundo elepê foram congelados em nome do Plano Collor".
Sobrinho do lendário Radamés Gnatalli, considerado uma das mais vigorosas revelações da música brasileira na área de orquestração e regência, Roberto Gnatalli, 41 anos, criou a Orquestra de Música Brasileira em 1985. Com excelentes músicos, arranjos próprios e modernos, voltado exclusivamente a autores brasileiros - e enriquecendo seus concertos em forma de show (apresentavam-se vestidos de forma irreverente, mesmo com fantasia, estabelecendo uma inédita comunicabilidade com o público), a Orquestra fez mais de cem concertos em 5 anos, ganhou patrocínio da Coca-Cola para gravar seu elepê (reeditado, posteriormente, pelo Estúdio Eldorado, possível de ser encontrado na F. Sartori), e foi a sensação do Free Jazz, em 1989, quando abriu a noite em que se apresentou o Modern Jazz Quartet.
Entretanto, este excelente grupo de 18 figuras, está desativado, sem ver luz no túnel da escuridão cultural-musical:
- "Cada músico procurou outras atividades e embora todos desejem fazer o trabalho que vínhamos desenvolvendo, hoje estão desanimados".
Como a Orquestra de Música Brasileira, também a Orquestra Brasileira de Violões, criada em Recife, também está desmontada desde que o governo federal condenou as atividades culturais ao esquecimento.
Orquestras Sinfônicas e de Câmera - como a de Blumenau - sobrevivem com as maiores dificuldades. De uma forma ou de outra, o panorama é desolador em termos nacionais.
Assim, não deixa de ser um ato de coragem - e muito idealismo - a decisão de Bianchi e Raulzinho em convencerem oito outros profissionais da música para formar uma big band em Curitiba. Há muitos anos que as nossas orquestras praticamente se congelaram. O veterano Genésio Ramalho, 75 anos e em pleno vigor, só voltou a montar a sua histórica banda de metais - de saudosa memória dos tempos do Chá Dançante de Engenharia - graças ao contrato com o Hotel Bourbon, em cuja boate Four Seasons, apresenta-se nos fins de semana, mas com apenas 8 figuras. Osval Dias de Siqueira, 70 anos, "e 65 de música", diz - pistonista e maestro, desde 1956 - com algumas interrupções (principalmente devido suas atividades no serviço público, do qual está hoje aposentado), mantém orquestra de danças. O máximo que conseguiu reunir foi 18 figuras no palco - "pois tocamos conforme a vontade do freguês", ou seja, dependendo do contrato, amplia ou reduz sua formação. Para o Carnaval, Osval já fechou contrato com o Curitibano. Já a Orquestra de Genésio, só volta a se apresentar depois do dia 22 de fevereiro. O ítalo-curitibano Beppi, outro veterano músico de Curitiba, com uma formação menor, sempre trabalhou bastante - o que o tornou um homem rico - fato raro entre os músicos.
Na história (a ser pesquisada e escrita) da música no Paraná, muitas orquestras tiveram fases de esplendor, e depois acabaram melancolicamente. O engenheiro Eduardo Garcez Duarte, 71 anos, estudioso de nossa música, lembra de que em sua infância aplaudia a Orquestra Sinfônica que o maestro Romualdo Suriani dirigia. Mais tarde foi criada por Bento Mossurunga a Orquestra Juvenil, embrião da Orquestra Sinfônica da Universidade Federal do Paraná - hoje também praticamente desativada.
Na área popular, entre muitas orquestras, os mais velhos lembram do "Jazz Manon", de Gerdau do Rosário - contratado exclusivo do iluminado Cassino Ahú nos anos 40; o "Baturetê" - dirigida por um maestro de nome lembrando um leader americano - Harry Muller; a "Luz", de "Sumaré", a "Guarany" - por anos a fio exclusiva dos bailes do Operário, entre outras. Nos anos 60, com o advento do rock e aparecimento de dezenas de conjuntos semi-amadorísticos - mas que passaram a disputar o mercado e, posteriormente, com a concorrência da música de fita, poucas foram as orquestras que resistiram. Hoje, embora existam oficialmente mais de 500 músicos profissionais no Paraná, não passa de uma centena os que, efetivamente, trabalham regularmente, com uma remuneração profissional condizente. Um tema que comporta muitos registros e, sobretudo, atenção de quem não aceita apenas o som de consumo imposto pelas multinacionais - e que reduzem cada vez mais os espaços profissionais de nossos artistas.
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