Login do usuário

Aramis

Apesar de tudo, os discos independentes resistem

Passados treze anos do surgimento organizado do chamado "disco independente" - tomando-se como ponto inicial de referência o "Feito em Casa" do pianista e compositor Antônio Adolfo - ao contrário do que muitos pensam, esta forma de realização fonográfica não morreu. Teve, evidentemente, que se adaptar aos novos tempos - cada vez mais recessivos - agravados em 1989/90 - o que provocou uma sensível redução na chamada produção alternativa, tendo em compensação também um saneamento artístico. A fórmula de auto produção, que entre 1978/85, levou compositores-intérpretes que, independente de méritos, conseguiam viabilizar economicamente uma produção por mais modesta que fosse, a um ponto em que mais de 100 discos surgiam a cada ano e justificando até que uma associação dos chamados produtores independentes criasse, por dois anos, o troféu Chiquinho Gonzaga para premiar os dez melhores trabalhos, teve que se reduzir. Hoje a produção de um disco independente, por mais econômico que seja o esquema, não fica por menos de um milhão de cruzeiros e os mecenas que nos anos dourados da Lei Sarney garantiam gordas subvenções também desapareceram. Apesar disto, através de idealísticos esforços, discos independentes continuam a ser produzidos apesar das adversidades. Lamentavelmente, a maior partes destes elepês fica restrita aos estados, muitas vezes às cidades em que residem seus realizadores, pois a eterna má vontade de lojistas em relação aos produtos alternativos - somada à própria timidez (leia-se falta de recursos) dos artistas independentes impede um trabalho de divulgação nacional. Assim, um disco gravado há dois ou mesmo três anos só é "descoberto" agora, quando o artista obtém condições de viajar, fazer apresentações e mostrar "o seu trabalho" - levando então os exemplares para venda - é que nos deparamos com elepês de grande valor que, infelizmente, permaneciam desconhecidos. Dois exemplos disto: em Florianópolis, uma capital distante menos de 300 quilômetros de Curitiba, há dois anos - agosto/setembro de 1988 - uma das mais interessantes cantoras catarinenses, Neide Mariarrosa, 52 anos, uma longa carreira, vivência de alguns no Rio de Janeiro - período em que teve grande apoio de Elizeth Cardoso (cuja voz lembra bastante), finalmente conseguiu gravar um elepê independente ("Eu Sou Assim"), afetuosa produção que o jornalista e cineasta Norbertp Depizzolatti viabilizou com algum auxílio da Fundação Franklin Cascaes, mas tendo que buscar também apoio financeiro da Souza Cruz e para finalização, colocar recursos próprios. Bem produzido, com um encarte em que são biografados os compositores catarinenses gravados na voz deliciosa de Neide Mariarrosa, este disco que circulou somente em Florianópolis merecia ter uma distribuição nacional. Infelizmente, nenhum exemplar chegou às lojas de Curitiba e só no final deste ano, através do seu produtor, dele tomamos conhecimento. Outro exemplo é o belíssimo elepê de Maria Rita Stumpf, jovem cantora e compositora gaúcha, radicada no Rio de Janeiro (após ter vencido vários festivais nativistas, inclusive o de Santa Rosa, em 1985, com "Kamaiurá"), que, aluna de Luisinho Eça (de quem hoje é empresária), gravou entre 1988/90 um belíssimo disco, com sessões feitas em Belo Horizonte (Bemol) e Rio, tendo a participação, além de Luisinho Eça, também do excelente grupo Uakti e do baixista Ricardo Bordini. Só no ano passado, viajando profissionalmente como diretora de produção da empresária artística Miriam Dauelsberg, Maria Rita pode divulgar seu álbum, que mesmo sendo uma produção de dois anos, não temos dúvidas em incluir entre os destaques do ano. São dois exemplos de como tantos trabalhos de valor ficam praticamente esquecidos pois que não chegam às mídias de divulgação (jornais e revistas nacionais raramente os registram), impedindo que se conheçam trabalhos importantíssimos. Razão pela qual, como fazemos há anos, abrimos nesta edição um espaço aos bravos independentes guerrilheiros da canção brasileira. P.S.: No Paraná, duas produções independentes saíram em 1990 - "Optimun in Habbeas Coppus", com vários intérpretes, produzido pelo empresário Sérgio Bittencourt e "Arquétipos", com Hilton Barcelos, cuja produção se arrastou por cinco anos. Como estes dois discos já mereceram registros detalhados anteriores, deixamos de aqui incluí-los.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
20
20/01/1991

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br