Nordestinos mostram como editar sem gastar muito
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 07 de dezembro de 1987
Consciente de que não basta apenas criar por criar mais uma onerosa fundação destinada a área editorial - mas, sim, que a mesma deve nascer sem os erros e vícios que invalidaram tantas outras instituições oficiais, o secretário René Dotti, da Cultura, já decidiu que o projeto da Fundação do Livro do Paraná terá que ser amplamente discutido pela comunidade e setores específicos. O deputado Kirinos, autor da proposta para que o Estado tenha mais esta instituição, quer queimar etapas para que a Fundação nasça a toque de caixa, mas o bom senso requer que antes de comprometer o já combalido orçamento da Secretaria da Cultura com maiores despesas há necessidade de se estudar o assunto com calma, profundidade e, principalmente, ouvindo-se áreas técnicas - que, ao menos nesta primeira etapa têm sido marginalizadas pela comissão presidida pelo deputado Kirinos.
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Só agora a Universidade Federal do Paraná está conseguindo ter uma editora eficiente: a Sciencia et Labor iniciou um bom programa editorial, com lançamentos de repercussão e um trabalho organizado, fruto de muitos meses de dedicação e esforços da bibliotecária e professora Leilah Santiago de Oliveira. Durante anos, a Editora da UFPr era o exemplo da "Conceição": de seus lançamentos, raros e inexpressivos, ninguém sabia, ninguém via!
A própria Editora da Universidade de Brasília cometeu enganos que custaram milhões de cruzados de prejuízos. Imprimiu livros sem qualquer interesse, que ficaram em seus depósitos e só agora há uma tentativa de reorganizar as edições e vender os volumes encalhados em seus depósitos.
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No Nordeste, tem acontecido alguns exemplos mais positivos. A Universidade Federal do Ceará além de manter regularmente uma boa publicação cultural já dispõe de um catálogo de obras interessantes, basicamente de autores e temas regionais - mas sem qualquer radicalismo de origem. Em Pernambuco, Leonardo Dantas Motta, que há anos desenvolve um bom trabalho na área editorial do Estado, assumiu há pouco a direção da Editora Massangana, da Fundação Joaquim Nabuco, que se encontrava desativada em termos promocionais e começou a dinamizar as vendas, através de malas-diretas e ofertas de três dezenas de livros e 9 discos a preços atraentes. Na área musical, aquela editora lançou discos como "Capiba: Ontem, Hoje e Sempre", "Gilberto Freyre em prosa e verso", "Augusto dos Anjos e sua sombra", "Compositores Pernambucanos" etc.
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Um dos maiores problemas de editoras oficiais é a falta de promoção e melhor comercialização das obras editadas. Inexistindo quem de fato corra os riscos financeiros - e os prejuízos são debitados ao Estado ou às instituições oficiais que as mantém - excelentes títulos chegam a ser publicados, mas não tem a repercussão merecida. Assim, assumindo a vice-presidência da Fundação Cultural do Estado da Bahia, o professor e cineasta Guido Araújo, surpreendeu-se ao saber que vários livros editados na administração anterior permaneceram praticamente inéditos, apesar do valor dos títulos e de serem co-edições com casas publicadoras nacionais. Por exemplo, com a editora Ática, de São Paulo, foi publicado o interessantíssimo estudo de José Calasans sobre "Canudos na Literatura de Cordel" - inventário da criação popular em torno do episódio histórico. Com a Tempo Brasileiro saíram vários ensaios, inclusive o estudo "Divergência e Prostituição", de Guy Espinheira, que abriu a coleção "Cultura Baiana". Aos que se interessam por música, dois livros indispensáveis também editados em convênio com a Tempo Brasileiro: "Lundus e Modinhas Antigas - Século XIX", de Esther Pedreira e "Organistas da Bahia" (1750-1850), do padre Jaime C. Diniz, incansável pesquisador da musicografia brasileira.
Uma coleção de artigos do jornalista Cid Teixeira ("Bahia Em Tempo de Província", 206 páginas), a correspondência escolhida entre Anísio Teixeira e Monteiro Lobato ("Conversa Entre Amigos", 115 páginas) e obras de poetas como Wilson Rocha ("A Forma do Silêncio", co-edição com a José Olympio) e Carlos Anísio Melhor ("Canto Agônico", co-edição com a Civilização Brasileira, 74 páginas), também estão entre
as obras lançadas pela Fundação Cultural do Estado da Bahia - à venda dos preços mais do que razoáveis, inclusive através do reembolso postal.
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Obras de arte, em edições naturalmente mais caras, também têm sido feitas pela Fundação Cultural da Bahia. Em convênio com as Edições Macunaíma, do gravador Calazans Neto, com suas ilustrações, saiu já há dois anos (mas nunca tendo qualquer vendagem fora da Bahia) o "Livro de Celina", poemas de Humberto Fialho Guedes. Com o apoio da Funarte, foram editados "Um documento do Candomblé na Cidade de Salvador" de Raul Lody (coleção Culto Afro-Brasileiros/Instituto Geográfico e Histórico da Bahia,142 páginas) e "Romaria do Bom Jesus da Lapa na Bahia", ambos com belíssimas fotografias - a cores e preto e branco.
Valorizando a cidade de Salvador, dois belíssimos volumes: "O Rio Vermelho e suas tradições", memórias de Licídio Lopes (106 páginas) e "Dez Freguesias da Cidade de Salvador", de Anna Amélia Vieira do Nascimento (196 páginas).
Como se vê, apenas alguns exemplos de como edita obras sérias e importantes. Sem necessidade de existir uma fundação editorial específica. Afinal, na administração de Luís Roberto Soares, na Cultura, foram publicados dezenas de títulos, somente com o trabalho de Cassiana Lacerda Carolo e duas auxiliares.
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