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Aramis

Stelinha e Gaya, um espaço para recordar o grande amor

Stelinha Egg tem estado muito ocupada nas últimas semanas. Em sua residência, na ampla sala de visitas e biblioteca, espalham-se recortes de jornais, partituras, fotos, discos e objetos que marcaram a sua longa carreira artística e, especialmente, os 42 anos de um dos mais felizes casamentos do mundo artístico - em termos profissionais e pessoais - com o inesquecível pianista, compositor, arranjador Lindolfo Gaya (Itararé, 06/05/1921 - Curitiba, 17/09/1987). Sozinha, com imensa dedicação e entusiasmo, Stelinha (Maria Stela Campos Egg, Curitiba, 18/07/1914), vem classificando o acervo memorialístico que reflete a sua longa carreira - e também a de Gaya. - "Nossa vida foi uma só: desde que nos casamos - em 2 de outubro de 1945, no Rio de Janeiro, não houve um só momento de separação. Pessoal e artística". Sem deixar de se emocionar, lágrimas vêm aos seus olhos quando lembra o companheiro querido: - "Sempre foi assim. Quando se falava em Gaya, falava-se em Stelinha. Quando se falava em Stelinha, falava-se em Gaya. Nunca foi, nem poderia ser, de outra forma". A ausência e a dor que a morte do grande maestro e arranjador, vítima de complicações após sofrer uma trombose na perna, a fez, neste últimos anos, afastar-se de qualquer atividade. Antes mesmo, desde 1985, quando o casal encerrou uma longa carreira do último espetáculo que fizeram juntos - "Andanças", no auditório da Reitoria, já haviam decidido parar com apresentações públicas. Stelinha, com uma imensa generosidade, prepara-se para um projeto dos mais queridos: a transformação de um pequeno apartamento que o casal possuía no térreo do edifício 2317, na Rua Saldanha Marinho, num memorial que lembre para o futuro as suas carreiras. O nome ainda não está definido - "poderá ser sala, estúdio ou centro, depende", mas está sendo organizado, com todo carinho, exclusivamente por Stelinha. Ela já transferiu para ali o piano em que Gaya criou milhares de arranjos e desenvolveu trabalhos de música popular e mesmo erudita, ao longo de toda uma vida dedicada à música. Agora, Stelinha faz o trabalho mais difícil e emocionante: - "São centenas de papéis, partituras, recortes, discos, etc. - cada um com uma história, um significado, uma emoção, reunidos desde os anos 30, além de outros - fotos de família, os tempos de Curitiba. Cada um tem uma história, um momento, um significado, que só eu sei... e a saudade é mais do que uma palavra". A importância de Gaya dentro da música brasileira, nos anos 40/60, tem sido reconhecida pelos mais importantes nomes. Trabalhando especialmente como arranjador de gravadoras - RCA, Philips e, num longo período, Odeon, esteve ligado ao nascimento da Bossa Nova, o que fez seu grande amigo Aloísio de Oliveira, ao criar o histórico selo Elenco, a requisitá-lo para fazer trabalhos especiais em muitas gravações deste "label" que, entre 1962/65, aglutinou o melhor elenco de jovens que modificaram os rumos da música brasileira. Anteriormente, Gaya já havia, na Odeon - onde João Gilberto e Silvinha Telles (esposa de Aloísio, na época) fizeram seus primeiros discos, dando sua contribuição e criatividade. Trabalhando como arranjador - Stelinha faz questão de classificar este seu trabalho de "música para orquestra", já que representou, "inúmeras vezes, um trabalho básico e ao qual se deve o resultado final de tantas gravações antológicas", Gaya também fez vários elepês, como pianista, organista e arranjador - que, hoje cópias raras, farão parte do acervo que Stelinha vai perpetuar num espaço com o seu nome. Nos últimos anos de sua vida, quando o casal retornou a Curitiba, Gaya deu uma grande contribuição: contratado por Percy Tamplim, do Sir Laboratório de Som & Imagem, para dirigir a parte musical, não só fez excelentes trabalhos - especialmente para trilhas de comerciais, como, em sua imensa generosidade, transmitiu aquilo que sabia a jovens que entenderam sua importância - especialmente Marinho Gallera e Reinaldinho Godinho, hoje dois dos mais competentes compositores-arranjadores em atividade nos estúdios da cidade.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
08/04/1990

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