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Aramis

Adeus, Stelinha!

Com a morte de Stelinha Egg, na segunda-feira, 17, o Paraná perdeu sua única cantora que obteve uma real projeção nacional. A verdade é que Stelinha, mesmo afastada da vida artística há mais de 10 anos, era a única intérprete nascida em Curitiba que conseguiu tornar-se um nome popular em termos nacionais, excursionando ao Exterior e gravando mais de uma centena de músicas em 78 rpm, 45 rpm e elepês. Embora identificada como cantora de canções folclóricas - pelo grande número de registros que fez neste gênero - Stelinha também criou sucessos em outros estilos, sempre com uma forma brejeira, suave e personalíssima - sua marca registrada desde seus tempos de menina, quando cantava na Igreja Evangélica, filha de alemães, e, mais tarde, nos programas da Rádio Clube Paranaense, da qual foi, ainda nos anos 30, uma das primeiras artistas contratadas. No ano passado, quando gravou um depoimento para o projeto Memória Histórica do Paraná , por nossa sugestão, surpreendeu ao grupo de jornalistas que a entrevistou, fazendo de princípio sua completa identificação: "Meu nome é Maria Stella Egg Gaya, nasci em Curitiba em 18 de julho de 1924...". Afinal, tradicionalmente, Stelinha sempre evitava dizer o ano de seu nascimento, inclusive quando fez, em 1969, um depoimento para o então nascente Museu da Imagem e do Som do Paraná. Com a idade, as reflexões, a dor pela ausência do companheiro querido por mais de 30 anos - o maestro, arranjador e pianista Lindolfo Gaya (Itararé-SP, 6/5/1921 - Curitiba, 14/7/1983), afizeram, nestes últimos anos, recolher-se apenas a uma missão: perpetuar a memória de seu marido. Sozinha, sem filhos - o que lhe foi sempre uma tristeza - preparando-se para deixar uma grande casa, ali vinha procurando ordenar milhares de partituras, recortes, discos, etc., no que desejava, se transformasse no "Museu Lindolfo Gaya". Generosa, Stelinha pretendia doar um apartamento que possuía na rua Carlos de Carvalho para sediar este museu - que por nossa sugestão, deveria ser também um núcleo vivo, para aprendizagem musical de jovens - um dos sonhos de Gaya, sempre generoso em transmitir a novos talentos e seu know-how. Que o diga, Marinho Gallera, um dos seus melhores amigos e que soube observar seus ensinamentos durante os anos finais em que Gaya trabalhou no estúdio de gravação SIR, ali deixando grandes amigos - como o também compositor Reinaldinho Godinho, o baterista e engenheiro de som Carlinhos Freitas, o publicitário Paulo Vitola entre outros. O projeto de fazer o Museu-Centro de Estudos Gaya, com o acervo e espaço doado por Stelinha, chegou a constar de uma sugestão oficial que encaminhamos ao então secretário da Cultura, René Dotti - e que mesmo aprovada (e publicada em Diário Oficial) não deslanchou em termos concretos. Stelinha, entretanto, sem mágoa, vinha trabalhando solidariamente na ordenação do material, espalhado por várias salas em sua residência. Nos falava, sempre, de sua disposição de "viver para ao menos ver este sonho realizado"- comentando que havia decidido deixar sua valiosa casa no Rio de Janeiro para um de seus sobrinhos com a condição de que o mesmo vigiasse a continuidade do Museu. Infelizmente, como tantos idealistas que esperam inutilmente qualquer iniciativa oficial, Stelinha morreu sem ver o projeto sequer encaminhado. E ela não pretendia nada: ao contrário, queria doar não só um precioso acervo (quantas partituras de temas inéditos, arranjos importantíssimos deixados por Gaya, além de preciosa gravações poderão perder-se se a família não disciplinar a sua guarda?) como o próprio imóvel para sediá-lo. xxx Há dois anos, quando levamos Stelinha - acompanhada de sua amiga, a cantora Zezé Gonzaga e o poeta Hermínio Bello de Carvalho, à residência-arquivo do produtor-colecionador Leon Barg, nasceu a idéia de desenvolver um projeto amplo para preservar a obra de Gaya e Stelinha. Leon, através de sua etiqueta Revivendo, já vinha planejando um elepê com antigos fonogramas de Stelinha - a partir de suas primeiras gravações - "Tapioquinha de Coco" e "Uma Lua no Céu, Outra no Mar" (ambas de Jorge Tavares), que dividiram o elepê "Lá na Serra", com gravações de outra cantora da mesma época, Dilu Melo. Aliás, este elepê - número 45 da série Revivendo - é a única gravação disponível de Stelinha, pois os vários elepês que gravou em diversas etiquetas estão fora de catálogo há anos.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
20
19/06/1991

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