"Um caso escandaloso", a melhor estréia da semana
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 12 de dezembro de 1986
Poucas estréias nesta semana, enquanto aguarda-se os grandes lançamentos de final de ano, época em que as distribuidoras reservam seus maiores triunfos. Este ano não haverá nenhum Steven Spielberg ou George Lucas para tristeza dos exibidores mas, em compensação, há o "Labirinto", superprodução e com David Bowie, cada vez mais ator (sem deixar de ser cantor e compositor) como um andrógino misto de Mágico de Oz e Senhor dos Anéis.
Antes, porém, de "Labirinto" estrear - o que está previsto para o Natal - é relançado "A Lenda" (Legend), de Ridley Scott ("Os Duelistas", "Alien", "Ases Indomáveis") - em reprise, a partir de hoje, no Lido II), que já esteve por algum tempo em exibição. Em reprise no Vitória, desde ontem, "Legend" interrompeu a carreira de "Expresso para o Inferno", filme vigoroso, com Jan Voight em extraordinária atuação que lhe valeu a indicação ao Oscar de melhor ator (perdendo para William Hurt, por "O Beijo da Mulher Aranha", reprisado, aliás, sem êxito, na semana passada no cine Luz).
A MELHOR ESTRÉIA
Salvo alteração de última hora - o que sempre acontece no circuito comercial - a melhor estréia está no Cinema I, desde ontem: "Um Caso Escandaloso" (Un scandalo per bene), último longa-metragem de pasquale Festa Campanile, falecido poucas semanas após concluir este filme inquietador, baseado num fato verídico.
Em 1926, um homem aparentando 45 anos, desmemoriado, foi admitido num hospital de Collegno. Suas roupas estavam em farrapos e ele não se lembrava de nada. Em 6 de fevereiro de 1927, quando a revista "La Domenica Del Corriere" publicou a fotografia do paciente com o título "Alguém reconhece este homem? Ele é educado, distinto e tem, aproximadamente 45 anos", Renzo Canella, professor da Universidade de Padova, achou que o homem da fotografia parecia-se com seu irmão Giulio, filósofo, reitor e colaborador em publicações de Verona. Giulio Canella servira durante a I Guerra Mundial e desaparecera em 1916, durante a Batalha de Nitzopole. A sua esposa também o reconheceu imediatamente.
Em companhia da esposa ele voltou para o seu lar, mas uma carta anônima avisou a polícia que o estranho era, na realidade, um tipógrafo de Turim, Mário Bruneri - um impostor disposto a tirar vantagem da boa fé da família Canella. O desmemoriado é levado novamente ao hospital. E começa a batalha judicial de repercussão nacional.
Sobre este material, roteirizado pelo experiente Suso Cecchi D'Amigo, Festa Campanille construiu um elogiado filme, tendo no papel central um ótimo ator americano, Ben Gazarra, que com exceção dos filmes que fez com seu fraternal amigo John Cassavetes, nunca teve a valorização devida - só encontrando no cinema italiano oportunidade para mostrar seu talento. Por exemplo, o filme que representou a Itália no FestRio, há três semanas, "II Camorrista", de Giuseppe Tornatorex - um dos mais interessantes estudos sobre o crime organizado - trouxe Gazarra numa interpretação magnífica, credenciando-o inclusive ao Tucano e Ouro de melhor ator (que foi dado ao dinamarquês Peter Thiel, por "Manden i Manen"). Gazarra é o intérprete central de "Un Scandalo per Bene", mas no elenco estão outros bons artistas, embora pouco conhecidos, como Vittorio Caprioli, Giuliana De Sio, Valeria D'Obici e Giuliana Calandra. A trilha sonora é de Riz Ortolani.
Um filme vigoroso, sério e que merece atenção.
AS OPÇÕES NACIONAIS
Mais uma surpresa em termos de público: "O Homem da Capa Preta", de Sérgio Rezende - o grande premiado no Festival de Cinema Brasileiro de Gramado neste ano (tanto pelo júri oficial como pelo público) tinha tudo para agradar. Inclusive foi lançado num cinema popular - o São João, onde "A Marvada Carne" de André Klotzel (também premiado em Gramado, só que em 1985) permaneceu quase dois meses de casas lotadas. Ágil, com muita ação, abordando um personagem fascinante - o político Tenório Cavalcanti, com excelente interpretação de José Wilker no personagem-título e Marieta Severo como sua esposa (ambos premiados em Gramado) e ótima trilha sonora de David Tygell. Tudo isto, entretanto pouco adiantou e após uma magra semana, "O Homem da Capa Preta" é substituído pela reprise de um bom filme de Wlater Hugo Khouri - "Amor, Estranho Amor", de 1979, mas que não precisava voltar capando a carreira da fita de Sérgio Rezende.
Quando Khouri prepara-se para lançar "Eu", seu novo e sofisticado filme, novamente com Tarcísio Meira, o retorno deste "Amor, Estranho Amor" só se justifica por ter na cabeça do elenco o global Tarcísio Meira, em evidência pela telenovela "Roda de Fogo". Como todo filme de Khouri, "Amor, Estranho Amor" é extremamente bem realizado, com fotografia esmerada (de Antonio Meliande), ótima trilha sonora de Rogério Duprat e belas mulheres: Vera Fischer, Xuxa Meneghel, Matilde Mastrangi, Renée Casemart e até a veterana Íris Bruzzi. No elenco masculino, Mauro Mendonça, Otávio Augusto, Walter Forster, Pedro Paulo Hatheyer e, em participações especiais, críticos como Jairo Arco e Flexa e Rubens Ewald Filho (como "Augusto").
"Sonho sem Fim", o belo filme de Lauro Escorel Filho, sobre o pioneiro do cinema gaúcho Eduardo Abelim, continua em cartaz - agora no cine Luz. Um filme com excelente reconstituição de época, fotografia primorosa, bom elenco - Carlos Ricelli numa atuação surpreendente, ao lado de bonitas atrizes (Béborah Bloch, Marieta Severo, Fernanda Torres) fazem deste um filme reconfortante e delicioso. A trilha sonora foi criada por Antonio Adolfo a partir de temas de Chiquinha Gonzaga. Há seqüências de "Pátria Redimida", o filme que o paranaense João Baptista Groff realizou sobre a revolução de 1930 aproveitadas com inteligência e oportunidade - fazendo-se a devida citação a Cinemateca do Museu Guido Viaro que cedeu o material.
A OPÇÃO CUBANA
Desde terça-feira o público curitibano está conhecendo o cinema cubano que, nestes últimos 20 anos desenvolveu-se intensamente, conforme já relatamos em reportagem divulgada há duas semanas. Enquanto que a Cinemateca apresenta uma mostra de documentários, o cine Groff reprisa "A Última Ceia", de Tomas Gutierrez Alea, até agora o único longa-metragem cubano lançado no circuito comercial fora do eixo Rio-São Paulo. Mas para 1987, Ney Sroulevich, da Caribe Filmes (e diretor-geral do FestRio), promete que outros bons filmes cubanos - inclusive o "Se Permuta", exibido no FestRio-84 p chegarão normalmente. Ontem a Cinemateca apresentou uma programação com os curtas "O Maio das Três Bandeiras", de Santiago Alvarez; "Uma Fotografia Percorre o Mundo", de Pedro Chaskel; "Quando Termina o Baile", de Gerardo Chijona e "Granada, o decolar de um sonho", de Rigoberto Lopez - todos curtas e médias metragens que estiveram em festivais internacionais. O programa para hoje e amanhã inclui "História de uma Batalha", de Manuel Otavio Gomez; "A Solidão dos Deuses", de Santiago Alvarez e "Mulher diante do Espelho", de Marisol Trujillo - também premiado em festivais.
A partir da próxima terça-feira, 16, a Cinemateca inicia sua última programação de 86: uma retrospectiva do cinema e vídeo paranaense realizados neste ano, mostrando a criatividade e esforço de uma nova geração de realizadores - gente honesta, sem comprometimentos oficiais e que merece apoio.
OS BONS PROGRAMAS
Enternecedor, belo, emotivo, "A Inocência do Primeiro Amor" (Lucas), de David Seltzer, mereceu uma segunda semana no cine Plaza. Na enxurrada de filmes sobre adolescentes, "Lucas" é, sem favor, o melhor que já chegou ao Brasil, trazendo intérpretes do maior talento - como o garoto Corey Haim, no personagem-título. Um filme de visão obrigatória! A comédia "Os Espiões que Entraram numa Fria" (Spies Like us), de John Landis, com Chevy Chase, Dan Aykroyd e Steve Forrest, em cartaz no Astor, está agradando ao público e - permanecerá no mínimo mais duas semanas - assim como "Psicose III", desta vez com Tony Perkins aparecendo como ator e diretor (no Condor, 5 sessões).
"Maxie", de Paul Aaron, comédia com Glen Close, Mandy Patinkin e Ruth Gordon (já falecida), que deveria ter estreado há 3 semanas, no Ritz, finalmente agora entrou em cartaz. Ambientada na Hollywood dos roaring twenties, com a deliciosa Glen Close (já por duas vezes indicada ao Oscar), "Maxie" merece verificação nesta semana de poucas estréias.
No Palace Itália continua em projeção o interessante "A Hora do Pesadelo" (A Nightmare on elm Street), de Wes Craven, com o veterano John Saxon e intérpretes novos (Ronee Barkley, Heather Langeskamp, Amanda Wyss, Nick Corri). No Itália, em compensação, a violência "mondo cane" de "Canibal Holocausto", de Ruggero Deodato.
Nas sessões extras, apenas duas opções: no Groff, hoje a meia-noite e domingo às 10 horas, "Asas da Liberdade", de Alan Parker - um filme sempre digno de ser (re)visto. E na matinada do cine Luz, "O Príncipe Valente", amanhã às 10 horas da manhã.
Para a garotada, nas sessões Zig-Zag do Plaza, "As Novas Aventuras da Turma da Mônica" continua em exibição - sempre às 10, 11 e 12 horas dos sábados e domingos. São oito curtos desenhos com os personagens criados por Maurício de Souza.
Finalmente, duas reprises: "Pink Floyd - the wall", de Alan Parker, continua no Lido I, enquanto no Lido II, retorna "Ases Indomáveis" (Top Gun), de Ridley Scott, com o mesmo Tom Cruise de "A Lenda". Uma dupla oportunidade da garotada curtir este novo astro que surge!
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