Bernardino Schulman, a memória que se foi
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 26 de maio de 1990
A morte de Bernardino Schulman, aos 88 anos, na última quarta-feira, não entristeceu apenas seus familiares, centenas de amigos, toda a comunidade israelita. Levou também uma das memórias mais vivas e inteligentes da Curitiba do passado e uma das fontes sobre a imigração judaica não só no Paraná mas também no sul do Brasil. Uma de suas sobrinhas-netas, a professora Regina Rottemberg Gouveia, quando trabalhou em sua tese de mestrado, teve nas memórias do tio Bernardino a base para inúmeras informações. E sempre que alguém desejava alguma informação sobre Curitiba a partir dos anos 20, o "seo" Bernardino, com sua simpatia, amabilidade e presteza, era a referência básica.
Homem simples, apaixonado pelo xadrez - sua coleção de tabuleiros e peças era famosa - viu seus filhos se destacarem em vários setores. Um deles, Maurício, 58 anos, após ter passado pelos mais importantes cargos públicos (Copel, Secretaria das Finanças, Eletrobrás, BNH) é atualmente o segundo homem no comando do grupo Bamerindus. Saul, 60, empresário, foi o pioneiro da piscicultura em larga escala no Paraná.
Um dos irmãos de Bernardino, o engenheiro Leão Schulman, foi o primeiro técnico a presidir a Copel. Seu filho, Roberto, é hoje diretor da Itaipu.
Uma irmã de Bernardino, Ermínia, foi esposa de um dos mais famosos neurologistas brasileiros, o professor Abrão Ackerman (1914-1986).
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Por duas vezes, Bernardino cuidou das reedições particulares do livro "Em Legítima Defesa - a Voz de um Judeu Brasileiro", que seu pai, Bernardo Schulman, em 1937, dois anos antes do início da II Guerra Mundial, publicava em Curitiba, denunciando o nazismo em escalada na Alemanha hitlerista. Gravando um depoimento para o projeto "Memória Histórica do Paraná", no ano passado, Bernardino lembrou, entretanto, que apesar do nazismo na Europa, a convivência de judeus e alemães, na Curitiba dos anos 20 e 30, era perfeita. Ele próprio estudou na Escola Alemã, "quando ali aprendi a falar tão bem o alemão que até desaprendi o português".
Tendo nascido e crescido em Araucária - onde seu pai era comerciante estabelecido no setor de exportação de cereais, Bernardino estava sempre ligado ao comércio, "exportando grãos para muitos países" - repetia.
Memória prodigiosa, bom humor e sensibilidade, Bernardino prometia há muito dedicar-se às suas memórias - e, agora, com sua morte, espera-se que originais que eventualmente tenha deixado sejam divulgados. Afinal, em seu estilo simples, com o toque idish, Bernardino era capaz de falar com graça até dos problemas da velhice, como numa poesia de toques picarescos que aqui publicamos há alguns meses.
LEGENDA FOTO - Bernardino Schulman, com sua morte a cidade perde um pouco mais de sua história.
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