Um espaço muito inglês na Curitiba do passado
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 07 de abril de 1991
Uma crônica da Curitiba neste século não poderia, jamais, excluir a Mansão e o bosque dos Gomm, em seu estilo único, com 926 metros distribuídos em três pavimentos, com sete lareiras e que construída entre 1912/1913, abrigou, por mais de seis décadas, uma das famílias de maior tradição.
Nos robustos argumentos que substanciaram o tombamento do imóvel, vários conselheiros - especialmente os professores Ruy Wachowicz e Regina Wallbach - argumentaram das ligações desta mansão com um dos episódios da história paranaense: a presença da "Southern Brazil Lumber and Colonization" - vinculada à "Brazil Railways & Co.", que após atuar na área das ferrovias instalou na localidade de Três Barras, na divisa do Paraná com Santa Catarina, o mais moderno e sofisticado instrumental para uma serraria até então trazido para a América Latina. Problemas com posseiros da região levaram a Lumber a ter íntima relação com a chamada Guerra do Contestado (1912-1916). Pois foi a Lumber, em Três Barras, que algumas centenas de araucárias, cortadas na lua minguante, foram separadas para a construção da mansão de um dos dirigentes da empresa, o inglês Henrique Gomm (1867-1929), que após ter morado na Argentina e passado 7 anos no Paraguai, veio em 1901 para o Paraná. Em Prudentópolis, instalaria o primeiro Barbaquá (rústica usina de beneficiamento de erva-mate), em nosso Estado, transferindo-se depois para Curitiba. Aqui casou com Isabel Whiters (1885-1977), tendo seis filhos - Harry Blass (1908-1976), Cosme (que morreu na Inglaterra, como piloto da RAF, aos 32 anos, em 15 de agosto de 1943), Winston (1922-1984), Patrícia (esposa do empresário Curt Oscar Mueller), Consuelo (que aos 78 anos reside em São Vicente, em São Paulo) e Percival, 68 anos, que reside em Niterói. Ao morrer, em 1929, Henrique Gomm era um dos sócios da Companhia Stearina do Paraná, depois de ter sido ervateiro e trabalhado como executivo na Lumber, período em que construiu sua mansão.
Seu primogênito, Harry Blass, seu sucessor na Stearina, seria também cônsul honorário da Inglaterra por 15 anos (1940-1955), período em que a Mansão do Batel teve seu período social mais intenso. Casado com dona Luiza Bueno Gomm (1911-1987), de uma família de diplomatas e barões do café de São Paulo, Harry residiu até 1959 no Batel, quando se mudou para sua nova mansão, no Jardim Los Angeles. No Batel, nasceria o primogênito - e hoje advogado, George, em 7 de junho de 1932. Seus irmãos, Irene Cosme Blass e Henrique (gêmeos) nasceriam em Montevidéu e na Maternidade Victor do Amaral, respectivamente.,
- "Quando eu nasci a Avenida Batel, chamava-se Siqueira Campos" - lembra. Seu irmão caçula, o advogado Blass, 45 anos, da Procuradoria Jurídica do BADEP, diz que "hoje, quando passo pela frente da casa, sinto uma dor no coração em ver seu abandono".
Quando a família Gomm deixou o imóvel, em fins de 1959 (a viúva do construtor, dona Isabel, havia se transferido para São Paulo), a mansão foi alugada a um rico paulista que chegou a Curitiba na época, Francisco Lacerda Motta. Em 1962, o imóvel - por suas excepcionais condições - foi alugado pelo Governo Americano, para residência do diretor do United States Information Service (USIS), Mr. John Parker Lee (1962-1981), numa época (1955-1965) em que os americanos tinham expressiva presença em Curitiba, com um grande consulado e ativíssimo serviço de informações culturais - que viria a ser desativado na segunda metade dos anos 60.
Quando Mr. Lee retornou aos EUA, a casa foi devolvida a família, e Dona Isabel, vindo de São Paulo, voltou a ali residir, permanecendo até a sua morte há 14 anos. Foi quando o imóvel foi alugado ao professor Egas Lzique, associado a um grupo de médicos, que ali instalaram uma policlínica sofisticada, funcionando até a venda o imóvel à firma Soifer, Berman & Cia. Ltda. A assinatura da escritura de venda do imóvel aconteceu na manhã do dia 21 de janeiro de 1987, comparecendo pelos herdeiros, como inventariante do espólio de Isabel Whiters Gomm, a sua neta, Irene Gomm Ferreira dos Santos, esposa do advogado Luiz Geraldo Caillet Pereira dos Santos, e que, entre outras funções, exerceu a de chefe do Cerimonial do Palácio Iguaçu, no curto governo Haroldo Leon Peres. Anteriormente, no Governo Paulo Pimentel, a sua sogra, Sra. Luiza Bueno Gomm, havia ocupado idêntica função.
O valor que consta da escritura é de Cr$ 21 milhões com a observação de que era pago o imposto SISA "sobre a avaliação de Cr$ 36.900.000,00".
Hoje, o valor aproximado do imóvel, segundo cálculos do empresário Salomão Soifer, é de um milhão de dólares. Basta fazer as correções monetárias e verificar que o negócio não poderia ter sido mais lucrativo aos atuais proprietários, independente das pendências judiciais existentes.
LEGENDA FOTO - A Sra. Luiza Bueno Gomm, uma pioneira em sua época - amazona, primeira mulher a receber o brevê como piloto civil no Paraná, chefe do Cerimonial do Governo no Estado do Paraná, numa foto dos anos 40, feita na entrada do jardim da mansão de sua família. A propriedade abrigava amplas cavalariças no fundo (foto arquivo Blass Gomm).
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