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Aramis

Bienal sem Ibope e a animação holográfica

Jacob Klitowitz é um crítico de artes plásticas que, ao contrário de seu sobrenome, repleto de consoantes, é bastante fácil de ser entendido também ao contrário de tantos colegas da confraria dos analistas das artes visuais. Jacob, em seus contundentes textos no "Jornal da Tarde", de São Paulo, não se limitam a adjetivos favoráveis a tudo que é exposição mas, ao contrário, sabe aplicar farpas afiadas quando o expositor merece. Por sua independência e seriedade, Klintowitz conquistou o respeito e a admiração de artistas e dirigentes de entidades culturais que sabem apreciar (e valorizar) a boa posição crítica, o que tem valido ao crítico do JT convites do pintor Fernando Velloso, diretor do Museu de Arte Contemporânea do Paraná, a integrar alguns júris locais - e hoje já são muitos os seus amigos em meios plásticos. Assim, no momento em que Klintowitz lança um demolidor ensaio crítico com o estranho (embora informativo) título de "30 segundos de televisão valem mais do que 2 meses de Bienal em São Paulo. Isto é bom ou ruim? (Summus Editorial, 112 páginas, Cr$ 400,00), consegue tocar num ponto até hoje raramente abordado: desmistificar uma promoção (dita) cultural, mas que há anos vem merecendo críticas e reparos. Mais do que a simples análise feita por Klintowitz - num volume de textos curtos, facilmente assimiláveis e ilustrado com dezenas de fatos que já constituem uma espécie de sátira [à] criação de Cicilo Matarazzo - o livro do crítico paulista deveria servir como ponto de reflexão aos mandarins da cultura tupiniquim que, nos últimos anos, tem inundado a cidade de dezenas de mostras, retrospectivas, individuais, etc, de discutíveis validades - enquanto as exposições de artistas que pulam do anonimato (ou amadorismo) para um (pseudo) profissionalismo se sucedem. Depois que Jorge Carlos Sade, briguento mas profissionalmente respeitável, conseguiu fazer da Acaiaca, uma galeria de arte merecedora desta classificação, vários outros espaços comerciais se abriram. Curiosamente, muitos deles, de propriedade de amadores, sem vivência no setor, acabaram se transformando muito mais em espaços para amenidades sociais do que, efetivamente, ponto de artes visuais. Alguns, inclusive, honestamente, abandonaram a área, como é o caso do comerciante que utilizando uma mansão no Batel, esquina com a Rua Buenos Aires, concluiu após alguns meses de poucos resultados financeiros, que seria melhor transformar a "Nova Fase" num "Zamzibar" - bar ao estilo inglês, poltronas de couro, garçons, fantasiados, jogos para os fregueses se distraírem enquanto bebericam - naturalmente, preços compatíveis [à] realidade inflacionária do País. Ou sejam, tão caros como em qualquer outro bar destinado [à] classe social mais (pretensamente) sofisticada. xxx Mas deixemos a "Nova Fase" que se transformou no "Zamzibar" e retornemos ao livro de Jacob Klintowitz. O lançamento do volume coincide com a realização de mais uma Bienal de São Paulo. E se no passado, a promoção tinha uma repercussão nacional, assanhando os arraiais plásticos tupiniquins sempre que algum "talento" da terra conseguia ser aceito, hoje pouca importância se dá. Klintowitz, em sua linguagem jornalística e objetiva, lembra que em 1979, a Bienal recebeu nos dois meses em que esteve aberta apenas 40 mil visitantes, entre os quais devem ser incluídos os estudantes de escolas públicas, "levados em ônibus especiais, forçados a preparar composições do tipo "minha visita à Bienal de São Paulo". Um esforço educacional, já se vê". Comentando, assim, a pouca audiência da Bienal, Klintowitz analisa uma realidade da nossa época. A pouca audiência é uma realidade e um dado de qualidade pública do acontecimento. A Bienal de São Paulo, como uma grande realização, é feita para ser vista. Só que a Bienal de São Paulo, constata Klintowitz, "não tem qualquer audiência. Ela tem menos audiência do que o filme de sucesso exibido numa grande cidade num único cinema. A Bienal não tem audiência porque ela não interessa a ninguém. Ela não interessa a ninguém porque não é capaz de trazer qualquer tipo de contribuição porque, em termos de comunicação, é redundante. É redundante porque diz o que todo mundo já sabe, porque já viu e ouviu em revistas, jornais, tv, rádio, cassetes, livros, catálogos. A Bienal é redundante, portanto, porque está atrás dos veículos de comunicação de nossa época. A Bienal não tem qualquer importância cultural, tecnológica, comunicativa. Como não tem qualquer importância a maioria dos programas e promoções chamados de "cultos". Criada em 1951, 56 anos após a primeira Bienal em Veneza - na qual se inspirou, sem quaisquer modificações - a Bienal ao longo de três décadas tem sofrido críticas e elogios. Obviamente que a forma contundente que Jacob Klintowitz a aprecia agora provocará repostas e polêmicas, mas que serão salutares na medida em que contribuam para fazer esta instituição agilizar-se. Afinal, para o crítico paulista, um verdadeiro acontecimento cultural nos dias de hoje só é possível de acontecer mediante duas possibilidades: o laboratório (que é a criação individual da linguagem) e a comunicação (que é a criação coletiva de linguagem). O artista é mais importante do que nunca - pois a sua produção chega, de maneira direta, a todos os indivíduos. O grande artista, o grande criador de formas, influencia e transforma o mundo social. Só que frente [à] tecnologia da informação cada vez mais desenvolvida exige que a arte - ou suas instituições - se agilizem cada vez mais, o que, no entender de Klintowitz, não ocorre com a Bienal. xxx As colocações de Jacob merecem leitura, reflexão e discussão de quem de direito. Aqui fica apenas o registro do livro. Assim como lembramos, a propósito, que o Centro de Criatividade (Parque São Lourenço), dois produtores, Pedro D'Alessio e Ivam de Nigro, responsáveis pela mostra de holografia - uma técnica nova, que mostra a imagem tridimensional, estão provando com uma exposição não precisa ficar estática, apenas na fase contemplativa. Desde a inauguração da exposição, há 3 semanas, a dupla vem se preocupando em promover eventos paralelos. O irreverente compositor-cantor Jards Macalé já promoveu um happening sonoro, num fim de semana; há uma semana foi a mostra crítica da televisão que agitou vários espaços da cidade e hoje a note um programa mais tranqüilo: o seresteiro Claudionor Cruz ali vai apresentar ingênuas serestas e choros, entre painéis com hologramas - alguns só possíveis de serem vistos mediante a utilização de um aparelho de raio laser. Para o próximo fim de semana, o inventivo tecladista Guilherme Vergueiro vem a cidade para um recital as margens do largo do parque. E, no encerramento da mostra - já em novembro - uma possível (e aguardada) "parceria que deu certo", Gianfrancesco Guarnieri e Leon Hizman, realizadores de "Eles Não Usam Black-Tie" (cine Plaza, 3a semana), o melhor de filme de 1981 (até agora).
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
6
23/10/1981

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