Com apito do trem a memória dos trilhos
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 17 de fevereiro de 1986
Há quase 40 anos que Edilberto Trevisan dedica suas horas de folga a reunir tudo o que se relaciona à história das ferrovias no Paraná. Paranaense das margens do Nhundiaquara, cresceu vendo os trens passarem pela estação de Morretes e a fascinação mágica do mundo da ferrovia o levaria, anos depois (1946) a ingressar na Rede Viação Paraná - Santa Catarina, da qual só se aposentaria há pouco mais de um ano.
Formando-se em Direito - turma de 1954 da Universidade Federal do Paraná - e integrando o departamento jurídico da Rede, mergulharia ainda mais nos ramais da história de nossos trilhos, fundindo-se assim o espontâneo interesse de pesquisador e historiador com a visão técnica do advogado e funcionário ferroviário.
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Paralelamente à pesquisa de dados, fotos, material iconográfico, Edilberto Trevisan começou a se preocupar com a guarda de tudo aquilo que lembrasse o passado ferroviário. Desde as menores peças até a possível preservação mesmo de grandes máquinas e vagões que, ao serem desativadas, não deveriam ser simplesmente destruídas - ficando ao menos alguns exemplares para que as futuras gerações tivessem uma idéia dos pioneiros tempos dos caminhos de ferro no Sul do Brasil.
Sua dedicação e entusiasmo, vista algumas vezes como uma obsessão supérflua, encontrou, felizmente, apoio de algumas diretorias, de forma que após ele próprio ter sido, uma espécie de zeloso cão-de-guarda da memória ferroviária por quase duas décadas, pôde, finalmente ver criado o Museu Ferroviário, instalado no prédio da antiga Estação Ferroviária. Edilberto viu, assim, no momento em que o Museu foi implantado - e entregue a profissionais especializados na área - que cumpria-se ao menos uma primeira etapa de sua dedicação.
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Mas havia muito mais a fazer. Entre outras necessidades, a de colocar em letra de forma, de forma didática e simples, ao menos um resumo da história de nossas ferrovias. A começar pela mais famosa delas - a ligação Paranaguá-Curitiba, cujo centenário de inauguração comemorou-se no ano passado. De seu bem organizado arquivo, com fotos preciosas de três mestres das imagens - de Marc Ferrez, que foi o fotógrafo oficial dos tempos de D. Pedro II; do grande pioneiro da fotografia no Paraná, Arthur Wischral e, por último, do contemporâneo Helmuth Wagner - reuniu-se um material precioso, de valor visual fascinante e que enriquecido com textos de Edilberto transforma-se agora no livro-álbum "O Apito do Trem".
Em forma de álbum, 130 páginas, editado graças ao interesse do presidente da RFFSA, engenheiro Osires Stenghel Guimarães, em resgatar, de todas as formas, a memória ferroviária não só do Paraná, mas em termos nacionais, "O Apito do Trem" está pronto e terá seu lançamento oficial nos próximos dias.
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Modesto como todas as pessoas realmente talentosas e dedicadas, Edilberto Trevisan, 61 anos, diz que o livro deve ter seus créditos divididos entre Ferrez, Wischral e Wagner, autores das imagens. Marc Ferrez, fotógrafo a quem se deve tanto da memória visual brasileira, vem tendo sua obra resgatada e já por duas vezes a João Fortes Engenharia patrocinou álbuns com suas imagens do Rio de Janeiro do final do século XIX e primeiras décadas deste. A reedição de seu histórico álbum da inauguração da linha Paranaguá-Curitiba - uma raridade hoje, se constituía em acalentado projeto de Cassiana Lacerda Carolo, quando dirigiu o setor editorial da Secretaria da Cultura e Esportes. Infelizmente, apesar de ter feito inúmeras publicações, o álbum não foi reeditado e, naturalmente, com as nuvens negras da intolerância que caíram sobre a área cultural neste infeliz governo José Richa (mas que, como diz, Enock de Lima Pereira, acaba dentro de menos de 100 dias - pois não há mal que sempre dure), o Estado jamais iria se preocupar em sua recuperação.
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Depois de "O Apito do Trem", no qual Edilberto Trevisan historia desde os primitivos meios de transporte, em 1853, até a inauguração dos primeiros trechos ferroviários entre Paranaguá-Curitiba, ele tem outros projetos que, espera, possam ser realizados: as histórias das ligações ferroviárias entre Antonina-Morretes (1892), dos ramais Curitiba-Rio Negro (1891) e Curitiba-Ponta Grossa (1894). As demais ligaçoes ferroviárias no Paraná - especialmente no Norte do Estado, desenvolvidas a partir dos anos 20/30 e com extensões ferroviárias do Estado de São Paulo ficam para futuros historiadores. Modesto, responsável em suas pesquisas, Edilberto diz:
- "Temos que estabelecer parâmetros de pesquisas e fazê-las bem feito. Trabalhando sozinho, sei até onde posso ir em meus estudos. Não vou avançar os trilhos, mas em compensação naqueles em que caminhar meus estudos estão seguros e certos nas informações".
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No ano passado, dentro dos eventos comemorativos do centenário da estrada de ferro Paranaguá-Curitiba, a RVPSC já havia editado "Uma Viagem Pelos Trilhos da Memória" (140 páginas). Organizada por Adélia Maria Woellner e Greta Mendry Ferreira, o volume reuniu depoimentos, trechos de relatórios, textos avulsos, transcrições de documentos etc. - com dezenas de ilustrações. Válido como informação - mas sem a unidade e estilo desejável de uma obra, valeu, de qualquer forma pelo esforço e, sobretudo, mostrou o apoio da diretoria da RVPSC em documentar a efeméride. Agora, entretanto, com o álbum "O Apito do Trem", temos a obra marcante e referencial do documentário de uma das maiores obras de engenharia ferroviária do mundo - visitada anualmente por milhões de pessoas vindas de todas as partes.
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