De como manter ao menos as imagens de uma cidade
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 29 de junho de 1989
Uma antiga sugestão, feita há mais de 15 anos, quando o arquiteto Jaime Lerner ocupava pela primeira vez a Prefeitura, está sendo encaminhada novamente aos executivos da área responsável pelo setor de urbanismo e patrimônio. Inicialmente de forma informal, mas podendo ganhar a oficialização através da Câmara, caso repita-se o que já aconteceu das vezes anteriores - ou seja, o simples "esquecimento" da proposta, a idéia é simples e tem grande alcance. Além do mais, adquire especial atualidade neste momento em que se volta a discutir a questão da preservação de imóveis de valor histórico - tombados pelo município mas cuja preservação enfrenta a natural revolta de seus proprietários, que têm os mesmos impedidos de receberem qualquer transformação - a não ser de acordo com as rígidas normas do tombamento.
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São quase 800 unidades consideradas de interesse de preservação histórica, devidamente cadastradas e documentadas junto à Prefeitura. Estes imóveis - a grande maioria em péssimo estado de conservação - não podem ser demolidos ou reformados, pois entenderam os técnicos da Prefeitura que os mesmos representam aspectos da Curitiba do passado, em si, aliás, pobre de uma arquitetura mais representativa.
Acontece que independente destes imóveis - já comprometidos em sua preservação - a cidade tem em si uma fisionomia, representada por milhares de outras construções - em madeira, alvenaria ou mistas - que mesmo não justificando, em absoluto, serem preservadas - o que traria prejuízos aos seus proprietários, mereceriam, entretanto, terem ao menos guardadas para o futuro, suas imagens. Afinal, dentro de 30 ou 40 anos, com as transformações naturais no perfil urbanístico da cidade, novas gerações não terão lembranças de como eram milhares de edificações que dão hoje a imagem da cidade - como temos observado em velhas fotografias, cenas isoladas das construções do início do século.
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Para criar um amplo arquivo que retenha ao futuro o perfil da cidade, a solução é simples: basta que a Secretaria de Desenvolvimento Urbano (o antigo Departamento de Arquitetura), cada vez que for encaminhado um processo para demolição de um imóvel, exija que o interessado anexe uma documentação fotográfica do mesmo. Independente de seus méritos arquitetônicos, localização ou época em que foi construído, algumas fotos, documentando o imóvel, poderão preservar imagens do mesmo para um grande arquivo.
Como a Secretaria Municipal de Cultura / Fundação Cultural já dispõe de uma diretoria de Patrimônio Cultural, dirigida (com eficiência) pelo jornalista Mai Nascimento Mendonça - e na qual já há um expressivo acervo fotográfico depositado na Casa da Memória - a ampliação da documentação urbana da cidade se ajusta perfeitamente. Para facilitar (e desburocratizar) o atendimento da exigência legal, a ser imposto pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano, a documentação fotográfica poderá ser feita pela própria FCC, que dispõe de fotógrafos e cinegrafistas. Afinal, em casos especiais - quando o imóvel a ser demolido tenha maior importância - além da fotografia, poderá ser feito um vídeo ou mesmo um filme.
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Cobrando-se estas despesas dos interessados na demolição (no caso dos registros fotográficos, o custo será mínimo), a Prefeitura não terá que fazer maiores investimentos. Em compensação, para o futuro - dentro de algumas décadas - as ilustrações que agora podem não ter maior significado, adquirirão especial significado. Imagine-se se já existisse um arquivo de fotografias registrando toda a transformação urbanística do centro da cidade a partir dos anos 40? O que há, são fotos esparsas - embora importantíssimas - conseguidas graças a um trabalho de paciente garimpagem.
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Infelizmente, quando esta sugestão foi levada ao prefeito Jaime Lerner, em 1972, a mesma não prosperou. Retomada algumas vezes, também foi ignorada - apesar da (aparente) preocupação dos donos do poder municipal em preservar o passado. Agora, com a sensibilidade de Manoel Coelho, na Secretaria de Desenvolvimento Urbano; Mai na Fundação Cultural e Cássio Taniguchi, presidente do IPPUC, talvez algo de concreto aconteça. Caso contrário, é de se esperar que algum vereador mais ligado às coisas da cidade - como o próprio presidente da Câmara, Jorge Bernardi - exija, em forma de lei, que esta proposta possa se concretizar..
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