Memória urbanística para preservar a nossa cidade
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 24 de junho de 1990
A visão administrativa do engenheiro Cassio Taniguchi, 48 anos, - um dos mais eficientes executivos surgidos no Paraná nestes últimos 20 anos - faz com que o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba não só volte a ser a Sorbonne do Juvevê - readquirindo o prestígio internacional que ficou comprometido nos últimos anos - como se preocupa também em realimentar a necessária memória urbanística da cidade. Assim, suspendendo a onerosa e discutível revista "Espaço e Tempo" - que teve poucas edições durante a administração Roberto Requião, como mínima repercussão - o IPPUC criou uma publicação mais econômica, objetiva e documental, cuja aceitação é total: "Memória da Curitiba Urbana".
A experiência do jornalista Murá Gomes Heygert, 50 anos, 30 de imprensa, com passagem em inúmeras revistas de circulação dirigida (inclusive a fundamental "Referência em Planejamento", editada quando Belmiro Castor Jobim ocupou, pela primeira vez, a Secretaria do Planejamento), mais a sua vivência de jornalista do dia-a-dia - ex "Diário do Paraná", ex "Voz do Paraná", hoje editor chefe do "Jornal da Indústria & Comércio", trouxe para a "Memória da Curitiba Urbana" a visão objetiva de se fazer uma publicação que, não só agora cumpre sua função como, com a passagem do tempo, a tornará cada vez mais importante como referência para se melhor conhecer a nossa cidade. Aliás, a carência de informações sobre a Curitiba do passado - em que pese a existência da Casa da Memória, criada na segunda administração de Jaime Lerner - dificulta pesquisas em vários setores, fazendo com que todos os esforços no sentido de se colocar fosfato em nossa memória sejam bem vindos.
Buscando a assessoria de gente competente - como Antônia Schwinden (cuja passagem pelo Ipardes, ali também produziu excelentes publicações), Teresa Castro e Thadeu Petzak Filho, mais a colaboração de profissionais como Francisco Duarte, Luiz Geraldo Mazza, Mai Nascimento Mendonça e Marisa Baroni Valério, fez com que, em seus três primeiros números, a "Memória da Curitiba Urbana" adquirisse maturidade. Prova disto é que os pedidos de recebimento se acumulam e o próprio prefeito Jaime Lerner autorizou, na semana passada, a passar para 1500 exemplares, a partir do quarto número - que circula dentro de 40 dias, tendo como tema central o lazer. Antônia Schwinden, já revisa a maioria dos textos exclusivos para esta próxima edição, que, dentro de uma abertura temática, com colaboração que não são obrigatoriamente rígidas e redigidas em linguagem técnica, podem alcançar maior faixa de leitores estará um interessantíssimo estudo sobre "A cidade e o footing".
Nascido de um trabalho acadêmico, iniciado há 5 anos, pelas professoras Maria Cecília Solheide da Costa e Elizabeth Tassi Teixeira, este estudo "de um ritual de comportamento", levanta interessantes visões sobre os hábitos do curitibano - em seu footing desde os tempos dourados da antiga rua das Flores, nos anos 30, até os embalos do Batel.
O número 3 da "Memória da Curitiba Urbana", que está sendo distribuído há duas semanas, abre com um emotivo depoimento que a inesquecível engenheira e planejadora urbana Franchette (Francisca Maria Garfunkel Rischbieter, Santos, 25/9/1929 Curitiba, 27/8/1989) gravou entre abril/maio do ano passado, quatro meses antes de sua morte.
Engenheira da turma 1950 da Universidade Federal do Paraná, ligada a cidade desde 1952 - quando começou a trabalhar na divisão de pavimentação, diretora do Departamento de Urbanismo em 1963, Franchette acompanhou o planejamento urbano desde 1965, antes mesmo da criação da Assessoria de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba transformada depois em IPPUC.
Justamente por ter, durante 25 anos, sido aquilo que se auto-definia como "grilo falante", por suas colocações muitas vezes críticas - mas sempre pensando no futuro da cidade - e dedicadíssima ao planejamento, ao lado de outra engenheira da maior competência, Dulcia Auriquio, Franchette foi uma das mais fortes presenças para que o IPPUC se tornasse a grande instituição que é - e que mesmo com tentativas de destruí-lo, manteve-se com independência técnica.
Outro depoimento precioso é do arquiteto Lubomir Antônio Ficinski Dunin, 53 anos, presidente do IPPUC por 6 anos nas gestões de Jaime Lerner (1971/72) e Saul Raiz (1975/79) (ver texto à parte nesta mesma página).
Nicolau Imthon Kluppel, paranaense de Ponta Grossa, 60 anos a serem devidamente comemorados no próximo dia 4 de julho, engenheiro da turma de 1955 da Universidade Federal do Paraná, é um dos maiores técnicos na área de enchente. Modesto, famoso por seu constante bom humor - especialmente nas histórias em que auto-ironiza suas origens eslavas. Nicolau raramente aparece, deixando que seus trabalhos é que se destaquem. Agora, numa questão de justiça, há o seu depoimento sobre seus trabalhos na Prefeitura, especialmente em áreas ligadas ao saneamento básico - completando-se o seu relato com uma síntese do estudo para a recuperação sanitária do Rio Iguaçu.
Angel Walter Bernal, às vésperas dos 50 anos - a serem completados em 2 de dezembro, um boliviano que se curitibanizou pela graduação como arquiteto (1967), casamento e amor, hoje desdobrando-se entre a Administração Regional do Centro e a tentativa de salvar o abandonado setor de turismo e eventos populares da Fucucu, também presta um belo depoimento, com sua visão de arquiteto, voltado especialmente do meio ambiente - já tendo desenvolvido trabalhos em várias cidades - Angel traz uma visão lúcida e inteligente da Curitiba por ele adotada como a sua cidade.
Finalmente, encerrando os depoimentos, Cassio Taniguchi, braço direito de Jaime Lerner - e de quem, inegavelmente, o burgomestre deve muito do sucesso de suas administrações, bem como do êxito em projetos desenvolvidos em várias cidades do Brasil e exterior também faz um depoimento em que fala de seu relacionamento com o IPPUC a partir de 1971 - e das experiências ali desenvolvidas, tanto entre 1980/1983, como atualmente.
Num texto em que alterna imagens nostálgicas de sua infância com informações técnicas mas sem esquecer a poesia - encerrando, inclusive, com uma estrofe do "Paisagem do Capibaribe" do pernambucano João Cabral de Mello Neto, o jornalista Luiz Geraldo Mazza traça em "Iguaçu, o nosso Ganges, o nosso Reno", um perfil dos rios que cortam Curitiba. Colaborador desde o primeiro número da "Memória da Curitiba Urbana", Mazza, em seu texto perfeito, engrandece esta edição, falando dos rios e tanques nos quais os garotos de sua geração - ele que já passa dos 60 anos mas conserva a intensidade criativa e rebelde de um jovem de 20 anos - mergulhavam em águas barrentas e faziam suas pescarias. Hoje, distante das braçadas como nadador, Mazza continua, entretanto, a ser um pescador fiel em seus fins-de-semana.
LEGENDA FOTO 1 - Franchette, depoimento para a história de Curitiba.
LEGENDA FOTO 2 - Cassio, a visão da cidade.
LEGENDA FOTO 3 - Nicolau, um justo reconhecimento.
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