Lei Mendonça preocupa a nossa "Lei Vanhoni"
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 27 de agosto de 1991
Embora todo o expediente da sessão de hoje na Câmara de Curitiba deva ser dedicada a um assunto explosivo - a discussão do bonde, num investimento de quase US$ 300 milhões de dólares - com a presença do presidente do IPPUC, engenheiro Cassio Taniguchi (*), ao menos um dos vereadores do PT Angelo Vanhoni, tentará, no finalzinho da tarde, fazer contato telefônico com colega de São Paulo para saber os resultados de um outro assunto que tornará histórica a sessão da Câmara na capital paulista.
É que será votado na sessão de hoje, na Câmara Municipal de São Paulo, o adendo orçamentário que permite a execução da Lei nº 10.923/90, de incentivo à cultura, de autoria do vereador Marcos Mendonça (PSDB). Conforme "O Estado de São Paulo" registrou no sábado, 24, na pauta de votação desde abril, "a apreciação do adendo tornou-se um insólito de batalha estético-partidário". Sua votação tem sido constantemente adiada pela maioria dos vereadores em função de suas divergências políticas.
A situação ganha uma condicionante dramática: se não houver hoje a aprovação da emenda, a 21ª Bienal Internacional de São Paulo - com inauguração prevista para setembro - possivelmente será suspensa, pois conforme declarações do presidente da Fundação Bienal, Jorge Stockler, somente com recursos que a Lei Mendonça viabilizará será possível conseguir os quase US$ 3 milhões necessários ao evento - cujo orçamento inicial era de US$ 4 milhões. Até agora, só existem US$ 900 mil em caixa, obtidos com o aluguel do pavilhão do Ibirapuera para feiras e exposições industriais (só com funcionários, a Bienal gasta US$ 80 mil por mês).
Os eventos paralelos, cuja coordenadoria é dirigida pelo jornalista João Cândido Galvão, e que prevê a participação da vanguarda criativa americana com o encenador Bob Wilson, o Teatro Nacional da Romênia e as retrospectivas como a de Di Cavalcanti e Lasar Segall, estão totalmente ameaçados.
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Autor da lei semelhante a "Mendonça", o vereador Angelo Vanhoni, 36 anos, que teve a alegria de ver aprovado seu projeto, por unanimidade, na semana passada - conforme aqui registramos - está consciente de que apesar da simpatia que cerca sua iniciativa, preocupa-se com sua aplicação. Pretendia ter uma audiência com o prefeito Jaime Lerner - que deverá sancioná-la dentro de 50 dias - em audiência a qual levaria um grupo de lideranças culturais, mas devido a nova viagem do burgomestre ao Canadá (o que o livrou, inclusive de ter que comparecer hoje na Câmara), o encontro foi adiado sine-die. Se em São Paulo, a Lei Mendonça - embora já sancionada - não pôde ainda ser aplicada, em Curitiba, apesar da otimização existente, teme-se que a própria fundação Cultural de Curitiba - enciumada pelo que o projeto representa em relação a danosa política oficial - possa tentar criar problemas para que Lerner sancione e regulamente o documento legal que, se fosse aplicado este ano (o que dificilmente acontecerá) representaria aproximadamente Cr$ 900 milhões em favor da produção cultural local - liberta da burocracia e dos discutíveis "planos" da Fucucu - que, na maioria das vezes tem torrado seu orçamento bilionário (de quase Cr$ 3 bilhões este ano, o que lhe dá um custo/dia ao redor de Cr$ 7 milhões), em iniciativas, muitas vezes, discutíveis.
Portanto, o exemplo paulista é importante para condução das futuras negociações em Curitiba, acrescentando-se agora mais um exemplo. Em Campinas, a Câmara aprovou leis vinculando a aplicação de recursos orçamentários a produção artística e cultural - garantindo investimentos públicos superiores a Cr$ 7,6 bilhões (US$ 2 milhões) para 1992 e criando o Conselho de Cultura da cidade (outro projeto que a Câmara de Curitiba também deverá oficializar) em que a participação do poder constituído é minoritária (dois membros em 18 conselheiros). Em Campinas, a lei cria o conselho de Cultura - um substitutivo apresentado pelo vereador Alcides Mamizuka e elaborado com o auxílio do competente secretário de Cultura e Turismo do município, Célio Turino - atribui a instituição à gestão dos recursos destinados à área. Ou seja, ao município caberá a administração dos espaços, mas a política de investimentos será estabelecida pela sociedade, representada no Conselho de Cultura. A lei Vanhoni, conforme aqui noticiamos, será disciplinada por um conselho específico, também com a participação da comunidade e evitando-se que haja a danosa (e politiqueira) influência da Fucucu, em sua prática de privilegiar "amigos" ligados a sua diretoria - como tem ocorrido nos últimos 2 anos. Para a elaboração do conselho, todas as entidades ligadas a produção cultural da cidade farão listas tríplices das quais serão escolhidos 7 integrantes. Categorias que estão desorganizadas e divididas, sem entidades representativas - como a dos cineastas e videastas - terão que se estruturar nas próximas semanas, pois, caso contrário, ficarão excluídas de terem representatividade no organismo que orientará a futura distribuição de recursos. Nesta semana, acredita-se, haverá uma primeira reunião dos criadores audiovisuais, para tentar superar atritos e polêmicas e fundar uma nova entidade - já que a antiga secção regional da Associação Brasileira de Documentaristas caducou pela falta de renovação (e atuação) de seus diretores.
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A reunião de hoje da Câmara de Curitiba deverá ser das mais concorridas, pois embora o presidente do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba, engenheiro Cassio Taniguchi, seja respeitado e admirado como um dos mais eficientes técnicos do país - e na verdade o grande auxiliar para os projetos desenvolvidos por Lerner, que deve a ele mais de 70% do êxito de suas três administrações (além dos bem sucedidos projetos na iniciativa privada), a questão do bonde urbano suscita muitas discussões - e, por certo haverá respingos em relação a problemas ligados ao IPPUC. Um deles - e que deve ganhar agora maior repercussão - é a do escândalo envolvendo o deputado Rafael Greca de Macedo, pretenso auto-candidato dentro do PDT (apesar de ali existir forte repulsa ao seu nome) à Prefeitura e que nomeado funcionário do Instituto em 1983, ali só teve uma modestíssima presença durante 5 anos. Iniciando depois uma barroca carreira política - eleito como vereador - Rafael nunca mais teve qualquer vínculo de real trabalho com o IPPUC e embora renunciasse ao gordo salário, consta até hoje como "servidor" de seus quadros. A vereadora Zélia Passos, ex-funcionária do IPPUC - e que efetivamente ali trabalhou - denunciou, com apoio da bancada do PT e de outros vereadores independentes - o fato de que Greca pretendia as vantagens de uma reclassificação (sic) como funcionário municipal - o que o beneficiará quando chegar o tempo de aposentadoria. Ou seja, o trêfego parlamentar estará repetindo em Curitiba uma das irregularidades do hoje encurralado ex-governador Orestes Quércia, de São Paulo: tendo exercido por pouco mais de um ano o cargo de fiscal de rendas, Quércia aposentou-se há alguns meses com salário de quase um milhão de cruzeiros. Rafael, quando aposentado, ganharia mais um altíssimo salário do município sem, na verdade, praticamente ter trabalhado nem por um semestre no IPPUC.
Nota
(*) O projeto do bonde expresso para Curitiba vem desde a segunda gestão do prefeito Jaime Lerner. Da parte do município há sólidos argumentos para justificar esta opção de transporte de massa, mas embora a proposta oficial tenha sido aprovada no ano passado pela Câmara - inclusive com apoio da bancada oposicionista - novos questionamentos surgiram a partir da ação popular que o vereador Doático dos Santos (PMDB) impetrou contra este projeto. Na sessão de hoje, um dos depoimentos será o do jornalista Luiz Geraldo Mazza ("Folha de Londrina"), que vem estudando profundamente a questão - e tem várias restrições.
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