Constituinte adiou o Festival de Brasília
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 20 de setembro de 1988
Até ontem, Fernando Severo ainda não havia recebido confirmação sobre se "O Mundo Perdido de Kozák" poderá ou não disputar o 21o. Festival de Brasília do Cinema Brasileiro (5 a 11 de outubro). É que o regulamento deste evento - o mais antigo do cinema brasileiro - veta a participação, na área competitiva, dos filmes que já tenham obtido premiação principal em outros festivais. E o documentário sobre o pioneiro Vlademir Kozák (1897-1979) após ter dado a Severo o Kikito de melhor roteiro (categoria curta, 16mm) no XVI Festival do Cinema Brasileiro de Gramado, teve mais quatro premiações: o Sol de Prata como melhor filme e direção no IV Rio-Cine Festival (além do troféu Macunaíma, do conselho Nacional de CineClubes, como melhor filme daquela mostra) e, na última quarta-feira, 14, o Tatu de Prata, como melhor curta, categoria documentário, na XVII Jornada de Cinema da Bahia - dividido com a produção cubana "Uno, Dos Eso Es", de Miriam Tavalera.
Se disputar em Brasília, por certo o emotivo e competente filme de Severo poderá obter mais uma premiação, pois méritos não lhe faltam. Cineasta que vem construindo uma carreira consciente, paralelamente a um sólido trabalho na área de produção de material audiovisual para o Centro de Ensino Tecnológico Federal (cuja direção deve se orgulhar de ter um profissional de seu nível), Severo aproveitará suas férias em outubro para fazer as filmagens de "Longas Sombras no Final da Tarde", ficção, 15 minutos, livremente inspirado em texto de Jorge Luiz Borges.
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Na edição que atinge sua maioria [maioridade] - aliás, com atraso, pois devido a problemas políticos durante a fase da ditadura foi suspenso por cinco anos - o 21o. Festival de Brasília do Cinema Brasileiro foi adiado - passando de 5 a 11 para o período de 20 a 26 de outubro.
A data de inscrição foi também prorrogada até o dia 20 de setembro - o que possibilitará que filmes ainda em fase de finalização (laboratório, sincronização) possam concorrer.
A razão do adiamento é que a sua abertura coincidiria com a promulgação da Constituinte, o que traria muitos problemas - inclusive no transporte aéreo para os participantes dos dois acontecimentos.
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Marlos Nobre, diretor do evento, introduz este anos várias modificações. No ano passado, Nobre acabava de ser nomeado para a presidência da Fundação Cultural do Distrito Federal em substituição ao poeta Reynaldo Jardin, quando o festival tinha início. Marlos estava ainda na Europa, desligando-se de seus múltiplos compromissos (concluía sua gestão no comitê de música da UNESCO) de forma que nem chegou a acompanhar o evento. Em compensação, para este 21o. Festival, Marlos assumiu sua direção de forma total.
Homem prático, com experiência em vários setores - inclusive o Instituto Nacional de Música da FUNARTE, do qual foi o primeiro diretor - Marlos decidiu transferir o Festival do Cine de Brasília - pertencente à Fundação - para o distante mas amplo Parkshopping, com oito cinemas e toda uma infraestrutura. Com isto o Parkshopping assumiu o patrocínio do evento, liberando a Fundação do problema maior - a falta de recursos que, no ano passado, impediu inclusive que patrocinasse o encontro dos pesquisadores de cinema, um dos eventos paralelos que tem marcado o Festival de Brasília nos últimos anos.
Apesar da transferência do Festival para o Parkshopping ter provocado algumas polêmicas - a partir da decisão do cineasta Vladimir Carvalho, que integrava a comissão consultiva, em se afastar de sua organização - Marlos Nobre, com apoio executivo direto de sua esposa e assessora, a coordenadora adjunta Maria Luiza, vem se empenhando para que o Festival apresente "significativa mostra da produção cinematográfica brasileira e promova ampla discussão sobre a atual situação da produção, veiculação e pesquisa em cinema no país, compra e venda de filmes, importação e exportação e a problemática do vídeo".
Com prêmios para filmes de longa e curta-metragem que poderá chegar a mais de Cz$ 30 milhões, haverá mostras competitivas em 16/35mm, um festival do cinema infantil, exposições, lançamentos de livros, revistas e cartazes cinematográficos, encontros de pesquisadores e dois seminários nacionais, um sobre cinema dos anos 30 e outro sobre a trilha sonora do cinema brasileiro - o que de certa forma dá seqüência a pioneira mesa-redonda sobre "a música do cinema brasileiro", que idelizamos e coordenamos durante a I mostra do Cinema Latino-Americano (Curitiba, 3 a 10 de outubro de 1987)
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Nos próximos dias serão divulgados os filmes selecionados para as mostras competitivas, havendo grandes possibilidades de concorrerem longas recém-concluídos - como "Abolição" de Zózimo Bulbul (sobre a questão negra), que deveria ter aberto a XVII Jornada de Cinema da Bahia mas cuja cópia não ficou pronta a tempo; "Jorge, um brasileiro", de Paulo Thiago (do romance de Oswaldo França Jr., produzido com a participação da Volvo).
Também filmes finalizados há meses, mas ainda inéditos no mercado, poderão ser levados na competição de Brasília - como "Romance de empregada", de Bruno Barreto (até agora só mostrado em Cannes e na noite de encerramento do XV Festival de Gramado), além de concorrer também "Romance", do paranaense Sérgio Bianchi.
Marlos Nobre pegou o pião-na-unha para devolver a Brasília um grande festival e sem temer a polêmica, assuimu várias modificações. Justifica a política mais agressiva da associação com a iniciativa privada - no caso o Parkshopping (mas outros poderão vir) "e quem ganha é o cinema nacional".
"No Brasil não há falta de talento. Faltam recursos. Se a Lei Sarney permite que venham estes recursos, temos que ir buscá-los. Acredito que conseguiremos fazer do Festival de Brasília um grande festival. Ágil, moderno, inteligente, levamos para dentro de um centro comercial porque ali o funcionamento simultâneo de vários cinemas e o fácil acesso de convidados, participantes e público criam um clima altamente favorável à realização de um evento desta natureza. Além disso, ampliamos o festival pois terão contato com ele aqueles milhares de consumidores potenciais que freqüentam um shopping-center diariamente".
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