"A Cor Púrpura " da injustiça do Oscar
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 05 de agosto de 1986
Para provar de que não é apenas o golden boy do cinema de entretenimento, capaz de acumular os maiores sucessos de bilheteria, Steven Spielberg, 40 anos, realizou no ano passado um dos filmes mais emocionantes dos últimos anos: "A Cor Púrpura". Indicado a 11 Oscars, não teve uma única premiação na noite de 24 de março, na 58ª festa de entrega dos troféus, confirmando-se, assim, mais uma clamorosa injustiça da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood.
Emocionante, belo, perfeito, da primeira a última sequência, em sua longa-metragem (2:40 minutos), "The Color Purple" finalmente chega ao Brasil. Domingo a noite, houve uma primeira exibição pública no Rio de Janeiro (sábado, pela manhã, em Curitiba, foi vista por um pequeno grupo) e, ontem cedo, uma das atrizes, Margaret Avery, conversou com jornalistas da área cinematográfica, convidados pela Warner Brothers, de vários Estados.
Intérprete da cantora Shug Avery - personagem da maior importância dentro da estrutura do filme - Margaret veio ao Brasil para promover "A Cor Púrpura", que estréia no eixo Rio-São Paulo nesta semana e, a seguir, chega a várias outras capitais (em Curitiba, ainda não tem data marcada, mas possivelmente será o filme de reabertura do Bristol, que está sendo [reformado] há vários meses).
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No próximo domingo, o O Estado do Paraná - único jornal de Curitiba presente na entrevista de Margaret Avery - dedicará uma página "A Cor Púrpura", mas podemos já antecipar algumas informações sobre esta atriz, que como as demais intérpretes do filme ainda são desconhecidas do grande público.
Dos cinco filmes que Margaret Avery fez até agora, apenas um chegou ao Brasil: "Magnum Force", policial dirigido e interpretado por Clint Eastwood. Entretanto, sua carreira começou há alguns anos, aparecendo em peças de teatro e atuando em dois filmes inspirados em figuras históricas da música americana - Scott Joplin (1867-1917) e Louis Armstrong (1900-1971). No teatro, além de fazer um dos grandes sucessos da temporada de 1981, em Los Angeles, ganhou o prêmio Drama desk Critics por sua atuação em "Does a Tiger Wear a Nicktie?", no Zodiac Theater.
A própria coincidência de interpretar uma personagem dramática, com o nome de Shug Avery - quando ela se chama Margaret Avery - influi em seu trabalho neste filme que a lança internacionalmente. Diz Margaret que a emoção começou ao ler o livro de Alice Walker (vencedor do prêmio Pulitzer, editado no Brasil pela Marco Zero).
- "Quando li o livro pela primeira vez fui imediatamente atraída por Shung. Gostaria de acreditar que possuo um pouco dela. Porém, ela é muito mais livre que eu, e foi nisto que eu tive de batalhar mais para representar o papel".
Shug Avery, uma sensual cantora de blues em "A Cor Púrpura", é a personagem que desperta a consciência e os valores de Celie (Whoopi Goldberg), esposa do cruel e machista Albert (Danny Glover). Amante apaixonado por Shug Avery, Albert leva-a para sua casa e deste deprimente relacionamento nasce uma afetuosa relação entre as duas mulheres. Falando de sua personagem fascinante e ambígua - Margaret Avery diz:
- "Para me auxiliar, eu comecei a pensar como Shug todos os dias, muito livre e aberta. Mesmo que eu não falasse com as pessoas da maneira que ela falaria, eu pensava no que ela teria dito. Eu fazia questão de fazer, todo dia, pelo menos uma coisa do modo como ela teria feito".
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Com raras exceções, todo o elenco de "A Cor Púrpura" é de intérpretes negros. Possivelmente desde 1929, quando King Vidor (1894-1982) realizou "Aleluia" (Hallelijah), não se fazia um filme tão sensível e sincero em torno dos negros americanos. Com a ação estendendo-se por 4 décadas - entre 1909/1948 - e ambientada em pequenas comunidades da Georgia, "A Cor Púrpura" é um exemplo de como um romance considerado difícil (todo construído em forma de cartas da personagem Celie para Deus) teve um roteiro perfeito, trabalho do Menno Meyjes - profissional novo nesta área. Entre os Oscars que "A Cor Púrpura" mereceria, estavam, certamente, os de roteiro adaptado (perdeu para Kurt Luedtke, por "Entre Dois Amores"), trilha sonora (Quincy Jones, perdendo para John Willians, também para "Entre Dois Amores"), fotografia (Allen Daviau, perdendo para David Watkin, por "Entre Dois Amores"), canção original (a belíssima "Miss Celie's Blues") e, especialmente, as três atrizes indicadas. Whoopi Goldberg na categoria principal (perdeu para Geraldine Page por "The Trip to Bountinful", filme sem previsão de lançamento no Brasil); como atrizes coadjuvantes, Margaret Avery e Oprah Winfrey (perderam para Angelica Huston, por "A Honra do Poderoso Prizzi").
Assistindo-se a "A Cor Púrpura", tem que se reconhecer que os membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood inclusive a de melhor filme - (perdeu também para "Entre Dois Amores"), esta obra séria e profunda de Spielberg (que, entretanto, não concorreu na direção), merecia a premiação. Retardado em seu lançamento no Brasil - para evitar um confronto de programação com os outros filmes catapultados pelo Oscar - "The Color Purple" chega nesta semana, com grande impacto promocional. Uma merecida atenção para um filme de rara beleza, que toca nos sentimentos do espectador e com uma história que poderia cair no dramalhão tem aquele toque maravilhoso de Spielberg, cineasta marcado pela sensibilidade, emoção e, sempre, com a visão de marketing cinematográfico que faz cada nova realização sobrepor-se a anterior. E mostrando um talento imenso - distante de filmes que conquistaram milhões de espectadores (de "Tubarão" a "Indiana Jones e o Templo da Perdição") - realizou agora uma obra que engrandece o cineasta emociona o espectador da primeira a última sequência.
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