Dois documentários polêmicos mereceram prêmios
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 03 de outubro de 1989
Cortado pela comissão de pré-seleção do XVII Festival do Cinema Brasileiro de Gramado em junho último, Alain Fresnot, filho de judeus-franceses, nascido em Paris mas residindo no Brasil desde 1950, teve sua revanche nas duas últimas semanas. No III Festival de Cinema de Natal, encerrado no dia 24, viu seu longa "Lua Nova" obter algumas premiações: Lima Duarte, melhor ator (dividido com "Corpo em Delito", de Nuno Cesar Abreu, que foi o grande vencedor em Natal); Pedro Farkas pela fotografia. Em Curitiba, Fresnot duplicou a premiação: Melhor filme, ator (novamente Lima Duarte), roteiro (Fresnot/Isa Castro/Luís Fernando Coni) e trilha sonora (Arrigo Barnabé).
Maria Letícia, ex-atriz e que investiu tudo que tinha na transposição a tela da peça "Vejo um vulto na janela, me acudam que sou donzela" de Leilah Assumpção (que ela interpretou por mais de um ano no Teatro Nelson Rodrigues, no Rio de Janeiro) em Gramado havia obtido apenas duas premiações: atriz para Rosa Maria Murtinho e Marlene Alvim como montagem. Em Curitiba, foi ela que levou o prêmio (passagem para Alemanha e troféu) como diretora enquanto Marlene foi mais uma vez premiada. Usando o recurso de intercalar a narrativa ficcional do filme com seqüências de cine jornais da época (1963/70), a montagem de Marlene (que é esposa do cineasta Maurício Capovilla) sempre encanta júri e público.
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Polêmica foi a premiação dos dois documentários. O excelente "Rio Leningrado; Sem Fronteiras" de Luís Carlos Ribeiro Prestes, 30 anos, e do seu colega russo Valeri Noumov, 35, conquistou, de princípio, a simpatia de três dos cinco jurados. Era candidato forte a sair com a premiação de melhor filme do Festival - principalmente considerando os concorrentes vistos nas primeiras noites. Entretanto, nos longos debates entre os jurados, na manhã de sábado, cresceu o favoritismo a "Lua Cheia" e também Maria Letícia acabou ficando como a melhor diretora.
Assim, esta primeira co-produção Brasil-URSS - inédita em circuitos comerciais (seu lançamento se dará apenas depois da I Feira Comercial Brasil-Leningrado que vai acontecer no final do ano no Rio de Janeiro) acabou merecendo um prêmio especial do júri, com o destaque de "... pelas suas qualidades artísticas e significado na aproximação dos povos" - além do prêmio de melhor fotografia (Antonio Venturi).
Enxuto em sua narrativa, sem proselitismos, com uma imensa generosidade na visão tanto do Rio de Janeiro como Leningrado, o filme de Luiz Carlos Ribeiro - que é o editor também do (excelente) mensário "Cine Imaginário" - é o exemplo de documentário para aproximar os povos. Seu lançamento mundial ocorreu numa sessão paralela no V FestRio, em novembro do ano passado, com a presença de seu pai - o lendário Luís Carlos Prestes, o prefeito de Leningrado e outras autoridades. Em maio, o filme foi visto por mais de 30 milhões de espectadores ao ser apresentado pela televisão na União Soviética. Agora, se houver um bom lançamento em circuitos especiais, possibilitará que os brasileiros conheçam um pouco de Leningrado - cidade-irmã do Rio de Janeiro, e na qual Luís Carlos e Valério, irmanados no projeto, encontraram muitas afinidades.
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O segundo prêmio especial do júri foi para o filme mais polêmico do Festival: "Orí", de Raquel Gerber, antropóloga, cineasta e uma espécie de africanista cinematográfica que se dedicou por dez anos neste projeto. Prejudicado pela péssima qualidade do som na noite de exibição (era impossível entender a narrativa da historiadora negra Beatriz Nascimento, condutora do filme), "Orí" ao longo de seus 91 minutos acompanha, a partir de 1977, o processo dos movimentos negros no Brasil e na América, através de suas lideranças, pensamento e ideologia. Rodado em vários Estados (São Paulo, Minas, Alagoas) e também no Senegal, Mali e Costa do marfim, "Orí" já teve duas premiações internacionais e nos próximos meses será levado a uma dezena de outros festivais.
Como estréia no próximo dia 5, no Groff - dentro do projeto "Cinema & Religiões", voltaremos, com mais detalhes, a falar a seu respeito.
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Concorrendo há dois anos em Gramado, "Sonhos de Meninas Moça", segundo longa de Teresa Trautman (que teve que aguardar 10 anos para ver liberado seu "Os Homens que eu tive"), esteve já em 13 festivais internacionais e, segundo sua realizadora, obteve boas críticas em Los Angeles e San Francisco. De Curitiba, saiu com ao menos dois troféus: o de melhor atriz para Louise Cardoso (que tem nesta produção uma extenuante seqüência de amor) e direção de arte (Silvano Gontije), que soube aproveitar os belos cenários internos e externos de uma das mais belas mansões do Rio de Janeiro. Com um elenco all star liderado por Tonia Carrero (numa interpretação pasteurizada), "Sonhos de Menina Moça" também poderá ser conferida pelo público em breve: está programado para estrear no Condor.
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Teresa Trautman não esperou a hora em que os premiados foram anunciados. Embora tivesse chegado na 6ª feira, preferiu viajar no sábado a tarde para Pato Branco, onde reside seu irmão, o empresário Hans Trautman - que havia vindo a Curitiba aguardá-la.
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