As mulheres, os filmes e os tapes do FestRio
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 06 de dezembro de 1985
Apesar de ainda estar em fase de pré-produção, o primeiro longa-metragem da cineasta paranaense Berenice Mendes - "Sem Terra" - mereceu foto e destaque na página em que a Embrafilmes anunciou os novos filmes brasileiros, na edição nº 7, de 27 de novembro, da "Folha do Festival", 15 mil exemplares, distribuídos durante o II Festival Internacional do Cinema, Vídeo e Televisão.
Com textos em português e inglês e uma foto mostrando manifestação de camponeses, "Sem Terra" ganhou, assim sua primeira notícia nacional. O projeto de Berenice Mendes foi aprovado pela Embrafilmes e a intenção da cineasta é concluí-lo no primeiro semestre de 1986.
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Se Berenice ganhou publicidade de seu futuro filme na "Folha do Festival", em compensação e exibição de seu curta "O Foguete Zé Carneiro", abrindo a sessão da tarde na quinta-feira, 27, da mostra paralela "Olhar Feminino" (Cine Art São conrado - I ) teve apenas 7 espectadores., Mas Berenice pode se consolar : muitos outros filmes levados nas mostras paralelas do FestRio também tiveram público reduzido, já que havia centenas de opções e o público, obviamente, buscava as sessões com filmes mais famosos . Mesmo "Falsfatt", filme inédito de Orson Welles (1915-1985), rodado na Espanha entre 1973/75, foi visto por menos de 200 pessoas no Bruni-Ipanema (em compensação, a fauna gay carioca lotou as três sessões em que foi apresentado a produção holandes "Taxi Zum Klo/Taxi Para o Banheiro", de Frani Ripllot, com cenas explícitas de homossexualismo masculino).
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Mais de uma dezena de filmes franceses, realizados em 1985, foram mostrados nas mostras paralelas do Festival - em algumas sessões com reduzido público. Por exemplo, na luxuosa sala de projeção do Hotel Merediam, apenas 3 espectadores viram "Paroles et Musica", um bonito filme com trilha sonora de Michel Legrand e que Catherine Deneuve interpretou este ano, após a sua viagem ao Brasil.
O filme mais hermético da mostra "Olhar Feminino" foi, sem dúvida, "Les Enfants" (As Crianças), da romancista e cineasta Margueritte Duras: 90 minutos com a câmara praticamente fixada em meia dúzia de atores, diálogos complexos sobre a educação e a escola francesa. Como havia tradução simultânea, o público - cerca de 40 pessoas - resistiu.
Uma surpresa foi a presença de Caroline Huppert, a bela diretora de "Signe Charlotte" (Assinada Charlotte), comédia totalmente amoral: a atriz principal, Isabelle Huppert (irmã de Caroline) vive uma mulher que comete assassinato e roubos e tem um final feliz. Embora a imprensa tenha dado um maior destaque a Susan Seidelman (diretora "Procurando Susan Desesperadamente") que levou ao FestRio o seu primeiro longa ("Smithreens/Estilhaços"), houve outra cineasta americana importante: Shirley Clark, diretor do documentário "Ornette, Made In U.S.A.", sobre o músico de Jazz Ornette Coleman. Outro filme americano exibido na mostra das cineastas foi "Desert Heart" , de Donna Deitch. Infelizmente, todos estes filmes foram trazidos exclusivamente para a mostra paralela do FestRio e dificilmente terão distribuição comercial no Brasil.
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Renata Vasconcelos, 35 anos, curitibana há 15 radicada no Rio - (irmã de Angela, que foi Miss Brasil - 1964), apresentou na parte informativa do vídeo, um documentário de 10 minutos sobre o artista plástico Jorge Eduardo, que trabalha com sucata em seus quadros. Ex-produtora da TV-Educativa e até há duas semanas trabalhando na Tycoom - uma das maiores produtoras de vídeos comerciais do Brasil, Renata optou agora pelos riscos e liberdade de ser free-lancer. O vídeo sobre Jorge Eduardo foi sua primeira realização autônoma (Custo de Cr$ 12 milhões) e, agora, quer tentar realizar documentários sobre outros artistas plásticos. Ligada efetivamente ao Paraná (aqui passou sua infância) e filha de uma artista plástica, Arlete Vasconcelos, Renata gostaria de documentar os trabalhos dos artistas paranaenses. Para isto só precisa de encontrar um mecenas que financie o projeto.
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Quem também apareceu no FestRio, no encerramento, foi a mímica Denise Stocklos. Ela levou numa das últimas sessões da mostra "Olhar Feminino" o tape-filme dirigdo por Antunes Filho, produção da TV-Educativa de São Paulo, que focaliza em vários pontos de São Paulo. Na mesma sessão em que Denise apresentou seu filme - recebido com aplausos - foram exibidos "Life and time of Rosie The Rivert", da americana Connie Field e o belo média-metragem "Vinícius de Moraes, Um Rapaz de Família", de sua filha, Suzana de Moraes.
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A cineasta Eunice Gutman - que há algumas semanas veio a Curitiba, para uma mostra de filmes realizados por mulheres - também sofreu com a ausência de público. Apenas [apesar] de muitos avisos e cartazes sobre a exibição de seu documentário "A Rocinha Tem Histórias", quando o mesmo foi levado numa das sessões do Mercado de Filmes, no 2º andar do hall de convenções do Hotel Nacional, só havia três espectadores: Eunice e duas amigas. Na sessão anterior. A sala estava repleta: é que fora exibido um bonito documentário inglês sobre a Serra Pelada, narrado por Orson Welles - talvez um dos últimos feitos pelo grande mestre do cinema.
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Ítala Nandi levou também seu documentário "In Vino Veritás", sobre a indústria do vinho no Rio Grande do Sul, na mostra "Olhar Feminino". Agora , Ítala está em Cuba, participando do festival de cinema de Havana e, em 1986, promete trazer a Curitiba a sua última produção, a peça "Amor de Campo Minado", de Dias Gomes.
LEGENDA FOTO: "Desert Hearts", de Donna Deitch, um dos inéditos americanos exibidos no FestRio: Alex McArthur, Patricia Charbonneau, Andra Akers e Vivian Bell - os intérpretes.
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