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Aramis

Os filmes do mercado III - Afinal, quantos dos filmes do FestRio chegarão aos cinemas?

Uma pergunta natural e justa que se faz: - E os filmes do FestRio quando serão exibidos para o grande público? Realmente, a questão é estender a todos os que se interessam pelo cinema ao menos os filmes mais importantes que chegam a um Festival Internacional da dimensão do Rio de Janeiro. Nas sessões da sala Glauber Rocha (nome que ganha o salão de convenções do Hotel Nacional durante o evento) e no cine Veneza, no Rio de Janeiro, é limitado, mesmo para os cariocas, o número de espectadores que conseguem acompanhar os candidatos de 22 países que há 4 anos vem tentar os Tucanos de Ouro e Prata. Em São Paulo, uma seleção dos filmes premiados chega a ter projeções com entradas disputadas a tapa (e que devem acontecer nesta semana), mas em outras cidades os filmes não podem ser mostrados sem autorizações oficiais de seus produtores. As regras da Federação Internacional dos Produtores de Filmes, organismo que de suas sedes em Nova Iorque e Paris, coordena mais de 50 festivais internacionais, são rigorosas e específicas: os filmes destinados a festivais devem ser mostrados apenas no local da mostra. Com muita tolerância, permite-se mais uma ou duas exibições (do que beneficia-se São Paulo) e, a não ser quando o produtor anima-se a que sua obra seja democratizada em termos de público, as mesmas retornam ao país de origem. Mesmo com toda legislação oficial que (tenta) desburocratizar o FestRio, este ano aconteceram problemas de última hora, como a retenção de cópias na alfândega - o que obrigou atraso nas sessões dos representantes da URSS ("Kìn-dzadza", de Gueorgui Danolia, uma ficção científica chata e arrastada, com um humor demasiadamente soviético); Turquia ("Oh Belinda!", de Atif Yilmaz, uma saborosa comédia ironizando a publicidade e a televisão) e a Suécia ("Noite de verão no planeta Terra/Sommmarkvallar pa Jorden", de Gunnel Lindblon, último filme a ser apresentado e prejudicado por isto, um drama com toques bergmanianos, realizado com extrema ternura e excelentes intérpretes). xxx Grande show-room visual, FestRio se preocupa em que haja um grande intercâmbio comercial e cultural dos "produtos" (no caso filmes, vídeos e programas de televisão) que, vindos de quase meia centena de países, ali são apresentados. Para tanto são convidados grandes distribuidores e produtores, abrem-se as portas do mercado e cabe aos interessados de parte a parte fazerem seus negócios. Infelizmente, os homens que dominam os circuitos comerciais no Brasil nem sempre se ligam com as galinhas de ovos de ouro que são oferecidos durante o Festival, desperdiçando oportunidades. Por exemplo, até hoje o filme vencedor do Tucano de Ouro em 1985, a produção colombiana "Tempo de Morrer", baseado em novela de Gabriel Garcia Marques, não teve distribuição comercial e a única cópia legendada tem sido apresentada apenas em mostras culturais, como foi o caso da realizada em Curitiba, em outubro passado. O filme vencedor do ano passado, "My Beautiful Laundrette", de Stephen Frears - mesmo tendo grandes apelos para o público, também continua inédito. Pode ser que agora, com a vinda de Frears ao IV FestRio e exibição de outro de seus filmes, em várias sessões, como hors-concours, - "Sammy and Rosie" (para muitos críticos, o melhor de todos os filmes que vieram para o Festival), distribuidores como Alex Adamiu (da Paris Filmes) ou Ugo Sorrentino (da Art Filmes), animem-se a lançá-los no Brasil. Do mesmo Frears, outro aguardado filme que deveria ter sido mostrado no FestRio, não chegou a tempo: "Prick up your ears", cinebiografia do dramaturgo Joe Orton, assassinado em 9 de agosto de 1967 pelo seu amante Ken Halliwell. Dos filmes trazidos para a mostra sobre o novo cinema britânico, alguns estavam sendo negociados - embora não se tivesse, até o final do Festival, confirmação oficial. Esta mostra paralela se destinou a mostrar uma nova geração de realizadores britânicos, do qual a estrela mais badalada é Peter Greenway, 45 anos, ex-pintor, que com "A Barriga do Arquiteto" foi premiado como melhor diretor em Cannes. "The belly of an architect" só chegou no final do Festival, mas dois outros de seus recentes filmes também foram apresentados - "The Draughtsman's contract" (O Contrato de amor) e "A zed an two noughts" ("Um "Z" entre dois zeros"). xxx Dos filmes em competição, afora os representantes do Brasil - "Sonho de Valsa" (estreou ontem no Rio de Janeiro) e "Memória Viva" (lançamento nacional em 1988), estão asseguradas as estréias dos filmes americanos "Atração Fatal", de Adryan Lynne (dia 25 de dezembro) e "Morte no Inverno", um bom thriller de Arthur Penn. Ainda sem confirmação de quem poderá distribuí-lo no Brasil, o filme que representou a Inglaterra, tem excelentes condições de bilheteria: "Veneno Branco" (White mischief), de Michael Radford (o mesmo diretor de "1984", o grande injustiçado no I FestRio), ambientado no Quênia, em 1940, com um clima que lembra "Entre Dois Amores": um triângulo amoroso, entre uma bela e sensual inglesa (Gretta Scacchi, atriz lançada em "Good Morning, Babylonia", dos irmãos Tavianni - uma das ausências mais sentidas na mostra paralela "Os Melhores do Mundo"), seu velho marido e um amante impetuoso. Com excelente trilha sonora (big-bands dos anos 30), fotografia primorosa, "White mischief" é uma produção que facilmente conquistará o grande público. Se chegar a ter alguma indicação (ou vencer) o Oscar, então sua carreira comercial estará garantida. xxx "Out of Rosenheim", de Percy Adlon, o grande vencedor do Festival, interessou a vários distribuidores. Afinal, tem todos os méritos de um filme de arte e uma estrutura que poderá fazer sucesso dentro de uma faixa bem definida de público, já que lembra, em certos aspectos, a "Paris, Texas", de Wim Wenders - filme mostrado na abertura do I FestRio e que foi, posteriormente, adquirido por uma nova distribuidora, a Argo (por sinal, crescendo no mercado, tanto é que patrocinou a contracapa do catálogo oficial deste IV FestRio). Comédia irreverente e maliciosa, sobre um superdotado em termos de esperma, "A Última Tacada" (The Last Straw), de Giles Walker, representante do Canadá, é possível que tenha seu lançamento em vídeo. Ao menos, seus produtores fizeram muitos contatos no mercado, enquanto que o filme era mal recebido na competição. Uma espécie de love story ao estilo francês, "Mal de amor" (Maladie d'amour), do veterano Jacques Deray, não se salva, artisticamente, nem com a beleza de Nastassja Kinski e o charme de Jean-Hughes Anglad ("Betty Blue", "Subway"). Mas como melodramas tem público, pode até chegar aos circuitos comerciais. Infelizmente, os filmes do bloco socialista dificilmente encontram quem se disponha a distribuí-los no Brasil. O que é um pena, pois "Anjo da Guarda" (Andjeo cuvar), do iugoslavo Goran Paskaljevic, trata com sinceridade de um sério problema social (a venda de crianças ciganas para marginais na Itália), enquanto a produção checa "Paisagem com Mobília" (Krajinas nábytken), de Karel Smyczek, conduzida por urna excelente trilha sonora jazzística, é uma espécie de "Kramer x Kramer" em versão socialista. A produção polonesa "O Arco de Eros"(Luk Erosa) sobre a decadência moral de uma mulher, cujo marido é convocado para a guerra (a ação se passa entre 1914/1918), trouxe uma das mais belas atrizes do cinema contemporâneo: Grazyna Trela. Sensual, coquete - mas ao mesmo tempo com um toque de ingenuidade - Grazyna impressiona neste filme que também revela um novo cineasta polonês, Jerzy Domaradzki. A produção húngara "Tolerância" (Gondviselés), nem mesmo tendo dado o Tucano de Prata ao seu principal intérprete - Denis Dobrci - tem maiores chances de chegar aos nossos circuitos comerciais. Assim como o filme australiano (este, veio até sem legendas), "Warm nights on a slow moving train" - cuja principal atriz, Wendy Hughes - ganhou o Tucano de Prata, e "A Última Imperatriz", dos chineses Chen Jialin e Sun Qinqquo (o público assistirá, em compensação, a versão de Bertolucci sobre o mesmo tema, que a Columbia lançará em março próximo). Quanto aos filmes de Cuba (o decepcionante "Amor em Campo Minado", da peça de Dias Gomes), Venezuela ("Macu A Mulher do Polícia"), Peru ("O Sócio de Deus") e Israel ("Bouboa") também tem pouquíssimas chances de encontrarem distribuição comercial. Já "A Lei do Desejo", que valeu o Tucano de melhor direção ao espanhol Pedro Almodóvar pode até chegar às telas, se houver o esperado boom do cinema gay. Mas o que é assunto para futura e detalhada matéria. LEGENDA FOTO 1: "A Lei do Desejo", uma tragicomédia gay, deu ao diretor espanhol Pedro Almodóvar, o prêmio de melhor diretor do FestRio. A temática gay cresce no cinema e poderá marcar uma série de lançamentos audaciosos em 1988. LEGENDA FOTO 2: "A Última Tacada" (The Last Straw), de Giles Walker, com Beverly Murray e San Grana - candidato do Canadá no 4º FestRio poderá estar em breve nas locadores, em vídeo.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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04/12/1987

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