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Na roda viva das exibições, opções para cada interesse

Rio de Janeiro Várias vezes por dia, Cecília Assaf, Aninha e Celinha - as simpáticas assistentes de Elizabeth de Carvalho, a ocupadíssima coordenadora de imprensa, tem que fazer alterações nos quadros das múltiplas programações do FestRio - incluindo também nos 12 terminais de vídeo espalhados pelo Hotel Nacional. São filmes que modificam de horário, substituições e mesmo cancelamentos de última hora. Ney Sroulevich, sempre com charuto cubano nas mãos - que nem mesmo o susto cardíaco da semana passada (sua pressão foi para 8 por 19) o fez abandonar - não chega a se preocupar com estas mudanças: - "Na verdade, um festival sempre tem os ajustes de última hora". E os ajustes podem ser desde o cancelamento na vinda de um convidado importante - como a atriz Fanny Ardant (cancelou na última hora) até a simples mudança do horário de um filme. "Mary Sue Get a Married", o mais recente filme de Francis Ford Coppola, estreado há poucas semanas em Nova Iorque, era, até 5 dias antes do festival ter início, previsto para a noite de encerramento, amanhã. Problemas dos produtores e a Columbia em relação a conveniência de permitir uma exibição especial (que pode inclusive ter algumas indicações ao Oscar-87) o levaram a ser cancelado. Para substituí-lo, houve uma escolha que alegrou a área jovem do festival: A Pré-estréia de "Histórias Verdadeiras", longa-metragem de David Byrne, o múltiplo talento do grupo Talking Head, presente desde o início. Já o mais aguardado dos cult-movies da mostra paralela no Bruni-Ipanema - "Sid and Nancy", de Alex Cox, que teria sua primeira exibição na segunda-feira, 24, foi suspenso horas antes - simplesmente porque o diretor da mostra internacional de cinema de São Paulo, Leon Cakof, crítico da "Folha de São Paulo", brigou há meses com Ney Sroulevich e decidiu boicotar a sua maneira o FestRio: não entregou as cópias de "Sid e Nancy" e "Zucker Baby", esta uma produção alemã. Direção de Percy Adlon - que também seria aqui exibido. Até agora, Fausto Canosa, programador do Public Theatre, em Nova Iorque, e coordenador desta área do festival, tenta conseguir que sejam enviadas outras cópias de Munique e Nova Iorque, para serem mostradas no Bruni. O público que faz das chamadas "midnight movies", no Bruni, a sala mais concorrida - exigindo toda a habilidade do simpático gerente Jorge, para evitar incidentes, esperar com ansiedade estes filmes - dos quais, dificilmente, acontecerão novas projeções. O que o público verá Após um porre visual de mais de 200 filmes em programação, em apenas 10 dias, uma dieta cinematográfica das mais rigorosas - caindo-se no esquema tradicional. "É Isto Aí", reconhece o próprio diretor-geral do FestRio, Ney Sroulevich, explicando: - De acordo com as normas da Federação Internacional de Produtores de Filmes (na qual, o produtor brasileiro Luís Carlos Barreto é vice-presidente), os filmes enviados para um festival internacional, só podem ser enviados [exibidos] na cidade específica. Nem em Niterói podem serem apresentados." Assim, só nas salas do Rio de Janeiro - e por um prazo fixo - é que os filmes que estão tanto na parte competitiva como nas mostras paralelas podem ser vistos. Legalmente, caso apareçam compradores, a cópia legendada, vinda para o festival, poderá ficar. Mas para isto há necessidade de interessados - dispostos a acertarem com os produtores de cada filme - as condições para negociações. Ney Sroulevih lamenta: - "Infelizmente, ainda não houve por parte dos distribuidores e exibidores a plena conscientização dos ótimos negócios que podem ser feitos na compra dos filmes que aqui chegam. Muitos preferem ainda em Cannes para fazer suas importações, quando aqui estão tendo uma mostra do que há de mais atual e quanto da cinematografia mundial - inclusive podendo sentir a reação do público". Se nem o filme premiado com o Tucano de Ouro-85, "Tempo de Morrer", direção de Jorge Alitreano, produção colombiana, não encontrou distribuição comercial, o que dizer de filmes mais difíceis ou experimentais. É claro que há aquelas propostas vanguardistas que caem no agrado do público jovem e que poderiam funcionar ao menos nas cidades maiores. Mas, por exemplo, "Stop Making Sense", documentário que Jonathan Demme realizou sobre uma excursão do Talling Head em 1983 (quando David Byrne, se interessou em partir para seu próprio filme) - e aqui mostrado em mostra paralela no ano passado - como "Stranger Then Paradise", de Jim Jarmusch - o grande "Cult movie" da temporada passada, deixaram de interessar aos distribuidores, devido a quantidade de cópias piratas em vídeo cassete que entraram no Brasil nos últimos meses. Cacá Diegues, cineasta que este ano preside o júri de longa-metragem, chegou, inclusive, a denunciar a apresentação de "Stranger Than Paradise" na danceteria Madame Santa, em São Paulo - quando este filme estaria tendo seus direitos negociados. Agora, não há mais chances de "Stranger Than Paradise" chegar aos circuitos comerciais. Em compensação há cópias piratas, em vídeo, em todo o País (em Curitiba, pelo menos dois vídeo-clubes o estão alugando a Cz$ 20,00 por dia, mas sem muita procura). O novo filme de Jim Jarmusch - "Down By Law", é, agora, o mais comentado entre as mostras paralelas. Teve duas apresentações no Bruni-Ipanema, em sessões esgotadas, é claro - assim como dos outros filmes ali apresentados, como "Parting Glances", do americano Bill Sherwood - espécie de "Love Story" entre um casal de homossexuais, mais um título para a já extensa filmografia gay, uma das características deste festival. Perdas e ganhos A Embrafilmes decidiu não ceder os filmes nacionais novos para uma mostra paralela no auditório da Cândido Mendes, pois Marco Aurélio Marcondes, o experiente homem da área de comercialização da empresa, entendeu que estes pré-lançamentos acabariam prejudicando a futura carreira de filmes de grande potencialidade que estão prontos para estréias competitivas. Em compensação já se anuncia, no Cinema I, no Rio, do filme-polêmica deste FestRio - "Cinema Falado", de Caetano Velloso, que, como dissemos, está tendo, desde segunda-feira o maior espaço na imprensa, muita tietagem e entusiasmo pelas propostas extremamente pessoais e herméticas que o baiano Caetano faz ao longo de duas horas de um filme pesado, difícil e bastante pretencioso - mas com méritos, especialmente o de provocar discussões entusiasmadas. Única grande multinacional-americana a prestigiar este ano o FestRio - a Warner/Columbia - está sabendo capitalizar a grande promoção graças também à atenção que a eficiente chefe de imprensa, Elza Veiga , vem dando ao evento. Assim, além de "True Stories" - a Columbia trouxe para o FestRio, um dos filmes mais agradáveis em disputa - "Assim é a Vida" (That's Life), de Black Edwards - com Jack Lemmon e Julie Andrews a frente de um elenco extremamente familiar - e, em mostras paralelas, apresenta "Sobre Ontem à Noite" e "Depois de Horas" (After Hours), este o novo filme de Martin Scorcese - que concorreu em Cannes e já foi pré-lançado na mostra de Cakof, em São Paulo. Realismo A informação mais difícil de conseguir é sobre os negócios preciosos que ocorrem no mercado cinematográfico - instalado no 2º andar do Centro de Convenções do Hotel Nacional. Os empresários de vídeo e filmes não revelam detalhes das vendas ou compras de filmes, direitos para vídeo, permutas etc. Entretanto, o faturamento deve ser alto: enquanto um produtor de pornoproduções de São Paulo já havia vendido nos dois primeiros dias cerca de US$ 100 mil em direitos para exportação de suas sacanagens filmadas na boca do lixo, em São Paulo, a poderosa Globo teria feito negociações acima dos US$ 3 milhões. Enfim, este é um dos aspectos mais fortes do FestRio, inclusive para justificar sua viabilização definitiva através de uma fundação independente, que Ney e os quatro outros idealizadores - Cosme Alves (Cinemateca do Rio de Janeiro), Paulo Thiago (presidente da Associação dos Produtores), Luís Carlos Barreto (produtor) e Jean Gabriel Albicoco (Alvorada, ex-Gaumont) defendem desde a mostra anterior. E que só não saiu por razões políticas e, especialmente, inveja de alguns setores em relação ao êxito da primeira edição, em 1984 - e a continuidade bem sucedida no ano passado. Ney Sroulevich, certo de que o festival deve emplacar, acredita agora mais do que nunca tanto em sua consolidação artística como mercadológica. Lembrando que cada país que participa tem apenas a despesa oficial de pagar a legendagem do filme (ao redor de US$ 300) lamenta que mesmo assim muitos não tenham entendido a oportunidade que o festival abre a divulgação cultural. Comentando que o adido cultural da Embaixada da Inglaterra, a quem ele havia sugerido uma retrospectiva do novo cinema inglês, achou muito alta a despesa a legendagem de 7 filmes, Ney conta que lhe disse então, aquilo que havia ouvido do poderoso general Wernen Walters, o homem que dirige a CIA e foi adido militar da Embaixada dos Estados Unidos por muitos anos no Brasil. - "Os pessimistas estudam russo. Os otimistas aprendem chinês. Mas os realistas querem realmente aprender o português". No cinema - acrescenta Ney - também deve ser assim. Quem for realista em termos de mercado, vai entender que aproveitar a abertura do FestRio, em termos de entrada cinematográfica, é uma questão de realismo para este final de década.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
13
28/11/1986

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