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Aramis

New Orleans, onde o jazz nasceu

A apresentação que os oito velhinhos - faixa de idade entre os 70 anos - do Preservation Hall Jazz Band farão hoje, quinta-feira, no Teatro Guaíra, traz não só o estilo tradicional desta música mas também um pouco de espírito de New Orlaens. Aramis Millarch, que em 1973 passou alguns dias em New Orleans, frequentando o << Preservation Hall >>, fala aqui desta cidade tão musical - e única em seu estilo. Os oito instrumentistas que estarào hoje à noite no Teatro Guaíra, fazendo uma única apresentação de jazz tradicional - numa execução inicial há algumas semanas pela América do Sul, por certo devem estranhar um pouco o luxo de alguns auditórios - como o de Curitiba - onde se apresentam. Afinal, quem conhece o Preservation Hall, no número 726 da Saint Peter Street, próxima ao << Crazy Shirleys >> e entre as lendárias Bourbon e Royal Street, sabe que aquele espaço hoje internacionalmente conhecido, é um dos mais despojados de todos os auditórios do mundo. Na verdade não chega nem a ser um teatro: é uma velha casa de madeira, construída em 1950 e que neste nestes dois séculos e meio teve diferentes utilizações: foi taverna, moradia de artista e escritores (inclusive Erle Stanley Gardner ali resisiu algum tempo) e, em 1952, tornou-se uma galeria de arte, para, somente no início dos anos 60, se consolidar como um templo de jazz tradixional. A prefeitura de New Orleans, depois que a Associated Arts Studio passou a reunir naquele local os velhos músicos de jazz, decidiu institucionalizar o ambiente e o Preservation Hall, no setor histórico da cidade, ficou como um monumento histórico a música que saiu do Mississipi para se universalizar em menos de 100 anos. A EMOÇÃO DO MISSISSIPI - Tudo colabora para dara ao visitante de New Orleans, especialmente se aprecia o jazz e leu as obras de Mark Twain, a maior emoção assim que se chega a esta cidade portuária, no centro do litoral meridional dos Estados Unidos. Situada estrategicamente no Rio Mississipi , a acerca de 96 quilômetros do Golfo do México, a 2.156 quilômetros a sudoeste de Nova Iorque e a 3.700 quilômetros a sueste de San Francisco. New Orleans lembra jazz, mas não é apenas a música que a faz uma cidade única dentro dos Estados Unidos - e que leva a quem lá esteve a sempre sonhar em retornar um dia. Sua cozinha criola, ótimos restaurantes - o << Viieux Carré >> - bairro tradicional entre a Canal Street e o Esplanade Avenue, com pouco mais de vinte quarteirões é um mundo à parte. O Rio Mississipi, com seus navios gaiolas ainda navegando ao menos para efeitos turísticos ladeado do Frech Market, limita as avenidas Ibervinlle, Bienville. Conti, Toylousse, St. Louis, Dumane, Ursuline, Governo Nicholas e Barracks, transversais às longas e históricas Burgundy, Bourbon, Royal, Charter e Decatur Street. O casario colonial, com amplas sacadas, os prédios históricos - onde ficam o Wax Museu (museu de cera), o Cabildo, o öpera House, o Louisiana Wildite Museum, o famosos Royal Chartres, a Basílica de St. Louis e a Jackson Square - uma praça cercada, que tem seus portões de ferro, fechadas a meia-noite. Faz calor em New Orleans - como em todo o Sul dos Estados Unidos, durante todo o ano. Nas avenidas mais movimentadas - Bourboun, Royal e Chartes - dezenas de bares, restaurantes, cafés e eclubes noturnos, não dispensam, jamais, a música ao vivo: dos mais sofisticados, com cadeiras giratórias, cercando o palco onde se exibe, conjuntos (muitas vezes com grupos formados por músicos jóvens) aos mais abertos, com mesas e cadeiras na calçada New Orleans tem um clima intensamente musical. Nas ruas, cenetnas de pessoas, após as 17 horas - quando refresca, caminham tranquilamente(naquela área o tráfego de veículos é praticamente interditado), bebendo um vinho fortíssimo mas de sabor delicioso e comendo pop corn - a pipoca, vendida em generosos pacotes de até um quilo. Criolos e negros - quase 90% da população, nas ruas, integram-se aos turistas e, muitos vestindo trajes de cores berrantes, fazem zcrobacias. Outros, simplesmente embriagados do vinho de milho que, não sei com que técnica fabricam, dançam ao som da música, jazzística, é claro - que parece sair de todas as partes. É um clima de festa e informalidade, fruto talvez de New Orleans ter sido colonizada por franceses e espanhóis, integrados aos negros. Assim, ao invés de frieza anglo-saxônica, há o calor humano, um entusiasmo, que faz New Orleans lembrar a Bahia. E não é sem razão que em New Orleans se realiza um dos mais famosos carnavais do mundo - o << MardiGras >>, que este ano foi a 19 de fevereiro, em 1981 será a 3 de março e em 1982 a 23 de fevereiro. Com desfile de carros alegóricos. escolha << Rex >> da festa, etc. - e toda uma tradicção que justificaria uma reportagem à parte. UMA CIDADE MUSICAL - O heteleiro André Ftuch ficou tão entusiasmado ao visitar New Orleans, há alguns anos, que quando finalmente conseguiu concluir o seu Hotel Del Rey, na Avenida Luix Xavier, decidiu reproduzir no << King`s Place >>, último andar, o ambiente do << Top of the Mart >>, um restaurante giratório, com capacidade para 469 pessoas e que permite a visão de toda a cidade - enquanto se toma um bom drinque ou se janta. Localiza-sena Canal Street, 2 - num edificio imenso, onde inclusive o Brasil tem o seu consulado-geral. Afinal, ao lado da tradição, New Orleans é um importante centro do comércio marítimo e da indústria petroquímica, além de possuir nada menos que 12 universidades. Mas há duas New Orleans: a cidade moderna e comercial e o Vieux Carrée, ou seja, a sua parte histórica, o chamado também << French Quarter >>, bairro francês, onde a cada passo se depara com um local que emociona: o << Old Abshint >> bar de esquina que há 200 anos pertence a uma mesma família e que orgulha de ter assinaturas nas paredes de seus fragueses, de Latife, o Pirata até Al Hirt, o pistonista - dono de um clube na Bourbon Street. Mark Twain, conta o proprietário da casa, era um dos mais assíduos frequentadores. -A Bourbon Street - imortalizada por Louis Armstrong (1900-1971) num tema dos mais conhecidos - só para quando amanhecer: se o Presevation Hall, na St. Peter Street, funciona até a meia-noite, nos clubes, boites, salões de café, etc, da Bourbon, a movimentação cruza a madrugada. E embora o som tradicional seja o que mais se ouve, não há preconceitos contra estilos mais modernos. Fundada em 1717 e denominada em honra do Duque de Orleães, New Oreans prosperou como cidade francesa durante 45 anos até ter sido cedida à Espanha, em 1762, por Luis XV. Em 1803 ela foi devolvida aos franceses sendoprontamente vendida aos Estados Unidos por Napoleão, como parte da famosa << louisiana Purchase >>. Em 1812, com o advento da navegação a vapor ao longo do Rio Mississipi, até Natchez, todo o vale do Mississipi foi aberto ao tráfego internacional, tendo New Orleans consolidado a sua posição de grande pôrto marítimo. Os imigrantes não tardaram em afluir à cidade, vindos de todas as regiões do mundo. Sua população - hoje acima de 1.200.00 habitantes - é uma mescla de crioulos e de descendentes - é uma mecla de crioulos e de descendentes dos colonos franceses e espanhóis; << cajuns >> descendentes dos axcadianos da Nova Escócia, e ainda outros grupos oriundos das ilhas do Caribe, da África. Enfim, o que menos influiu foi o inglês - razão porque New Orleans é um Estados Unidos diferente: tem imenso parque, cemitérios como os nosos (que para muitos se constitui em atração turística) e, em seu Vieux Carrée, um clima e permanente carnaval. O que me fez, ao ali chegar, em 1973, a lembrar Salvador. Realmente, New Orleans é a Bahia dos Estados Unidos. Com toda a alegria e musicalidade da raça negra. O JAZZ DE UMA CIDADE - Há muito para ver em New Orleans: o Vieux Carrée engloba até o << Pirate`s Alley >>, uma viela estreia muito procurada por pintores. A St. Louis Cathedral, igreja construída em 1794, é hoje basília auxiliar e o The Cabildo, prédio de 1795, era residência dos governadores espanhóis. Hoje é um museu. No St, Louis Cemitery estão os jazisgos das famílias tradicionais e o Beauregard Suqare foi, no passado o centro do << Vodoo >> - a macumba americana. Para quem curte arquitetura, há residências notáveis, com suas varandas de ferro forjado e parques e jardins repousantes: Madame John`s Legacy, construída em 1727; a Miro House, na 529, Royal Street; a Dr. Le Monnier`s House, também na mesma rua, número 640 - construída em 1811 e o primeiro edifício do Vieux Carrée com mais de dois andares. Mas, ao lado do Presevation Hall e dos inúmeros ambientes para se ouvir jazz, há o New Orleans Jazz Museu. Uma ala do Hotel Royal Sonesta, exibe artefatos, discos, documentos, objetos, instrumentos relacionados ao Jazz. Ali pode ser encontrada a gravação da primeira banda de jazz - que, ironicamente, era formada por brancos, ao lado de um quepe que pertence ao mais ilustre filho da terra, Louis Armstrong, ou de um dos trumpetes de King Oliver. Ali, em 1973, deixamos três cartazes do primeiro (e até hoje único, no Paraná) curso de jazz, promovido pelo então Departamento de Relações Públicas e Promoções da Prefeitura de Curitiba e realizado no Teatro do Paiol. Tendo como ilustração um grande desenho de Louis Armstrong, ao entregar os cartazes à diretora do Museu, ela agradeceu e, imediatamente, o colocou na vitrina dedicada a << Stchmo >>. Se ficou em exposição por muito tempo não sei, mas garanto, lá deve estar, em alguma parte do museu. Afinal, em New Orleans a memória não é esquecida. FOTO LEGENDA 1- Um estilo simples, marcante, conservado no << French Quartier >> de New Orleans: o casarão de 2 pavimentos, com largas sacadas. FOTO LEGENDA 2- Uma vista da Bourbon streel em hora de movimento: alegria, jazz bebida é até pipoca nesta rua que lembra a Bahia. pela espontâneidade e musicalidade de seu povo. FOTO LEGENDA 3- Nos dias de festas ou quando morre um músico, a Eureka Jazz Band sai as ruas de New Orleans. FOTO LEGENDA 4- O mapa da mina: eis o setor jazzístico de New Orleans, uma cidade que tem o som da música até em sua arquitetura. FOTO LEGENDA 5- Na 340, Bourbon Street, está o Museu do Jazz de New Orleans: ali a memoria dessa música hoje universal. FOTO LEGENDA 6- Bourbon Street durante o dia: << The Old Absinthe >> é o bar que existe há 200 anos nas mãos da mesma família e que teve entre seus fregueses desde o pirada Latife até Mark Tucain.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Teatro
1
22/05/1980

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