Nossos caipiras nos EUA
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 28 de março de 1978
Não é Airto Guimorvan Moreira, catarinense de Itaiópolis, longa quilometragem do Paraná, o único músico da terra a viver nos EUA. Por incrível que pareça, até uma dupla sertaneja, de Curitiba, já andou cantando nos EUA e fazendo até um disco numa fábrica de Chicago: Corumbá e Cacheirinho, há 4 anos passados, andaram levando suas canções rurais, de temas simples e brasileiros , em alguns circuitos de cidades vizinhas a Chicago, nos Estados de Illinois. Cacheirinho (Alcebiades da Silva Rezende, 52 anos) ficou morando na cidade de Rockford, de onde vem eventualmente, para visitar sua família.
Corumbá (João Dorasil da Cruz, 42 anos, paranaense de Rebouças), não agüentou a barra americana e voltou depois de ali ficar 15 meses, entre 1973/74.
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Em 1957, Cacheirinho e Corumbá, decidiram fazer uma canção falando sobre discos voadores, que na época - como agora - estavam aparecendo nos céus do Brasil. Só que de uma maneira satírica, com um humor caipira. Passados 20 anos, finalmente a música foi gravada, com Corumbá, e seu novo parceiro, Luando (Antônio Bicunas, 42 anos), uma das quatros duplas sertanejas que Ivan Graciano incluiu no lp "Nhô Belarmino e Nhá Gabriela", com o qual iniciou as atividades de seu selo, BG Gravações, com a parte técnica a cargo do Sir Laboratório de Som e Imagem (Rua Bento Viana, 405, Curitiba).
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Nhô Belarmino (Salvador Graciano, 57 anos) e Nhá Gabriela (Júlia Alves, 54 anos), sem dúvida a dupla sertaneja de maior popularidade em todo o Paraná, 42 anos de atividades artística, campeões de audiência na época de ouro dos programas de auditórios da Rádio Guairacá, que então se chamava "A Noz Nativa Na Terra dos Pinherais" e funcionava na Rua Barão do Rio Branco, são exemplos de artista de extrema simplicidade, que cantando as coisas do povo, conseguem grande comunicabilidade. A dupla não parou, muito pelo contrário: tem uma programação semanal de televisão, um forró na Sociedade Operária do Bacacheri, desde setembro último e, no sábado, inaugurou um restaurante-forró em Santa Felicidade. E, agora partiram para sua própria etiqueta, depois de terem feito muitos lps, 78 rpm e compactos na RCA Victor e CBS.
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"Equipe BG", o primeiro disco em sua própria etiqueta, é um documento curioso sobre a nossa música rural. Belarmino e Gabriela apresentam duas canções - os chotes "Chiriri Chochó" e "Não arranjo casamento" (esta na linha humorística, que sempre caracterizou a dupla), enquanto, instrumentalmente Belarmino, um executante de harmônia de muita agilidade, em dueto com seu filho, Ivan Graciano, 32 anos, faz duas outras faixas que, ouvidas em preconceitos, justificam elogios: "Encontros de gaitas" e "Contracasso serra à baixo". Três outras duplas, comparecem também na gravação, com suas músicas simples, espontâneas e válidas por conservarem a autenticidade do canto rural, tema sobre o qual não nos cansamos de referir. Luando e Corumbá além do interessante "História do disco voador", apresentam o chote "Desse jeito não vai dá" . Nascimento (José do Nascimento, 36 anos), e Zeloni (Dirceu Alvés, 40 anos, paranaense de Wenceslau Braz) apresentam "Amor Definitivo", um fandango e "Roceiro feliz", um carrilhão. Já Porto Rico e Navegantes (Aristeu e Luís Cruz, pai e filho, 40 e 22 anos, respectivamente), outra dupla sertaneja de popularidade junto aos circuitos específicos, defende "Vim Prá te levar", um valseado e "Recordando e sofrendo", que é classificado como "balanceio". Por último, a dupla Flor da Mata (João Antônio da Luz, 39 anos, paranaense de Ponta Grossa) e Natal (Epaminondas Natal, 36 anos. curitibano) mostram o bolero "Um porto e uma saudade" (Eduardo Loureiro, o Jacuboski) e "Percorrendo os Estados", um chote que, em sua idéia central, lembra uma das mais populares composições que Belarmino e Gabriela cantava nos anos 50: "Viajando pelo Brasil".
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Na próxima semana, nos estúrdios Sir, Luando e Corumbá começam a gravar um elepe, com o título provável de "Sonho de um Motorista". Um disco em que falam de amores gauchescos, de loirinhas e morenas do Interior do Paraná, da vida de motorista. Tema simples e brasileiros, num trabalho espontâneo e que, não custa repetir, se pode ser frágil em termos artísticos, é rico e fértil para apreciações sociológicas. João Dorasil da Cruz, proprietário de borracharia em Ponta Grossa, e Antônio Bicunas, vendedor das bebidas Conte, transformam-se na dupla Corumbá e Luando e, violas brasileiríssimas, canto espontâneo, falam para o seu povo e sua gente. Com coração e sinceridade.
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Falando em Sir, Percy Tamplim continua vendo que valeu a pena o investimento feito: além da Continental, também a RGE vai aproveitar seus estúdios, para aqui produzir discos de música brasileira. As primeiras produções sairão em abril.
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