O circo místico (e mágico) na maturidade de um ballet
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 09 de maio de 1989
Mesmo não tendo subido no palco do auditório Bento Munhoz da Rocha Neto para receberem placas comemorativas aos 20 anos de existência do Ballet Guaíra, duas pessoas foram cumprimentadas por todos que conhecem e acompanham a nossa vida cultural. Otávio Ferreira do Amaral Neto, 50 anos, a quem se deve a criação da hoje consagrada companhia de danças e Marcelo Marchioro, 37, que quando diretor de arte e programação da Fundação Teatro Guaíra, teve a visão cultural para buscar Chico Buarque, Edu Lobo e Naum Alves de Souza na criação de "O Grande Circo Místico" - o melhor e mais bem realizado espetáculo de nossa companhia oficial de danças.
O revival de "O Grande Circo Místico" - apresentado no sábado, 6, para convidados e domingo, ao entardecer, com entrada livre (merece ter novas performances, a preços simbólicos, nas próximas semanas), provou que realmente marcou o ponto maior nas duas décadas do Ballet Guaíra. Mais de 140 performances no Brasil e Portugal - um recorde em termos de balé regional - o espetáculo que foi inspirado no poema de Jorge de Lima (1893-1959), somente cresceu neste período e revisto hoje, seis anos após sua estréia (17 de março de 1983), sente-se que é um momento de conjunção de talentos. Idealizado e produzido na administração do governo Ney Braga, quando o Paraná tinha como secretário da Cultura o democrático e sensível Luiz Roberto Soares (uma administração que, hoje, já se faz justiça pelo muito que realizou), "O Grande Circo Místico" foi estreado no terceiro dia da administração José Richa - quando Oracy Gemba já era o diretor escolhido para a superintendência da Fundação Teatro Guaíra. Uma ironia! Um espetáculo concebido por uma administração - que honestamente, não quis improvisar para antecipar a sua estréia - acabou sendo um dos raros pontos de destaque cultural na (calamitosa) administração que aconteceu no infeliz governo José Richa.
Com "O Grande Circo Místico", o Ballet Guaíra fez temporadas em várias cidades brasileiras e excursionou a Portugal, sempre com sucesso.
Outros espetáculos foram montados pelo Ballet, mas este permanece como um momento maior de comunicação. A fórmula tentou ser repetida: na administração José Richa, os diretores da Fundação Teatro Guaíra contrataram novamente Chico Buarque / Edu Lobo para fazerem um novo bailado, que teria libreto do poeta Ferreira Goulart: "Dança da Meia Lua". Foi um desastre! A encomenda demorou a se solidificar e só na atual administração, o libreto e a música foram entregues - e a montagem, apesar de toda competência dos autores, ficou muito aquém do desejável - tanto é que não conseguiu a mesma repercussão de "O Grande Circo Místico".
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Assim, para comemorar os 20 anos do Ballet Guaíra, a escolha de um espetáculo de beleza e comunicabilidade como "O Grande Circo Místico" foi perfeita. Belos figurinos criados por I. Chamiso Jr. - cuidadosamente conservados ao longo deste período (alguns trajes, obviamente, foram refeitos) e a iluminação e cenários de Carlos Kur, concebidos para a dimensão do grande auditório (mas suficientemente ajustáveis a outros espaços que o espetáculo já foi levado) mostra a dimensão técnica, que, originalmente, teve direção teatral de Emílio Di Biase. Carlos Triencheiras, 52 anos, desde 1979 diretor do Ballet Guaíra - realizou um espetáculo que, por muito tempo poderá ter revivals - já que atinge várias faixas de público e que justifica reapresentações. Infelizmente, devido às exigências financeiras dos autores (inclusive a filha de Jorge de Lima, para permitir a utilização do poema como base do libreto) fazem com que o espetáculo tenha alto custo: 45% da renda total de bilheteria é retida para divisão entre os herdeiros de Jorge de Lima, Chico, Edu e Naum. Com isto, em termos empresariais, dificulta-se novas temporadas, em produções que não tenham subsídio oficial - e inviabilizou, inclusive, a idéia de transformá-lo num musical, que teria a participação ao vivo de Milton Nascimento, Tim Maia, Zizi Possi, Gal Costa e outros superstars que gravaram a sua belíssima trilha sonora, arranjos do maestro Chiquinho e que foi editada em 1983 pela Sigla/Som Livre. A idéia, que não prosperou, era fazer apresentações em grandes espaços - cogitando-se até o Maracanãzinho.
A trilha musical de "O Grande Circo Místico" é conhecida pois várias das canções-temas de Edu e Chico ganharam vida autônoma e hoje são facilmente reconhecíveis pelo público. Isto amplia a comunicabilidade e justifica porque entre todos os balés produzidos pela companhia oficial da Fundação Teatro Guaíra, este é - e por certo continuará sendo - o que tem maiores possibilidades de mostrar o talento de nossos profissionais da dança.
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