O Som do Carnaval (II) - Da ecologia a Chocolate, os temas destes enredos
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 06 de fevereiro de 1986
Ecologia, cometa Halley, folclore, futebol, Zumbi dos Palmares, homenagens aos radialistas, cinema nacional e ao sambista Chocolate, estão entre os temas que as Escolas de Samba de Curitiba apresentarão amanhã e domingo na Marechal Deodoro. Com exceção da D. Pedro, Mocidade Azul e Ideais do Ritmo, as demais escolas não conseguiram sequer gravar em fita os sambas-de-enredo que estarão apresentando. E as poucas cópias feitas dos sambas de Nelson Santos ("Sétima Arte - O Cinema Nacional" - D. Pedro), Mattar e Gerson Fisbein ("Vila Velha, Suas Lendas, Seus Mistérios", Mocidade Azul) e Senthé ("O Ouro que Enriquece a Avenida", Ideais do Ritmo) não chegaram a ter, lamentavelmente, a divulgação merecida nas emissoras da cidade. Aliás, é incrível a insensibilidade dos programadores das nossas emissoras em relação ao Carnaval. Nem mesmo a motivação desta festa popular faz com que se escutem as músicas consagradas de Carnavais do passado. Os poucos discos com sambas-de-enredo das escolas do Rio e São Paulo, editadas pela Top Tape, TCA, Continental etc. também não encontram a divulgação esperada. E até os discos do Trio Elétrico, com sua aproximação ao público mais jovem e roqueiro, não conseguem furar a barreira dos responsáveis pelo que se ouve nas emissoras da cidade.
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Nelson Santos, 52 anos, ativo carnavalesco, é autor de quatro dos sambas-de-enredo das escolas de Curitiba. Em parceria com Washington Carcal, fez "Das Flores ao Fim do Arco-Íris", com o qual a Embaixadores da Alegria leva à avenida sua mensagem ecológica cantando:
Somos um povo/ Que o Eterno abençoou (por quem?)
Quem encontrar esta riqueza/ Viverá a natureza
(...) E bailando vão as rosas
Margarida beija a flor (O beija-flor)
Bem na linha do horizonte
Cristalina é a fonte
Arco-Íris do amor (o abandono)
KK, o estranho pseudônimo artístico de Antônio Carlos Buono, 45 anos, ex-integrante do grupo Ogum, também atacou com um tema ecológico para a Escola de Samba Unidos de Colombo, que sai com um enredo lembrando no título a Garcia Llorca:
"Verde é assim que eu quero ver-te".
Verde é vida/ Rosa é luz
Branco é a paz/ Que ao teu amor conduz
(...) E voa/ Voa, voa ligeirinho
Nas asas de um beija-flor
Vá contar os lindos sonhos
Que eu tive numa noite de amor
"Sétima Arte - O Cinema Nacional", oportuno enredo da Escola de Samba D. Pedro, ganhou um belo samba de Nelson Santos, com citações de títulos de filmes e atores.
Oscarito, oi/ Carmen Miranda que o mundo encantou
Oh! meu Rio 40 graus/ Tem o Pixote neste grande musical
(...) O Cinema Novo/ e o marginal
A pornochanchada/ Brasileira que legal.
A passagem do cometa Halley não poderia ficar sem seu registro carnavalesco: a E.S. Vila Unida de Frei Miguel, sai com este tema - que ganhou também um samba de Nelson Santos.
E olhando para o Céu/ O poeta escreveu
Uma frase no cometa/ Para lhe dizer Adeus
Finalmente, para a Imperadores Independentes, Nelson criou o samba de tema mais abstrato: "Ilusões". Falando da imaginação e fantasia, lembra Lobisomem, Boitatá, Mula-sem-cabeça e termina de forma mística-tropical:
Nas minhas mãos a cartomante viu
Mil odaliscas para enfeitar o meu harém
Jogando cartas fui até lá na Bahia
E no Bomfim me banhei com água benta.
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Autor do primeiro samba-de-enredo apresentado por uma Esola de Samba de Curitiba - os "Ciclos Econômicos do Paraná", em 1967, para a Não Agite - (embora Glauco Souza Lobo reivindique esta glória para a Embaixadores da Alegria, (1965, com "Colhedores de Café"), Paulinho Vítola, 38 anos, um dos mais criativos publicitários paranaenses e compositor maior do Paraná, voltou este ano a compor um samba-de-enredo para a Não Agite, falando dos tempos de glórias do Coritiba F.C. e da própria escola: "No Alto das Glórias".
Do alto das glórias chegou, chegou
A Escola namorada da cidade
Refrescai, refrescai vossas memórias
Tantas vitórias que hoje moram na saudade
Louvações não faltam, aliás, nos enredos das Escolas: a Leão de Ouro homenageia os radialistas e no samba-enredo de Di Péricles, o único profissional paranaense citado é Cláudio Ribeiro. Em que pese o valor do animado locutor-carnavalesco, deveria haver referência aos pioneiros de nossas emissoras. A Mocidade Azul sai com uma turística louvação a "Vila Velha, Suas Lendas, Seus Mistérios", cantada no competente samba de Carlos Mattar e Gerson Fisbein, dois experientes compositores.
Pelas mãos do vento e das águas
Com maestria a natureza desenhou
Uma história feita de jabia
Nos mistérios que um dia/ A tela do tempo gravou
A figura mitológica de "Zumbi" é o tema da Portão I, no samba da dupla Ciro-Bira da Vila, enquanto a Acadêmicos da Sapolândia recorda os 100 anos do Passeio Público com o samba de Homero Réboli/ Cláudio Ribeiro. Futebol tem que ser lembrado e isto Luiz Antunes Rodrigues faz em "Sai da Frente que Nós Vamos Quente", com o qual o Deu Zebra no Batuque vem para a avenida na noite de amanhã.
Lembrando seu fundador, o popular Chocolate (Mansuedem dos Santos Prudente), falecido a 14/12/1984, com 48 anos de idade, a Ideais do Ritmo sai com o enredo "Ó Nóis Aqui Tra Veiz - Oba Oba é Carnaval".
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