Yes, Curitiba também tem sambas-de-enredo
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 25 de janeiro de 1986
Há mais ou menos 14 anos, uma das mais influentes assessoras do gabinete do então prefeito Jaime Lerner, numa reunião em que se discutia questões ligadas à animação de Curitiba, chegou a sugerir que considerando o comportamento e a formação étnica de nossa população, continuar a investir no estímulo ao Carnaval oficial era um desperdício de recursos e energia. Sugeriu, então, que ao invés de se promover o Carnaval, Curitiba tivesse o "Anticarnaval": uma série de eventos culturais que nada têm em relação à festa de Momo - produzidas dentro de uma campanha na base de "Se você não gosta do Carnaval, venha para Curitiba".
A proposta, obviamente, foi rechaçada com protestos violentos. Mas há até hoje quem defenda esta idéia, partindo do princípio da falta de tradição em nosso Carnaval - ao contrário do que acontece no Rio, Salvador, Recife ou Florianópolis, do esvaziamento da cidade, do pouco entusiasmo que se observa nas ruas. Enfim, argumentos não faltam aos que criticam o nosso Carnaval - mas também aqueles que defendem a festa popular possuem fortes razões para insistir em sua revitalização.
O desfile curitibano
Assumida oficialmente pela Prefeitura há 25 anos, o concurso de Escolas-de-Samba começou dois anos antes, graças sobretudo aos esforços da então nascente Tribuna do Paraná, que através de seu departamento de promoções, dirigido por Constantino Viaro e Denisio Belotti, decidiu que era possível organizar os desfiles dos até então dispersos blocos de Carnaval - já que de Escola-de-Samba, a exemplo das cariocas, ninguém conhecia. Por uma ironia do destino, quase 30 anos depois, tanto Viaro como Belotti continuam às voltas com o Carnaval, só que hoje em espaços clubísticos, nas presidências do Curitibano e Santa Mônica Clube de Praia, respectivamente.
Sem característica oficial em suas primeiras edições, o Desfile do Carnaval de rua foi crescendo nos anos 60 com a formação das escolas-de-samba e transformação dos antigos blocos carnavalescos - alguns dos quais, como o Não Agite, embora chegando até um pentacampeonato, insistiam em manter a designação de Bloco. Curiosamente, quando acabou virando Escola de Samba, começou a sua decadência (enquanto apareciam outras formações em busca dos títulos - especialmente a Dom Pedro II e a Mocidade Azul). A Embaixadores da Alegria, fundada pelo advogado e folião José Cadilhe de Oliveira há 38 anos e que sob a égide da Sociedade Thalia foi, por anos, considerada uma escola de elite, perseguiu por mais de três décadas uma primeira classificação que nunca obteve.
A história do Carnaval curitibano existe. Tanto existe que em 1973, reunindo uma série de reportagens que o jornalista Jorge Narozniack, do extinto "Diário do Paraná", havia publicado em 1968, mais alguns outros textos avulsos, a Fundação Cultural editou "Nem Que Me Mordas", única referência, em livro, sobre esta festa popular em nossa cidade.
SAMBAS-ENREDOS - Glauco Souza Lobo, 48 anos, que está deixando a direção executiva da Fundação Cultural para assumir a Secretaria de Turismo - e que pela terceira vez é o grande comandante do Carnaval, está ligado à festa desde sua infância. Seu pai, o falecido industrial Aldo de Souza Lobo (1906-1975), em 1935 já integrava os Tenentes do Diabo, no Rio de Janeiro. Ex-dirigente do Não Agite e do Embaixadores da Alegria - agremiação que tentou recurperar em seus anos de crise, Glauco reivindica o mérito de ter sido co-autor do primeiro samba-de-enredo apresentado por uma escola de samba em Curitiba.
- "Foi "Plantadores de Café", em parceria com Rubens Rolim, que o Não Agite apresentou em 1965, num ano em que mostrou um dos melhores enredos no Carnaval".
Apesar do alegado pioneirismo de Glauco, foi o talentoso Paulinho Vitola, hoje um dos mais requisitados publicitários do Estado, quem fez o primeiro samba-de-enredo a ter grande repercussão: "Ciclos econômicos do Paraná", também para o Não Agite - em seus anos de glória.
Nos últimos dez anos, a maioria das Escolas de Samba passaram a apresentar sambas-de-enredo, mesmo que muitas vezes tendo um samba tão improvisado e composto horas antes do desfile, de forma que nem os próprios integrantes das escolas os conhecem. Este ano, das 14 escolas que estarão participando do chamado "Carnaval da Reorganização", nada menos do que quatro delas sairão com sambas-de-enredo de autoria de Nelson Santos, 51 anos, hoje o mais requisitado sambista carnavalesco: "Exaltação a Zumbi" para a G.R.E.S. Portão I; "Sétima Arte - Cinema Nacional" para a D. Pedro II; "Assombrações" para a Imperadores Independente e "Domingo de Carnaval - União de Raça e Cor" para a Treze de Maio - escola que desfila pela primeira vez como resultado da fusão da antiga Unidos da Princesa com o bloco 13 Ases.
Outros compositores veteranos também colaboram no Carnaval: Carlos Eduardo Mattar, advogado e professor, 48 anos, sambista há 35, em parceria com Edson Fisbein é autor de "Lendas e Mistérios de Vila Velha" para a E.S. Mocidade Azul - nos últimos anos, a campeoníssima do Carnaval; Homero Reboli - desta vez sem a parceria de Cláudio Ribeiro - compôs "Um Passeio no Tempo - Cem Anos de Passeio Público" para a Sapolândia; Antonio Carlos Bueno, ex-integrante do grupo Ogum, fez o samba para a Unidos de Colombo: "Verde é Assim que eu quero Ver-te". E até o estimado Paulinho Vitola, voltou a compor um samba-de-enredo - "O Alto das Glórias", para o Não Agite tentar um retorno ao Carnaval, no qual já teve glórias no passado.
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