O sucesso mundial de um nobre brasileiro: Marlos
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 29 de junho de 1980
Quando as intrigas do casal Peter - Mirian Daulsberg junto ao ministro Eduardo Portella, da Educação e Cultura, provocaram a saída do maestro Marlos Nobres da direção do Instituto Nacional de Música, não foi o compositor e regente que perdeu. O desgaste sofrido pelo MEC/Funarte foi internacional - e menos de um ano depois, Peter seria demitido por Guilherme de Figueiredo, então da presidente da Funterj, da direção da Sala Cecília Meireles e Miriam não teve outra saída senão deixar a chefia de gabinete de Portella. Marlos, 40 anos, hoje o compositor erudito brasileiro de maior prestigio internacional, não só recebeu o apoio e solidariedade das maiores expressões, como pode retornar sua carreira de compositor, recitalista e regente. Que interrompeu por 3 anos exclusivamente para se dedicar a implantar o INM, num expontâneo apoio ao ministro Ney Braga, que nele confiou tarefa das mais importantes. Hoje, Ney, governador do Paraná, tem em Marlos um de seus grandes amigos.
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E a noticia fala melhor do que os adjetivos para provar de que homens como Marlos não precisam de cargos - os donos do poder é que necessitam saber conquistar e manter sua colaboração. Só este ano, Marlos já esteve duas vezes no Exterior e amanhã embarca novamente para a Europa, para a convite da Unesco participar das reuniões do Conselho Internacional de Música que escolherão as personalidades mundiais que receberão o Prêmio Unesco/CIM de Música, assim como as obras dos diferentes países membros que integrarão os próximos discos da Coleção a Unesco. A reunião será em Innsbruck, Austria, de 2 a 5 de julho próximo.
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Marlos retornou há poucas semanas de sua segunda turnê à Europa, onde permaneceu de 18 de abril a 2 de julho exercendo atividades principalmente na Itália, Alemanha, Bélgica, França e Suíça. Em Roma, no final de abril, Marlos participou do Simpósio Internacional sobre o Barroco Latino-americano, fazendo uma conferência sobre << O ciclo de ouro do barroco brasileiro - a música sacra mineira no século XVIII >>, apresentando o resultado do seu trabalho quando dirigiu, no INM-Funarte, a equipe que realizou a montagem de 200 partituras daquele período, de nossa história musical. A conferência de Marlos foi a única citada pelo crítico Maurice Pianzola, no seu artigo << Rome: un Colloque-Les Latino-Americains redécouvrent 1`Amerique Baroque >>, no jornal << Tribune de Genève >> (17/5/80). O crítico afirmou: << o acervo é original e prolonga-se tanto na literatura quanto na música: quem sabia, por exemplo, que cerca de 2 mil composições foram descobertas, quase estragadas pelo tempo, nos arquivos episcopais do Estado de Minas Gerais no Brasil e foram (cerca de 200) transcritas sob a direção de Marlos Nobre, conhecido em Genebra como compositor de música contemporânea? >>.
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Em 26 de abril a Orquestra da Rádio de Colônia, sob direção de Pierre Bastianelli, apresentou << In Memoriam >>, de Nobre, que, no dia 12 de maio, no Conservatório Real de Bruxelas, fez um recital de piano com 3 de suas mais difíceis obras: << O Canto Multiplicado >>, << Rhythmetron >> e Biosfera >>. Na Alemnha, o compositor brasileiro escreveu sua obra mais recente, o << Desafio VII >> para piano e orquestra de cordas. Esta obra foi estreado em 26 de maio pela << Orchestre des jeunes de Fribourg >>, naquela cidade, sob a regência do autor. Entre muitos elogios, destacou-se o do crítico Michael Flechtner, de << La Liberté >>, de Fribourg, Suíça, que acentuou ter o compositor elevado sua linguagem, << tornando-a enormemente colorida mas possuidora de impressionante rigor. As harmonias são sempre muito calorosas e a linguagem ritmica e sutil. Marlos Nobre conseguiu à frente da Orquestra de Jovens uma bela intensidade, sonora e expressiva, oportunidade de evidenciar aqui sua sensibilidade ao mesmo tempo que sua maestria.
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Ao retornar ao Brasil, em junho, Marlos encontrou o convite da Universidade de Indiana para ser um dos três compositores participantes do I Forum de Verão da Música de Nosso Tempo. O convite inclui uma encomenda de 10.000 dólares para Marlos escrever uma nova obra sinfônica que será estreada naquela cidade em julho/81. Além da execução e da encomenda, a nova obra de Nobre será gravada e lançada em disco nos EUA,. Os outros dois compositores escolhidos são norte-americanos famosos são Norton Babbit e Lukas Foss. Junto a esses dois músicos, o compositor brasileiro será compositor-residente na Universidade de Indiana, no período de 27 de julho a 9 de agosto de 1981, encontrando-se com teóricos, músicos e compositores da Universidade, discutindo sua obra e ditando Master Classes. Outro convite honroso para Nobre: por indicação expressa do compositor italiano Goffredo Petrassi, Marlos integrará p júri internacional do 3.º prêmio Ancona (composição musical para instrumentos de sopro ), em Ancona, Itália, de 23 de setembro a 2 de outubro próximo. Na Itália, ainda, o 3.º Festival Internacional de Música Antiga e Contemporânea de Torino, dedicará toda uma noite às suas obras: << Ukrinmarkrinkrin >> (título também de um curta-metragem sobre sua vida e obra), << Canticum Instrumentale >>, << O Canto Multiplicado >> e << Sonancias II >>, esta última em primeira audição mundial, pelo conjunto Antidogma Músical, de Turim. E como se não bastassem esses convites, o Conselho Argentino de Música incluiu Marlos no I Atelier do Compositor latino-Americano, em Buenos Aires, de 9 a 15 de novembro.
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E a obra de Marlos - com razão comparado com um Villa Lobos de nossa época - não permanece em circuito fechado. A Unesco divulgou a lista de obras contemporâneas mais executadas nas rádios européias e americanas, figurando na mesma << In Memorian >>, com 24 transmissões nos seguintes países: Alemanha, Austrália, Canadá, Coréia, Espanha, França, Grécia, Islândia, Israel, Itália, Noruega, Nova Zelândia, Holanda, Suíça, Turquia, Bulgária, Venezuela, Hungria, Dinamarca, México, Polônia, Estados Unidos e Argentina . Em breve, a Rádio Estadual do Paraná, dentro de sua programação que vem sendo reestruturada com coordenação do diretor Roberto Guimarães, vai apresentar uma série de especiais sobre Nobre, inclusive com um longo depoimento do compositor.
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Ainda de música, neste domingo de bons sons: Norton Morozowcz chegou ontem a Curitiba, para aqui ultimar os detalhes do II Festival de Música de Londrina, do qual é o diretor. Na segunda-feira passada, na sala Funarte, no Rio, Norton, na flauta, Antônio Almo Mendonças (sax), Wanda Eichbauer (harpa) e Sônia Maria Vieira (celeste), além do coro feminino da Associação de Canto Coral, apresentaram uma solida versão do << Quarteto Simbólico >> de Villa Lobos - obra que não se ouvia no Brasil há mais de 50 anos, pois, como registrou o critico Ronaldo Miranda, do << Jornal do Brasil >>, inexplicavelmente ficou restrita a apenas uma audição carioca, na década de 20, quando foi composta. Mais uma vítima do ostracismo em que se encontra a criação musical nacional, mesmo em se tratando de Villa Lobos, esse curioso << Quarteto >> não merecia o esquecimento a que foi relegado: é uma obra rica e inventiva com descobertas tripicas de grande efeito e uma agradável fusão de sugestões do impressionismo francês com elementos de música brasileira >>.
FOTO LEGENDA 1- Norton: festival em Londrina.
FOTO LEGENDA 2- Marlos: reconhecimento mundial.
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