Papagaiada
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 11 de junho de 1974
Uma questão muito alada vai pousar nos próximos dias na mesa de algum dos desembargadores do Tribunal de Alçada, exigindo muito equilíbrio do magistrado que apanhar a pena para dar a sentença. Pois o pivô da causa é nada mais nada menos do que um bonito papagaio que fala bastante e como bom psicatiforme também conhece alguns sonoros palavrões. Tudo começou no ano passado, quando o fazendeiro Rubens Pânico, residente na Rua Drango, na cidade de Arapongas, notou que o seu papagaio havia desaparecido e, por uma colorida coincidência, uma ave semelhante havia pousado há igual tempo no poleiro de seu vizinho, Miguel Houatich, na mesma rua. Esgotadas as conversações amigáveis, Pânico não teve dúvidas: apresentou uma representação contra o vizinho, acusando-o de apropriação indébita. Enquanto o processo se arrastava, o juiz José Wanderley Rezende nomeou como depositário da ave o Sr. Bernardo, proprietário de lanchonete Cachanga, na Rua do Tucano. Formado o volumoso processo, as provas levantadas não foram suficientes para convencer o juiz Rezende da apropriação indébita - já que a maior dificuldade era estabelecer a verdadeira identidade do pássaro, pois o querelado argumentava ter adquirido há muito tempo o seu papagaio. Afinal, concluiu pela insuficiência de provas, absolvendo o réu. Em pânico pela decisão, Rubens Pânico contratou o advogado Francisco Leite Chaves, dono da mais movimentada banca de Londrina e candidato do MDB ao Senado, para, com sua pena inspirada preparar um recurso ao Tribunal de Alçada, já que o promotor de Arapongas, Gustavo Amazonas de Almeida não havia recorrido da sentença do juiz da comarca.
Em seu emplumado arrazoado, Chaves argumenta que um caso ornitológico como este só poderia ocorrer mesmo numa cidade chamada Arapongas, onde todas as ruas tem nomes de pássaros.
Extra-judicialmente, comenta-se que problemas mais profundos devem ter provocado a demanda, pois tanto Pânico como Houatich são prósperos araponguenses, ligados a empreendimentos rurais e não teriam motivos financeiros para brigar por uma ave, por mais estimação que a mesma merecesse. Assim, na verdade o papagaio está pagando o pato.
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