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Aramis

Ritt, um cineasta com três metros de altura

De toda uma geração que chegou a Hollywood nos anos 50 trazendo um aprendizado nos tempos pioneiros da televisão e com algumas passagens pelo teatro, Martin Ritt, um nova-iorquino que comemorou no dia 2 de março seus 71 anos, está entre os que mais se ajustaram a um cinema que, em três décadas e meia, tem se mostrado com a maior coerência intelectual sem desprezar um sucesso que lhe permitiu realizar 30 filmes que merecem no mínimo a classificação de bom - mas chegando várias vezes a obter a categoria de excelente. Estudante de direito, serviu na II Guerra Mundial, foi ator (entre outros filmes apareceu em "Encontro nos Céus", Wingered Victory, de George Cukor) e, nos anos 50 esteve entre os perseguidos pelo Macarthismo, o que o levaria, em 1976, a realizar o primeiro filme denunciando aquele período negro da história americana ("Testa de Ferro por Acaso/The Front", com Woody Allen). Na televisão, Ritt realizou séries marcantes, inclusive "Danger" e de sua passagem pela Broadway se destacariam encenações de textos como "Golden Boy", "The Man" e, especialmente, "Panorama Visto da Ponte" de Arthur Miller - outra vítima do Comitê de Atividades Anti-Americanas. Ao estrear como diretor no cinema, aos 37 anos, Ritt era um profissional que sabia o que queria. Por isto, não é de surpreender que o seu primeiro longa, "Um Homem tem 3 Metros de Altura" (Edge of City), sobre a amizade entre um branco inseguro (John Cassavetes) e um preto leal e corajoso (Sidney Poitier, no melhor trabalho de sua carreira) tenha sido recebido com aplausos unânimes - e permaneça hoje, 34 anos depois, como um dos filmes mais emotivamente humanos e integracionistas já saídos de Hollywood. Na longa filmografia de Ritt, observa-se sempre sua preocupação como o homem, a denúncia da hipocrisia social, das condições desonestas, numa coerência explícita mesmo quando obrigado a trabalhar com produções manietadas pelos tycoons da 20th Century Fox. Assim, ainda nos anos 50, foi um dos primeiros cineastas a discutir o novo comportamento sexual (da época) em filmes como "A Mulher do Próximo" (No Down Payment, 57), "O Mercador de Almas" (The Long Hot Summer, 58) e "A Fúria do Destino" (The Sound and the Fury", 59), estas duas últimas baseadas em explosivos textos de William Faulkner (1897-1962), um dos muitos escritores que tiveram honestas adaptações ao cinema graças a sua sensibilidade. Ernest Hemingway ("As Aventuras de um Jovem", 62) e John Le Carré ("O Espião que saiu do Frio", 66), foram outros autores que tiveram transposições cinematográficas por Ritt, que, com competência, levou ao Oeste a História de "Rashomon", "Quatro Confissões", (The Outrage, 64), também marcando de uma forma diferente outras incursões por este gênero - como em "Hombre" (67). O lado social, da visão das lutas sindicais, transpareceu em obras como "Verte-ei no Inferno" (The Molly McGuire, 69) e, mais recentemente em "Norma Rae" (79), que valeu inclusive a Sally Field o Oscar de melhor atriz. As relações com os negros - seja num libelo da violência do boxe ("A Grande Esperança Branca", 70) ou no profundo "Sounder, Lágrimas de Esperança", refletiram sempre a seriedade de Ritt em trazer denúncias, como fez em relação ao sistema escolar no inesquecível "Conrack", até hoje entre os melhores momentos do cinema dos anos 70. Mas numa linha direta em relação ao humanismo de "Um Homem tem 3 Metros de Altura", Ritt teve dois outros instantes iluminados em sua obra: no praticamente desconhecido (em Curitiba passou uma única semana no extinto Rivoli e nunca foi reprisado nem mesmo na televisão) "Reencontro de Amor" (Pete'n Tillie), com Walter Matthau e Carol Burnett - que, em 1972, trazia tanta carga de integração e sinceridade humana como, em 1963, havia marcado "Hud, O Indomado". Portanto, ao se lembrar - como uma referência informativa aos que se interessam pelo cinema - alguns dos títulos de Ritt, entende-se porque este recentíssimo "Stanley e Iris" adquire tamanha importância. Infelizmente, dois de seus trabalhos de início dos anos 80 ("Back Roads" em 81 e "Cross Creek", 83), permanecem inéditos - embora, em "O Romance de Murphy" (85, novamente com Sally Field) o lado emoção do então quase septuagenário Ritt tenha explodido com toda intensidade. Aos 71 anos, mas com a mesma garra, Ritt faz deste romance de Stanley e Iris mais um reencontro de amor, mostrando porque é um cineasta com três metros de altura. LEGENDA FOTO - Stanley (Robert de Niro) e Iris (Jane Fonda): encontros & desencontros de gente simples na busca da felicidade. Um filme marcante, em exibição no Condor.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
27/06/1990

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