Um acontecimento musical
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 23 de maio de 1978
Pela primeira vez, em seus 71 musicais anos, o compositor João de Barro (Carlos Alberto Ferreira Braga, Rio de Janeiro, 29 de março de 1907) veio ao Paraná. Junto com quatro grandes amigos - Luís Antônio (de Pádua Vieira da Costa, 57 anos), Cesar Costa Filho (34 anos), Miltinho (Milton Santos de Almeida, 50 anos) e Mano Rodrigues (31 anos), iniciou ontem, no Teatro São João, na Lapa, o chamado "Circuito Paraná", que o letrista Heitor Gurgel do Amaral Valente e Joaquim Portes, diretor de Assuntos Culturais da SEC, idealizaram para levar a boa música brasileira a cidades do Interior, uma vez que o Projeto Pixinguinha se restringe as capitais.
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A presença na terra de uma personalidade artísticada força e grandeza de Braguinha, mais de 600 músicas gravadas, uma contribuição no cancioneiro que começa com o Bando dos Tangarás, ao lado de seu (hoje) cunhado, Almirante (Henrique Fôreis, 70 anos) e Noel Rosa (1910-1937) e vem até os nossos dias, é, realmente, um evento especial. Terno, generoso e compreensivo com todos, sem qualquer rancor ou mágoa, o Braguinha é, no seu vigor e lucidez, possivelmente o último grande sobrevivente de toda uma geração dos chamados "anos de ouro" na MPB. Sua presença em palco - ontem na Lapa, hoje, as 21 horas, para única apresentação no Guaíra, depois em Ponta Grossa, Londrina, Apucarana, Maringá etc. - é um verdadeiro depoimento ao vivo de um homem que fez as mais conhecidas marchinhas carnavalescas, em parceria com o médico Alberto Ribeiro (1902-1971), mas também teve a felicidade de criar as letras poemas para dois hinos do cancioneiro verde-amarelo:. "As Pastorinhas", com Noel Rosa e "Carinhoso", com pixinguinha (Alfredo da Rocha Viana Filho, 1898-1937). Co-roteirista de filmes realizados nos anos 30/40, produzidos por Adhemar Gonzaga (1905-1978), alguns dirigidos pelo norte-americano Wallace Downey, diretor artístico da Continental por mais de 20 anos, ali lançando dezenas de grandes nomes, introdutor do disco com estorinhas infantis, responsável pela dublagem dos desenhos animados de Walt disney ("Branca de Neve e os Sete Anões", "Pinocchio", "Cinderela" etc.), João de Barro é, realmente, um homem de imensas e belas estórias que já mereceu várias homenagens, inclusive um show apresentado no Vivará, no RJ, há alguns anos ("O Rio Amanheceu Cantando"). Agora, no palco, de forma descontraída, divide com Luis Antônio, coronel (reformado) do Exército e autor de belíssimos sucessos que Miltinho lançou na boite Drink, no RJ, nos anos 50, além de sucessos carnavalescos ("Lata D'Água", "Barracão" etc), um espetáculo-documento, que merece ser (entendido) saudado como um importante acontecimento. Lamentável que Hermínio Bello de Carvalho não tenha lembrado-se disto e incluído-o em escala nacional, dentro do Projeto Pixinguinha.
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Domingo à tarde, no acanhado Teatro Universitário, o espetáculo foi praticamente montado. Criado coletivamente, com palpites e sugestões de todos seus participantes, nasceu sem pretensões maiores. Apenas do encontro de três compositores representando diferentes gerações - Braguinha, Luís Antônio e Cesar Costa Filho, dois intérpretes - Miltinho e Mano (este um jovem de Belém do Pará, hoje o melhor crooner da noite carioca, contratado da Fossa), acompanhados por dois instrumentistas da cidade - Celso Pirata (violão e flauta) e Melchiades (bateria). A dificuldade maior foi fazer a seleção musical, pois tanto Braguinha, em sua ternura de eterna criança:
- "Pode ser que muitos outros compositores tenham uma obra mais importante em termos musicais. Mas poucos tem a alegria de ver um operário cantando "As Pastorinhas" ou um engraxate assobiando "Carinhoso" enquanto dá brilho a um sapato".
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