Vagão do armistício poderá renascer
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 18 de outubro de 1980
O engenheiro Renato Meister, que por uma década dirigiu a seção do Paraná da rede Ferroviária Federal, no final de sua administração estava convencido de que uma idéia, levantada há alguns anos, nesta coluna, é viável: o aproveitamento do "" Viaduto João Negrão" - a popular "Ponte Preta", como base para um restaurante de características especiais, capaz de ser uma espécie de reedição do histórico "Vagão do Armistício", que o imigrante Isaac Lazarotto manteve por muitos anos, a partir da década de 30, no bairro do Capanema. E onde, um dia, o interventor Manoel Ribas (1873-1946) ficou impressionado com os desenhos de um garoto chamado Napoleão Potyguara e lhe presenteou com uma bolsa de estudos no Rio de Janeiro. E hoje este garoto é o nacionalmente consagrado Poty.
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A idéia de que a "Ponte Preta" possa ter um aproveitamento turístico não é nova. Esperava-se que o sucessor de Meister na direção da RFFSA, o engenheiro Paulo Munhoz da Rocha, se mostre sensível ao seu melhor aproveitamento. Afinal, desde 6 de agosto de 1976, aquela edificação está tombada pelo Patrimônio Histórico do Estado, não devendo haver, assim, risco da mesma ser demolida. Tão logo o parque de operações da Rede nos fundos da antiga estação seja totalmente desativada, o viaduto perderá o trânsito de trens. E o espaço ali existente pode abrigar 4 a 6 vagões que, mediante pequenas obras, poderão sediar um original restaurante permitindo uma boa vista e com acesso lateral já que o atual leito ferroviário, igualmente desativado poderá se transformar em parque de estacionamento de veículos.
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O prédio da antiga estação ferroviária construída há quase 100 anos também foi tombado a 6 de agosto de 1976 e, desde que foi inaugurada a Rodoferroviária (13/11/1972), já se vinha discutindo o seu aproveitamento. Ali estão alguns setores da RFFSA, e se planeja a montagem de um museu ferroviário, que já tem um conservador, Edilberto Trevisan, um funcionário da rede apaixonado acervo, mais ainda não existe fisicamente.
Já a "Ponte Preta" cujo tombamento se deve a gestão do arquiteto Sérgio Todeschine Alves, no patrimônio histórico que atravessa a Rua João Negrão, na esquina da Avenida 7 de setembro, tem uma placa de bronze, num dos pilares com uma lacônica informação: "Viaduto João Negrão, construído na administração do Coronel Durival de Brito e Silva, pelo engenheiro Oscar Machado da Costa, em 1944". Mas a história do viaduto tem duas fases: a primeira ponte foi inaugurada no dia 2 de fevereiro de 1885, embora o primeiro trem tivesse passado por ela em 1884. Não tinha nome e era chamado Viaduto da rua Schmidtlin porque o proprietário das terras próximas a estação ferroviária tinha esse nome. Foi a última obra de arte construída na linha Paranaguá-Curitiba. Sua cor era realmente preta e nela foram empregadas 21.178 toneladas de material. Todo o ferro utilizado na sua construção foi importado da United States Steel Co., Nova Iorque. Tinha 20 metros de vão e 5 metros de altura, mas depois a rua subiu e a ponte ficou com apenas 4 metros de altura, fazendo com que muitos caminhões encalhassem debaixo dela.
Aliás, segundo Edilberto Trevisan, do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná e a quem se deve os esforços para o futuro Museu Ferroviário, a ponte existe por acaso. Ali nem deveria existir ponte. Mas na época da sua construção toda aquela área onde se estabeleceu a estação ferroviária era um lodaçal, inclusive a rua João Negrão. As inundações não permitiam o acesso de trens em épocas de chuvas. Assim os engenheiros aterraram tudo e foi necessário uma ponte que ficou sem nome, mas com o apelido de Ponte Preta.
A antiga ponte, ou viaduto, também não tinha muros ao seu redor, como os que lá estão hoje. O local da ponte era tétrico, os assaltos ocorriam com freqüência, pois era uma zona de marginais. A ponte não construída por escravos, mas por imigrantes, principalmente italianos que carregaram o barro, os dormentes, as pedras e o ferro. Não se sabe quanto tempo levou para ser construída, mas a estrada levou mais de 5 anos.
Em 1941 ela deixou de ser preta. Durival de Brito inaugurou um novo viaduto para satisfazer as necessidades do maior movimento da rede, com duas vias. A ponte ficou com a cor metálica e custou 271 contos de réis, 132 mil réis e 102 réis (um desafio para um economista com tempo: que tal fazer a correção monetária desta importância?). Seu construtor foi o engenheiro Oscar Machado da Costa mesmo depois de sua remodelação continuou a servir de abrigo a muitos mendigos.
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Agora, com a desativação da última parte da ferrovia, a ponte ficará ociosa. E o seu aproveitamento com um restaurante, instalado em vagões, fica aqui como sugestão.
LEGENDA FOTO 1 - Meister: idéia viável.
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