Açougue sim! Mas também uma locadora
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 18 de outubro de 1987
Como era de se prever, interessantes informações sobre o mercado de vídeo e a questão do jornalismo cinematográfico foram levantadas durante a mesa-redonda sobre "cinema, vídeo e imprensa", na tarde de 9 de outubro corrente, durante a I Mostra do Cinema Latino-Americano do Paraná. Jornalistas da área de cinema - entre os quais expressões nacionais como Nelson Hoinef, da "Variety" (no Brasil) e Rede Manchete, presidente da Associação dos Críticos de Cinema do Rio de Janeiro; Wilson cunha, do "Jornal do Brasil"; Edmar Pereira, do "Jornal da Tarde"; Pola Vartuck, do "Estado de São Paulo" (que, no final, acabou eleita presidente da então criada Associação de Críticos de Cinema do Brasil), Carlos Eduardo Loureiro Jorge, de Londrina, entre tantos outros, discutiram, por quase quatro horas, questões relacionadas ao tema proposto.
Foi preciso que o moderador da mesa, professor Carlos Eduardo, da Universidade de Londrina, ex-crítico de cinema e vídeo da "Folha de Londrina", usasse toda sua experiência para evitar que a discussão ficasse apenas na questão do vídeo - descambando, inclusive, para a área de sua comercialização, ação do Concine, legalização, pirataria etc. - o que fugiria dos propósitos da mesa.
Procurou-se, isto sim, em analisar a relação do vídeo e a mídia impressa que, nos últimos três anos, vem dando cada vez mais atenção ao cinema uma vez que o vídeo usa basicamente filmes. José Augusto Iwersen, 41 anos, curitibano, desde 1982 radicado em São Paulo, onde é editor de várias publicações ligadas ao vídeo e cinema, trouxe informações interessantes em torno do mercado editorial. O jornalista Pedro Martins Freire, editor do suplemento de informática e vídeo do "Diário do Nordeste", em Fortaleza, também deu importantes dados sobre os espaços que se abrem para a divulgação desta nova forma de distribuição de imagens. Carlos Eduardo, crítico e ensaísta dos mais rigorosos, lembrou um aspecto importante em relação aos que se dispõem a criticar um filme a partir da visão de uma cópia de vídeo: como analisar a fotografia se a cópia não estiver absolutamente perfeita. Mesmo sendo original, nem sempre o vídeo consegue capturar a concepção estética original do cinema, fazendo que neste aspecto a questão ganhe novos contornos.
José Eduardo Mendonça, 37 anos, ex "Bizz", editor de "Fotogramas & Vídeos", publicação criada em associação com o pioneiro (e ex-rei da pirataria) Ronald Matarazzo Suplicy, dono do Vídeo Clube do Brasil, trouxe informações up to date, especialmente sobre a entrada no mercado da Warner e Walt Disney Productions. A Warner aguarda apenas a "limpeza" do mercado - o que está acontecendo, graças a ação forte do CONCINE. Mendonça nos contou, informalmente, que o mercado precisava mesmo uma moralização, lembrando que nos últimos meses, devido a liberalidade do mesmo, pessoas totalmente despreparadas decidiram abrir suas locadoras.
- Cheguei a ser procurado por dois açougueiros de São Paulo que desejando aproveitar um espaço ocioso de suas lojas queriam saber o que era necessário para abrir uma locadora. E o mais grave: eles abriram a locadora...
A coisa até virou modismo, lembra Mendonça:
- Antigamente, quando havia uma separação, o marido compensava a esposa lhe dando uma boutique. Depois, virou loja de produtos alimentícios congelados. Agora, na separação, a "ex" ganha uma locadora...
Portanto, em que pese a limitação que o combate as fitas piratas traz em termos de informações aos interessados em conhecer a produção cinematográfica contemporânea, o mercado estava mesmo necessitando de uma limpeza. Em termos de imprensa, o espaço será destinado cada vez mais a divulgar os tapes selados - com informações sobre cada filme-tape lançado.
Lamentavelmente, as pessoas que, em Curitiba, escrevem sobre vídeo, devem se considerar tão autosuficientes, "bem informadas" que não deram o ar de sua presença na mesa-redonda.
LEGENDA FOTO - José Augusto Iwersen: os dados do mercado.
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