Alerta de Fulgraf para os riscos do acordo nuclear
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 14 de outubro de 1989
Participante de movimentos ecológicos há muitos anos - desde os tempos em que residia em Berlim Ocidental - o jornalista e cineasta Frederico Fulgraf faz muito mais do que simplesmente aparecer em entidades que, muitas vezes, buscam mais a política e a promoção, do que um real trabalho em defesa do meio ambiente.
Há 9 anos, quando retornou ao Brasil - radicando-se em Curitiba, cidade em que passou sua infância e na qual reside sua mãe (seu pai, Willi Fulgraf, foi diretor técnico da Impressora Paranaense por muitos anos, já falecido), Frederico realizou documentários contundentes - levados (e premiados) em várias partes do mundo - como "Kuarup - Adeus Sete Quedas", "Expropriado" e "DDD-Dose Diária Aceitável/O Veneno Nosso de Cada Dia".
xxx
No ano passado, Frederico publicou um livro resultante de anos de sérias pesquisas sobre a questão nuclear - "A Bomba da Paz" (brasiliense, edição esgotada). Agora, Frederico volta a ser notícia nacional dentro de um assunto polêmico - e que até o momento não teve ainda a divulgação merecida: no dia 15 de novembro, quando os brasileiros estarão escolhendo o novo presidente (ou ao menos os dois candidatos que irão para o segundo turno) encerra-se o prazo para o governo brasileiro se posicionar em relação ao rompimento do acordo nuclear firmado com a República Federal da Alemanha em 1975.
Por conta deste acordo em 1988 o Brasil devia aos bancos alemães cerca de US$ 4 bilhões (cerca de NCz$ 12 bilhões no câmbio oficial). Como o assunto é delicado, o governo Sarney não manifestou interesse em provocar também a sua discussão embora o deputado federal Fábio Feldman (PSDB-SP), ecologista feroz, tivesse encaminhado no dia 21 de setembro ao Congresso um projeto de decreto para anulação do acordo.
xxx
Frederico Fulgraf em entrevista à "Folha de São Paulo" revelou documentos que obteve na Alemanha sobre a formação de Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a ligação do acordo com o programa nuclear paralelo brasileiro.
Em documentos, deputados do Partido Social Democrata (PSD) e Partido Verde (PV) alemão pedem que o governo suste o negócio sob o argumento de que o Brasil pode estar adquirindo tecnologia para fabricar a bomba atômica.
A repórter Tania Malheiros, da sucursal da "FSP" no Rio de Janeiro, com as informações colhidas junto a Frederico, publicou que "o negócio previa a construção de oito usinas nucleares no Rio e em São Paulo, além da aquisição, pelo Brasil, de um dos tipos de tecnologia para a obtenção do urânio enriquecido".
A Nuclebrás montou a usina, no município de Resende (RJ), mas a unidade está paralisada. Das usinas nucleares previstas, duas começaram a ser construídas - a Angra 2 e a Angra 3, no município de Angra dos Reis, RJ. Angra 1 - a única em funcionamento - foi comprada dos Estados Unidos e está fora do acordo.
xxx
O deputado Feldman - que há pouco veio a Curitiba, participando inclusive de um programa de debates na TV Manchete ao lado do prefeito Jaime Lerner - na condição de vice-presidente da Comissão de Defesa do Consumidor e do Meio Ambiente, afirma que o acordo foi muito negativo, porque não trouxe benefícios ao Brasil. Na campanha contra a sua anulação já haviam se incorporado até o dia 16 de setembro a União de Defensores da Terra (Oikos), o Centro Ecumênico de Documentação e Informação (Cedi) e a Assembléia Permanente das Entidades de Defesa do Meio Ambiente (Apedema).
Frederico Fulgraf, em sua sinceridade germânica, vai direto ao cerne da questão:
- "Está havendo uma grande inércia no Brasil sobre o assunto e por isso o acordo poderá ser automaticamente renovado".
O negócio foi firmado em 27 de junho de 1975, a sua promulgação teve publicação no Diário Oficial da União em 10 de outubro e em novembro houve a ratificação. O acordo termina em novembro de 1990 e se não for rompido por uma das partes ou ambas, um ano antes, será automaticamente renovado.
Enviar novo comentário