A bela música que Túlio fez e Nascimento cantou
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 07 de março de 1989
Mais do que defeitos, deve-se procurar ver as virtudes em "Jorge, Um Brasileiro", primeira produção nacional com lançamento em 1989 - ano que se afigura dramático para o nosso cinema (há apenas 11 longas em condições de entrarem no mercado, o que se refletirá na pobreza artística dos festivais), e que, coincidentemente, chegou em Curitiba ao mesmo tempo em que está em exibição (Ritz, 5 sessões), outro filme brasileiro voltado para nossas raízes, o atualíssimo "Fronteira das Almas", de Hermano Penna.
Se Penna, em seu filme rodado em Rondônia, focou a questão das terras, com toques de pessimismo por mostrar as vítimas do chamado "milagre brasileiro", "Jorge" é a saga de um grupo de caminhoneiros numa missão difícil. Um filme centrado na estrada, valorizado por um roteiro que, infelizmente, prejudicou alguns personagens, mas que tem um resultado razoável. Se não tivesse sido lançado nacionalmente, inclusive em Porto Alegre (o que o invalida para disputar o XVII Festival de Cinema Brasileiro de Gramado), o filme de Thiago poderia conquistar ao menos um Kikito: o de melhor trilha sonora.
A música que o mineiro Túlio Mourão criou para ilustrar "Jorge, Um Brasileiro" é um trabalho vigoroso, adulto, equiparando-se assim ao que vêm fazendo outros compositores (Sarraceni, David Tiguell, Dori Caymmi, Macalé etc.) na criação de sound tracks para nossos filmes. Felizmente - o que é raro tratando-se de produção nacional - a música de "Jorge, Um Brasileiro" já está nas lojas (elepê do Estúdio Eldorado, ao redor de NCz$ 7,00), resistindo a audição independente das imagens. Em 16 temas instrumentais, Túlio Mourão, também tecladista, compôs todo um universo, pautando os temas de amor, as seqüências de memória ("O Desastre", "Romance"), as seqüências mais dramáticas e até um "Rock Lanchonete". No filme, há também músicas incidentais, inclusive temas bregas, como o que a personagem Olga (Denise Bandeira, em curtíssima aparição) canta numa sofisticada zona visitada pelos caminhoneiros.
Ótimos instrumentistas - Celso Fonseca no violão guitarra; Robertinho Silva e Jurim Moreira na bateria; Paulo Lieberman no sax-flauta, Marcelo Bernardes na clarineta; João Batista no baixo e quatro cellos (Jacques Morelembaum, Jorge Ranewski, Alceu Reis e Márcio Mallard) desenvolveram todo um universo sonoro, credenciando a trilha como uma das melhores do cinema brasileiro nos últimos anos. Claro que o pitéu maior foi a participação de Milton Nascimento, interpretando em português e inglês (versão de Regina Werneck), a canção-tema, "Visões", letra de Ronaldo Bastos, que procura passar em seus belos versos, o universo dos personagens deste "Jorge, Um Brasileiro".
Voa e não se pode pegar/O que pra uns é sertões
E para outros são visões do mar
Desvendam belos horizontes
Pontes, fontes e terras
Viver até arrebentar?
Visões que tem do amanhã
Que acaba de chegar
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