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Aramis

Brasil musical que a Caju está exportando

Na verdade, seriam reedições se não fosse o fato de saírem agora com tanta perfeição sonora que a sensação é de uma novidade. Peter Klann, um alemão que se [?] brasileiro tanto ao ponto de aqui estar editando o que de melhor [??] termos em matéria musical - numa época em que o lixo sonoro é empurrado ouvidos abaixo dos consumidores - dá mais uma mostra de carinho para com a nossa melhor música instrumental. Depois de ter adquirido os direitos sobre três produções fonográficas que originalmente não tiveram melhor promoção e as ter relançado em vinil, agora, pelo seu selo Caju, coloca em CD as gravações "Seresta Brasileira", com Baden Powell, "Gosto de Brasil", unindo o violonista Nonato Luiz, o percussionista Djalma Corrêa e o baixista Luiz Alves e "Jazz Mineiro", com o tecladista Túlio Mourão. As capas destes três discos já falam da brasilidade que marca o trabalho. Baden Powell, violonista maior deste país, recria toda a dimensão da ilustração de César Lobo, no projeto gráfico de Cristina Portela, sugere numa imagem do seresteiro apaixonado cantando seu amor à bela jovem que na sacada de seu quarto - num sobrado oitocentista - o contempla extasiada. Já "Gosto de Brasil", proporciona também uma concepção ampla: a foto de uma embarcação sugerindo toda a dimensão da música que Nonato, Djalma e Luiz oferecem - em contracanto a Clarisse Grova e participação de Mauro Senise. Finalmente, a paisagem de uma velha construção ao estilo mineiro dá aquele toque verde-amarelo às concepções modernas de Túlio Mourão, que sem perder suas raízes é universal em seu som. Estes três discos, quando de suas edições em vinil, aqui foram registradas com entusiasmo - merecendo inclusive destaques entre os melhores do ano. Entretanto, não se pode deixar de recomendar que aos que buscam a perfeição sonora - ou aqueles que não o adquiriram - aproveitem agora a oportunidade que Peter Klann oferece para que se possa conhecer momentos tão mágicos de nossa criação musical. Baden Powell (D'Aquino, Varre Sai, Rio de Janeiro, 06/08/1937), com uma carreira que já passa dos 40 anos - pois começou garotinho, de calças curtas, discípulo do grande Meira (Jaime Thomas Florence (1909-1982), é um virtuose na mais ampla expressão da palavra, capaz de ao violão passar por qualquer gênero - mas sendo sobretudo brasileiro. Como tão bem diz Maurício Quadrio, do alto de sua experiência de grande pesquisador, produtor e estudioso musical, "poucos musicistas, como Baden Powell, sabem transmitir o sentido verdadeiro da seresta, sua essência musical, o espírito que o anima, a íntima brasilidade que o transformou num gênero musical específico". A isso acrescente-se o tempero da carioquice que lhe é natural para obtermos os resultados mágicos que este disco expressa. A seresta é parte íntima da musicalidade de Baden Powell e aqui, em solo, com um repertório perfeito - do pioneiro Patapio Silva ("Primeiro Amor"), Pixinguinha ("Rosa"), Freire Jr. ("Revendo o Passado"), do hino nacional do gênero - "Chão de Estrelas" (Silvio Caldas / Orestes Barbosa) ou suas parcerias com o mestre Vinícius de Moraes ("Valsa sem Nome", "Velho Amigo", "Canção do Amor Ausente"), Baden é perfeito - salientando também um lado pouco lembrado de Vinícius - que dedilhava o violão e sozinho compôs "Serenatas do Adeus", "Valsa de Euridice" e com Tom fez "O que Tinha de Ser", todas aqui incluídas. Maravilhoso! "Gosto de Brasil" foi um daqueles momentos inspirados de produção, em que três excelentes instrumentistas uniram-se para uma gravação que saiu perfeita: o cearense Nonato Luiz (violão), o mineiro Djalma Corrêa (percussão) e o carioca Luiz Alves (baixo), todos com larga quilometragem profissional (Djalma, inclusive, internacional) desenvolveram uma produção impecável, escolhida por Peter Klann para marcar a sua etiqueta - hoje já com segmentos no Exterior. A escolha do repertório incluiu de princípio uma homenagem a Gonzaga - então ainda vivo - com sua "Suíte Nordestina", costurada por Nonato com imenso bom [???] ("Baião Cigano", "Paraty", "Mangabeira", "Xangô", "Serena", "Choro Acadêmico", "Rubi Grená"), mas incluindo também "Minha Esperança" (Luiz Alves) e encerrando com outro toque nordestino - "Maria Bonita", de domínio público mas que o filme de Lima Barreto, há 40 anos ("O Cangaceiro") internacionalizou. Sobre Túlio Mourão, nada melhor do que repetir as palavras de Maurício Quadrio: "um dos mais espontâneos e criativos entre os mineiros da nova geração, a sua música não é polêmica, revolucionária, nem levanta vôos arriscados na busca de uma originalidade a todo custo. Sob o aspecto de uma tranqüila seqüência de talentosos desenhos melódicos, de cativante sonoridade, e controlado balanço rítmico, exige uma técnica personalíssima, uma rica inventiva na formulação das idéias e na construção das frases, e um discurso coerente, direto e sobretudo embasado em um gênero que se identifica em termos tipicamente brasileiros. A sua maneira de tocar é de envolvente expressividade, clareza cristalina e um "touché" de virtuose".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
4
17/11/1991

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