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Aramis

Compositores-Intérpretes

Um punhado de compositores-intérpretes está na praça, mostrando mais uma vez que, realmente, os criadores assumiram, definitivamente, suas condições de lançadores de suas obras, mesmo não tendo muitas vezes vozes das mais perfeitas. É o caso do paulista Eduardo Gudin, 28 anos, seguro violinista, 18 anos de estrada musical e há 10 anos mais ou menos conhecido, participando de festivais ("Choro do amor vivido", "E lá se vão meus anéis" etc.) e shows ("O importante é que a nossa emoção sobreviva", ao lado de Márcia e Paulo César Pinheiro). Bom compositor e violonista, mas limitado como cantor, Gudin tem feito, entretanto, alguns elepês, nos quais sempre busca compensar suas limitações vocais com a participação de cantoras, como Márcia ou Jane Espírito Santo (ex-3 Moraes). Estreando agora em nova fábrica, com "Coração Marginal" (Continental, setembro/78), Gudin foi buscar em Marília Medalha ("Como Tantos"), MPB-4 ("Águas Passadas") e num grupo vocal formado por 5 vozes, o apoio para poder garantir o bom recado às suas belas músicas, parcerias com gente do melhor nível como Roberto Riberti ("Velho Ateu", "Águas Passadas", "Notícia Popular", "Como Tantos!), Paulo César Pinheiro ("Maria Fernanda de Sá"), Hermínio Bello de Carvalho ("Coração Marginal") e Paulo Vanzolini ("Mente"), entre outros. graças a essa inteligente fórmula - de usar bem os apoios vocais e os excelentes instrumentistas arregimentados - o disco de Gudin se firma como um dos bons lançamentos desta temporada. Em compensação, o carioca Dalmo Castelo, na estrada musical desde 1965 quando apareceu no I FIC ("Quando dois se gostam"), vivência no México e na Venezuela, não tem problemas de voz ou timidez: canta suave, gostoso, com a mais legítima influência da Bossa Nova, mas numa visão própria, autêntica - o que o fez ser aceito no restrito círculo de parceiros do divino Cartola, com quem fez "Covardia" e "Amiga Oculta", duas das faixas deste seu novo LP ("Com que prazer", Chantecler, setembro/78). Segundo disco de Dalmo, confirma os prognósticos que aqui fizemos há quase dois anos, quando de seu primeiro disco: um compositor-intérprete dos mais imaginativos, ótimo harmonizador e bom poeta, com uma obra que merece ser melhor divulgada. Só esperamos que agora Dalmo se anime a deixar os bares de Ipanema e viajar um pouco pelo Brasil, tornando mais conhecidas músicas como "Coisas de um sonhador", "Colóquio", "Rima Vulgar", "Subúrbio", "Virgulino", etc., além das composições anteriores, incluindo parcerias com o mestre Cartola (Angenor de Oliveira), que terça-feira, dia 11, comemorou seu 70º aniversário. Há dois anos o novo disco de Edu Lobo vinha sendo aguardado com ansiedade: após "Limite das Águas", o notável compositor se havia voltado a um trabalho introspectivo, de grande solidez, fugindo dos esquemas comerciais - ele que sempre se manteve como um dos mais conscientes e independentes criadores da MPB a partir dos anos 60. "Camaleão" (Philips, agosto/78) mostra que sem fazer concessões mas também evitando o hermetismo de vanguardas, é possível criar uma obra da maior seriedade/comunicabilidade. Trabalhando com o poeta Antônio Carlos de Brito, o Cacaso - "Lero Lero", "Coração Noturno", "Sanha na Mandiga", "Branca Dias", "Descompassado" - unindo um tema de Villa Lobos ("O Trenzinho do Caipira") a um poema de Ferreira Gullar, homenageando o choro com muita imaginação ("Bate Boca"), recorrendo a uma bela criação instrumental do amigo Fernando Leporace ("Camaleão") e regravando um antigo sucesso ("Memórias de Marta Saré"), Edu Lobo mostra que continua na galeria dos melhores compositores mais vigorosos de nossa música. Ao contrário do título de seu LP, Edu não tem nada de camaleão: sua música não muda de cor e som. Continua excelente. De todos os compositores-intérpretes surgidos no Brasil nos últimos dez anos, nenhum é mais "maldito" em suas proposições do que Walter Franco, 33 anos, que após um início como ator e participação em alguns festivais menores ("Não se queima um sonho", defendida por Vandré; "O Sol de vidro", parceria com Eneida; "Animal sentimental" e "Pátio dos loucos"), seria pivô de grande polêmica, no VII FIC, da TV Globo, em 1972, ao ter o seu experimental "Cabeça" premiado (o que foi utilizado como desculpa para demissão do júri, presidido pela cantora Nara Leão, embora a causa real fosse outra. Mas isto é assunto para outro dia ...) Em janeiro de 75, com "Muito tudo", voltou a ser premiado num festival (3º lugar, Abertura", São Paulo). Os seus dois discos feitos na Continental não venderam mais do que 200 cópias, tão experimentais foram em sua concepção e propostas - e mesmo com algumas músicas gravadas por outros artistas (inclusive Chico Buarque), Walter Franco permanecia praticamente restrito a um pequeno grupo. Por isso é estimulante ver que a CBS, hoje com uma direção artística bem mais aberta, acreditou em Walter e o lança num novo disco ("Respire Fundo", CBS, 133243, setembro/78). Em relação aos discos anteriores, é um salto em termos de comunicação: sem abandonar a linha vanguardista, de novas propostas que sempre acreditou, Franco oferece ao menos agora músicas audíveis com maior facilidade, algumas até com letras suaves sem deixarem de ser poemas modernos, sintéticos, mesmo quase concretos. Formações instrumentais diferentes em cada faixa - apoiando sua voz e violão, presença de gente como Wagner Tiso (arranjos, regência e sopro em "Criaturas"), João Donato (piano em "Os Bichos"), Márcio Montarroyos (pistão em "Até Breve"), Sérgio Baptista (guitarra em "Lindo Blues"), Jacques Morelembaum (cello em "Govinda"), Sivuca (acordeão, em "Os Bichos"), mostram a seriedade do trabalho e as excelentes condições que teve para produzir este seu novo disco. Que seja, esperamos, uma abertura maior para sua carreira até hoje hermética e tão restrita a um grupo de iniciados. Paulo Diniz, 38 anos, pernambucano de Pesqueira, 14 anos de Rio de Janeiro, tem dividido sua carreira entre as atividades de locutor e cantor-compositor. Infelizmente, desde "I Want To Go Back To Bahia" e "Ponha um arco-íris em sua moringa", ambas em parceria com Odibar, não conseguiu emplacar mais nenhum sucesso. E não tem sido por falta de apoio de sua gravadora, a Odeon, pela qual faz agora o seu quarto LP: "Marca Ferrada", Diniz continua a trabalhar com Odibar, parceiro em duas faixas - "Pingos de Amor" e "Um Chope Para Distrair", embora esteja, salutarmente, recorrendo a outros letristas, como Juhareiz Correya e Deto Costa. Continua também a tentar transformar em sucessos de MPB adaptações de poemas famosos: desta vez trabalhou sobre "Essa Nega Fulô", de Jorge Lima, e "Bela Bela", poema de Ferreira Gullar. Entretanto - e infelizmente - não foi ainda desta vez que Paulo Diniz encontrou seu melhor momento de criação. Seu "É Marca Ferrada" fica entre a categoria de regular e bom. Quando poderia ser ótimo. Mais um jovem compositor-intérprete ganha chance de fazer um trabalho individual, promovido em escala nacional: "Nossa Imaginação" (Som Livre). A imaginação de Don Beto não passa muito do esquema discotheque com uma coleção de músicas de endereço certo, para uma faixa menos exigente. De qualquer forma, deve cumprir sua função dentro da estrutura de marketing prevista pela gravadora. Já Carlos Dafé, em seu segundo LP ("Venha Matar Saudades", WEA, agosto/78), mostra uma obra mais consistente - embora mercadologicamente também feita para um consumo definido. Infelizmente, uma série de problemas pessoais, inclusive dois acidentes, impediram que Dafé esteja podendo acompanhar melhor este lançamento, colaborando para maior divulgação de faixas como "Acorda Que eu Quero Ver", "Nossa Festa de Luz", "Criança Maravilha", "Pra Não Padecer", todas de sua autoria - com diversos parceiros.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Música
33
15/10/1978

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