Elgson, a arquitetura com a música familiar
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 13 de julho de 1988
Dentro de duas semanas, o arquiteto Elgson Ribeiro Gomes e sua esposa, dona Maria, embarcam para os Estado Unidos. Desta vez, Elgson, 66 anos, um dos mais requisitados arquitetos de Curitiba e considerado um dos cinco maiores especialistas em arquitetura de hospitais, não vai participar de eventos profissionais - que sempre marcaram suas (muitas) viagens ao exterior. Como pai-coruja, vai visitar seus filhos, Péricles e Elson, que estão fazendo cursos de doutorado em universidades americanas.
Mais do que os 100 prédios que projetou e viu incorporarem-se à paisagem urbana de Curitiba e uma vida profissional e pessoalmente admirável, Elgson, catarinense de Florianópolis, mas engenheiro da turma de 1948 da Universidade Federal do Paraná, tem um grande orgulho: seus quatro filhos formaram-se em arquitetura. Mais do que isto: os quatro desde criança, sempre herdaram outra de suas paixões - o amor pela música - e estudando diferentes instrumentos, formaram - a exemplo dos filhos do médico Hélio Brandão - um quarteto familiar, de alto nível artístico, que já fez dezenas de concertos. "E que só não teve uma carreira mais regular porque, naturalmente, encargos de cada um, profissionais e familiares, impedem uma continuidade musical, como nos tempos em que todos eram solteiros", diz Elgson.
Só Elgson [Elson], 33 anos, que agora faz doutorado em Políticas Públicas, em Washington, reduziu suas atividades musicais - "toca apenas em casa, para os amigos". Os três outros continuam atuantes, inclusive integram, por concurso, a Orquestra Sinfônica do Paraná: Maria Cláudia no violino, Maria Luisa na viola e Péricles no violoncelo. Atualmente, Péricles está licenciado da Sinfônica do Paraná, mas nem por isto deixou de tocar: entre as aulas de mestrado em Computação Gráfica, que freqüenta na Universidade de Michigam, integra duas orquestras daquela cidade. No início, apenas como colaborador, hoje já contratado e aumentando assim sua bolsa com os dólares que o seu talento como violoncelista - ex-integrante da Orquestra de Câmara de Blumenau e que por 2 anos integrou a Sinfônica da Bahia - o credencia. Aliás, com exceção de Elgson [Elson], Maria Cláudia, Maria Luisa e, especialmente, Péricles, tem suas crises de identidade profissional, pois se a arquitetura os fascina - inclusive pela integração com o trabalho do pai, a música também lhes tem feito apelos muitas vezes difíceis de conciliar com outros compromissos.
Há 8 anos, quando Maria Luisa e Péricles ainda cursavam arquitetura, tiveram a primeira grande alegria de Elgson, desenvolveram em apenas duas semanas o projeto de reurbanização do vale do Anhangabaú, em São Paulo, que concorrendo com equipes de profissionais dos famosos escritórios brasileiros - inclusive a de Jorge Wilhelm (hoje secretário de Meio Ambiente, em São Paulo que foi o primeiro classificado), obtiveram o honroso terceiro lugar.
Para Elgson Ribeiro Gomes foi uma vitória particularmente gratificante. Isto porque aqui registramos na época, mas que merece ser recordado - logo após ter se formado em engenharia civil, há 40 anos, pela Universidade do Paraná, foi tentar a vida em São Paulo. Vindo de uma escola que era vista com preconceitos em São Paulo - estão num "boom" de crescimento imobiliário, mas que valorizava especialmente os profissionais formados pela Politécnica e Mackenzie - encontrou dificuldades de trabalho. Foi graças a um emigrante alemão, o arquiteto Adolph France Heep (1900-1978), que chegou ao Brasil com 54 anos mas fez obras notáveis ( como o Convento das Perdizes, recentemente tombado), e que agora começam a ser devidamente valorizados, que Elgson pode ter melhores chances de trabalho. Levou 10 anos para poder concluir o curso de arquitetura pela Mackenzie - devido a intervalos provocados por compromissos profissionais - e entre os 30 colegas de sua turma estavam Luis Forte Neto e José Maria Gandolfi que, quatro anos depois, viriam para Curitiba, integrando o núcleo de arquitetos-professores do nascente curso de arquitetura da Universidade Federal do Paraná.
Sobre a origem deste curso - que desde o início se destacaria pelo alto nível de seus professores e consolidaria a arquitetura paranaense (até então tendo apenas exemplos isolados de profissionais: Villanova Artigas, Carlos Barontini, Ernesto Guimarães Máximo, Rubens Meister e alguns poucos outros) - Elgson Gomes recordou um fato interessante, durante o depoimento gravado na semana passada para o projeto "Memória Histórica do Paraná".
Devido a sua rígida formação de engenheiro civil - classe que, por décadas via preconceituosamente o surgimento dos profissionais da arquitetura - o reitor Flavio Suplicy de Lacerda resistia a criação do curso de arquitetura. Foi só quando o governo do estado se dispôs a criar uma escola estadual de arquitetura e convocou o engenheiro e professor Euro Brandão para organizá-la, foi que Suplicy - "um homem que sempre teve uma grande visão" - decidiu superar suas idiocrassias e evitar que a Universidade Federal perdesse este curso. Que acabou saindo logo, com profissionais vindos de vários estados - os paulistas Forte Neto e os irmãos Gandolfi; o gaúcho Leo Grossmann, o mineiro Marcos Prado - que juntando-se a muitos profissionais capazes do Paraná (mas a maioria apenas engenheiros) possibilitaram que, desde a metade dos anos 60, arquitetos do Paraná começassem a vencer concursos nacionais (e até internacionais), projetando-se nesta área.
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O primeiro projeto que Elgson desenvolveu em Curitiba foi o do prédio para o IPASE, na Rua Cândido Lopes, mas como Rubens Meister, um arquiteto-engenheiro já consagrado na época (1953) também disputava o projeto, para conseguir a vitória, Elgson usou uma estratagema: trabalhou em equipe com Adolph France Heep. "Infelizmente, o projeto original foi adulterado, pois o então presidente do IPASE, Soza Naves, insistiu em transformar o térreo em área para lojas", lamenta Elgson.
Em junho de 1959, Elgson se transferiria para Curitiba. Fez então o projeto do MAPI, em Caiobá - muito discutido por ter sido o primeiro grande prédio na orla paranaense, até então virgem de qualquer edifício. Elgson justifica o projeto "dentro de uma filosofia da época" - embora admita que, posteriormente, a corrida imobiliária trouxe prejuízos inconsumáveis a nossa estreita costa azul. Nos últimos 29 anos, o nome de Elgson Ribeiro Gomes esteve presente nas placas de construções de uma centena de prédios, especialmente na década de 60, quando as três maiores construtoras da cidade (Farid Surugi, Thá, Guttierrez, Paula & Munhoz) e, para o incorporador Nelson Torres Galvão, que de um modesto vendedor transformar-se-ia numa das alavancas do mercado imobiliário do Paraná.
Modesto, com a satisfação de ver seus projetos espalhados por toda a cidade, Elgson tem especial carinho por dois projetos recentes: o campus da futura Universidade Sudoeste - Centro Pastoral Educacional e Assistencial Dom Carlos. [...?]
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