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Aramis

Gramado, um festival consagrado

Um filme de extrema simplicidade, mas brasileirissímo em sua linguagem, foi o grande vencedor do XIII Festival do Cinema Brasileiro de Gramado : "Marvada Carne" ganhou dez "Kikitos"- nome do original troféu em madeira, criado pela artesã Elisabeth Rosenfeld, para simbolizar a premiação. Embora alguns filmes tivessem conteúdo politico como "Patriamada" de Tizuka Yamazaki ( em cartaz no São João, dentro de uma semana ), os curtas "Frei Tito", de Marlene França, o "Eclipse",de Antônio Moreira e "Cone Sul", de João Guilherme Reis da Silva - os filmes em competição foram bastante diversificados em temática. A queda na produção cinematografica brasileira refletiu-se também no Festival : alguns filmes ( "Pedro Mico", "Um filme 100% Brasileiro" ) não ficaram prontos a tempo, outros produtores embora tendo filmes de nível para competir preferiram não participar ( como Hector Balenco, que vai levar o seu " Beijo da Mulher Aranha" a Cannes, ou Bruno Barreto, temendo que "Além da Paixão"sofresse críticas desfavoráveis, já que decepcionou na pré-estréia, hors-concurs, no FestRio ). Dos oito filmes inscritos, a comissão de seleção optou por seis dos quais alguns de nivel muito fraco ( "Ela e os Homens" do falecido Schubert Magalhães; "Espelho da Carne", porno Chic com Denis Carvalho, Maria Silvia e Joanna Fomm ) e a " Noite "m de Gilberto Loureiro, baseado em uma pouco conhecida novela de Érico Verissimo, rodado em Porto Alegra em principios do ano passado. No Final, a comissão julgadora - presidida por ligia Fagundes Telles e integrada pelos críticos Hiron Goidanich ( Goida ) e Sergio Augusto; deputada e atriz Bete Mendes; roteirista Leopoldo Serran, diretor João Batista de Andrade; fotográfo Lauro Escorel e o ator Carlos Vereza, acabou fazendo a seguinte premiação : MELHOR FILME - "Marvada Carne", melhor diretor: André klotzel ("Marvada Carne") melhor roteiro: Klotzel ( "Marvada Carne"; melhor ator: Paulo Cesar Pereio ( "Noite"), melhor atriz: Fernanda Torres ( "Marvada Carne"); melhor ator coadjuvante: Otávio Augusto ("Noite"), melhor atriz coadjuvante : Cristina Aché ( "Noite", " Estrela Nua" ); fotografia: Pedro Farkas ( "Marvada Carne"); música adaptada: Eid Ribeiro ( "Ela e os Homens"), música original - Rogério Duprat ( "Marvada Carne") ; cenografia: Adrian Cooper ( "Marvada Carne" ); edição: Alian Fresnot ( " Marvada Carne" ) e som - Romeu Quinto / Lúcio Marcos de Oliveira ( "Patriamada" ). " Marvada Carne" recebeu ainda o troféu de melhor filme do júri popular. E três prêmios especiais foram concedidos: a Carla Camuratti, atriz, de "Estrada Nua"; Antônio Penido, fotografo, de " Noite " e Dionisio Azevedo, ator em "Marvada Carne". CURTAS METRAGENS - De mais de 20 inscritos, a comissão julgadora selecionou 18 bons curtas-metragens - 9 dos quais produções do Rio Grande do Sul,um júri especial formado por Moisés Waltman, Milton Barragan, José Carlos Avelar, Tuio Becker, Maria do Socorro e Carlos Gerbase - escolheu os melhores curtas nacionais e gaúchos, Que foram os seguintes: NACIONAIS: MONTAGEM - Ainda Marques ( "Principe do Fogo"); fotografia - José Rodolfo Eliezer ( "Folguedos nos Firmamento" ); direção - Artur Omar ( "O Som"); melhor filme júri popular - "O Bom Pastor" de Roberto Carvalho, melhor filme - "A Longa Viagem", de Francisco Botelho Junior. Menção especial : "Frei Tito", de Marlene França e "Eclipse", de Antônio Moreira. Já os curtas gaúchos premiados foram os seguintes : melhor filme: dividido entre "Os Cobras" de Otto Guerra Neto, José Maia e Lancast Motta ( dos personagens em quadrinhos de luis Fernando Veríssimo ) e "Cone Sul", de João Guilherme Silva; "Madame Cartô", valeu os prêmios de direção ( Nelson Nadotti ), atriz ( Claúdia Meneghetti ), ator ( Pedro Santos ) e montgem ( "Vera Freire") . "Colombina Forever " sátira de David Quintana, ganhou os prêmios de cenografia ( Sergio Silva ), roteiro, e fotógrafo de dois outros curtas concorrentes "Carrossel"e "Ano Novo Vida Nova"). Se não fosse a presença de uma belissima atriz colombiana Amparo Grisales, se poderia dizer que o festival do cinema Brasileiro nesta sua 13º edição, não teve nenhum toque de sensualidade.Embora discretamente vestida todas as vezes - e foram muitas - que o apresentador Clóvis Duarte, da RBS a chamou de Cine Embaixador, amparo não deixou de atender ao apelo do fotógrafo João Onofre, da "Zero Hora " e passou em reduzido biquini, no paradisiaco cenário da cascata o Parque do Caracol, em coloridas fotos que, na edição de domingo enfeitaram a revista "ZH". Ao contrário de anos anteriores - e de tanto outros festivais - o de Gramaso teve um comportamento sóbrio - sem chegar, entretanto à sissudez. Se em 1979, o ator Paulo Cesar Pereio e o diretor Ipojuca Pontes - concorrendo então com "A Volta do Filho Pródigo" - se emgalfilharam em briga no bar do hotel Serra Azzul, numa cena digna de ser filmada por John Ford, nos últimos anos o aspecto de escândalos mundanos deixou de acontecer neste Festival que é hoje, o principal evento da cinematografia brasileira. Apesar dos bons restaurantes de Gramados funcionarem até de madrugada, haver três recepções oficiais ( ao lado de muitas particulares ) e os bate-papos no cofee shop do Hotel Serra Azul ou no "Bar das Estrelas"do Hotel Serrano se prolongarem até o amanhecer, muitos dos participantes preferem descansar mais cedo para, a partir das 10 horas, estarem em forma para os debates e reuniões que aconteceram. Especialmente os cineastas e jornalistas convocados para uma presença profissional nos debates optaram, assim, por um trabalho profissional - do que apenas aproveitar as delicias de bela cidade serrana - um dos centros turisticos do Sul do Brasil. A FESTA DE CADA UM - São muitos os aspectos de um festival de cinema e desde que o pioneirismo de um grupo e gaúchos criou em Gramado uma primeira mostra, ainda não competitiva, no inicio da década de 70, o Festival só tem crescido. Das duas primeiras edições, organizadas pelo respeitado crítico Paulo Fontoura Gastal, decano da crítica cinematográfica gaúcha, com apoio do então prefeito ( e hoje deputado estadual ) Horst Ernest Volk e de seu então secretário de turismo Romeu Dutra ( hoje presidente da empresa estadual de turismo do Rio Grande do Sul ), a 13º edição encerrada no último sábado,30,o Festival cresceu muito. Adquiriu o respeito de toda a classe cinematografica, seus prêmios são cada vez mais valorizados e agora parte para a internacionalização, tendo realizado neste ano uma primeira mostra do cinema latino-americano, que a partir de 1986,já será competitiva. O empresário Enoir Antonio Zorzanello, vice-prefeito e presidente da Comissão executiva, garante que o Festival não teme a concorrência de outros eventos que começaram a serem promovidos a partir do ano passado - o FestRio, o Festival de Caxambu, em Minas Gerais e, agora, os anunciados festivais de cinema brasileiro no Copacabana Palace, Rio e o de Fortaleza, em agosto próximo. Ao contrário, "O estimulo será maior para fazer com que os cineastas, artistas, técnicos etc. participem de todos os festivais - e elejam os mais significativos". O de Brasilia, que também já passou da décima edição, foi prejudicado durante os anos mais duros da ditadura militar, pela censura a filmes, pressões etc. - tendo inclusive sofrido uma interrupção por 3 anos. Já Gramado tem a seu favor a continuidade e o fato de, ao contrário de Brasilia, ser realizado numa cidade paradisiaca, na escala ideal que permite o encontro de todas as pessoas - sem necessidade de uso de veiculo par atingir os diferentes pontos em que ocorrem eventos. Este ano foram gastos Cr$ 750, milhões no Festival - Cr$ 61milhões somente em premiação - mas não houve problemas orçamentários. "Nada que abale a nossa estrutura previamente dimensionada para suportar o custo deste festival importante do cinema brasileiro" diz Enoir Zorzanell, acrescentando. - Veja só nesta semana, os noticiários de jornais, rádios e televisão, dividiriam-se entre dois temas : a doença de Tancredo e o festival de Gramado. Só isso já justifica o investimento. Além da verba oficial do municipio, e da Embrafilmes, o fstival tem um sólido apoio do governo do Estado- só em premiações, o governador Jair Soares ofereceu Cr$ 25 milhões - e grandes empresas, como a Kodak ( que instituiu o prêmio Edgar Brasil,ao melhor diretor lde fotografia e lançou agora um concurso de roteiros para longa e curta metragem ), a Vasp - Transportadora oficial, Hotéis Serrano e Serra Azul, Embratur, Caixa Econômica Federal, Assmbléia Legislativa do Rio Grande do Sul, Embratur e Graumont ( que instalou lâmpadas xenon, para melhorar a projeção dos filmes no Cine Embaixador ). Luciano Peccin, secretário de turismo de Gramado, analisa os resultados do Festival com muita visão: - "Alem do movimento que gera naturalmente durante a realização, a promoção faz com que Gramado ganhe um destaque nacional, do qual a hotelaria,os restaurantes e o comércio se beneficiam durante todo o ano. É o tipo de evento que rende frutos em várias frentes: artistica, cultural, social, e econômica". Distante 120 Km de Porto Alegre, com apenas 18 mil habitantes - 9 mil na zona rural - Gramado tem sua principal fonte de renda no turismo. São 28 grandes hotéis, 35 restaurantes, 34 lojas de artesanatos ,23 malharias, quatro grandes fabricas dechocolate caseiro - e mais 30 indústria de móveis. Assim, há uma produção que tem os milhares de visitantes, em diferentes épocas do ano, seu grande mercado consumidor. E como se não bastasse a beleza da região - e um natural atrativo especialmente para casais em lua de mel ou familias em férias - há uma preocupação de promover grandes eventos - dos mais importantes entre os 500 que constam do calendário oficial do Rio Grande do Sul.Desde 1958 acontece a Festa das Hortências - flor-simbolo d municipio - que é seguida, dos festivais do cinema brasileiro, em março de cada ao; do filme publicitário, do festival internacional de música em julho; e da feira nacional do artesanato, em fins de setembro, reunindo artesões nacionais e estrangeiros. A BOA ORGANIZAÇÃO - Estruturar um festival que reúne a cada ano maior número de participante é um desafio.Por isso, a comissão executiva trabalha prticamente o ano todo, cuidando de solucionar problemas e procurando dar à mostra cada vez mais uma dimensão culrural e econômica. Presidida pelo vice-prefeito Zorzanello, a comissão organizadora deste ano teve a participação do secretário de turismo Luciano Peccin do empresário Romeu Tadeu Orsi, jornalista Hélio Nascimento ( crítico do " Jornal do Comérico" de Porto Alegre ), Ivo Stigger ( coordenador dos painés de debates ), e Gilberto Michaelsen, aém do radialista Claro Gilberto, da RBS; Flávio Carneio, diretor da CRTUR, Romeu Grimaldi,programador e cinemas de arte e Dario Correia, de Embrafilmes.Mas a este grupo de dez executivos, soman-se centenas de outras pessoas que muitos voluntáriamente, dão o melhor de si para que tudo saia a contento. E o profissionalismo das assessorias são admiráveis, como da jornalista Arlete Andreazza, na área de imprensa, que apoiada por Tania Sfoggia, garante toda uma infra-estrutura para os jornalistas poderem desenvolver seu trabalho com tranquilidade, enquanto a secretária executiva da comissão, Leila Kaiser, amparada em Vicky Simon ( recepção ) Tadeu Orsi ( Transportes ) consegue resolver, sempre com humor a atenção,os mais inesperados problemas. AS MULTIPLAS OPÇÕES - O Festival de Gramado vem, a cada ano, aumentando as opções para o público e os seus participantes - cineastas, atores, atrizes, produtores, jornalistas etc. Assim, enquanto no Hotel no Hotel Serrano há o Festival do Super 8 - bitola que no Rio Grande do Sul teve uma grande produção a partir do anos 70, inclusive com longas- metragens ( "Inverno", " Meu Primo ", " Deu Pra TI " etc. ), que lançaram cineastas e intérpretes hoje no cinema profissional, no salão de convenções do Hotel Serra Azul acontecem os dabates. Este ano, houve três painéis para analisar o futuro do cinema brasileiro na televisão -com a participação de executivos das redes nacionais de TV - enquanto à tarde, em concorridas reuniões, diretores,técnicos e intérpretes dos filmes exibidos na noite anterior discutiam suas obras. O Cine Embaixador - mantido pela comunidade gramadense ( tem 12 sócios principais, mas não tem finalidades lucrativas ), há muito que já é insuficiente para abrigar todo o público interessado - e assim há sessões matinais dos filmes exibidos na noite anterior.Para 1986, o vice -prefeito Enoir Zorzanello espera que o centro de convenções do Hotel Serrano do qual é um dos diretores - esteja concluído. Diz Enoir: - " Entretanto a grande reinvindicação de Gramado é de um Centro Internacional de convenções, com auditório para mais de 1500 pessoas, cinemas e salas paralelas - enfim à altura do que este municipio oferece em termos turisticos ". MOSTRA LATINO AMERICANA - De ano para ano, aumenta o interesse latino-americano pelo Festival. Jornalistas do Uruguai e Argentina,bem como Carlos Santamaria; diretor da Cinemateca de Montevidéu, vem - muitas vezes por suas própria conta - acompanhar o Festival. Júlio Cravera, 55 anos, há 30 fazendo crítica em "El Dia",de Montevidéu, pela segunda vez acompanhou o festival. E voltou entusiasmado: - " É uma mostra pujante e sobretudo, possibilidades de grandes encontros profissionais ". Este ano, a Mostras do Cinema Latino-Americano, organizada por Cosme Alves Neto, diretor da Cinemateca do MAM-RJ e um dos diretores do FestRIO, de comum acordo com Hélio Nascimento, da comissão executiva, foi bastante positiva por possibilitar o conhecimento de filmes recentes, de boa qualidade, mas que, infelizmente permanecem desconhecidos no Brasil, pela falta de intercânbios com outros países do continente. Do México, veio " Maria de Mi Corazon ", de Jaime Harmosillo, que abriu a mostra. O filme mais aplaudido veio de Cuba: a comédia "Los Pajaros Tirandole De La Escopeta ", de Rolando Diaz, tão comunicativo que o astuto Luis Carlos Barreto - entrando agora na área da distribuição já o adquiriu para lançamento comercial, junto com outro digestivo filme cubano, "Se Permuta ", exibido no FestRio, em novembro do ano passado. Um excelente thrilling policial representou Argentina: " Los Últimos Dias de La Victima ", de Adolfo Aristarain. Os cinemas da Colômbia e Venezuela, totalmente ignorados no Brasil, toram representados por " Canaguaro " ( baseado em uma revolução dos anos 40 ) e "Carmen, La Que Contaba de 16 anos ", mais uma versão livre da obra de Merimée - que em 1983 / 84 teve múltiplas refilmagens ( Zeffirelli, Rossi, Goddard, Peter Brook, entre outro ). O Brasil foi represendo pelo emocionante documentário "O Evangelho Segundo Teotônio ", que Vlademir de Carvalho fez entre 1982 / 84, documentando os últimos dias do senador Teotônio Vilela. Este filme, aliás, deveria ter concorrido O Festival, mas como foi exibido por dois dias em Porto Alegre, teve sua inscrição cancelada - já que o festival admite apenas filmes inéditos nos circuitos do Rio Grande do Sul. Exibidos à tarde, os filmes latinos- americanos tiveram excelente repercussão - iniciando inclusive um processo de comercialização Exibidores da Colômbia, Venezuela, Uruguai e Argentina se interessaram em adquirir os direitos de " Los Pajaros Trandole de La Escopeta " e enquanto a adida cultural da Embaixada da Argentina, prometia que " Los Últimos Dias de La Victima " terá exibições em outras cidades que se interessem. Carlos Eduardo Francisco Jorge, programador do Cine Ouro Verde e diretor da Casa da Cultura de Londrina, há 10 anos acompanhando o Festival, foi o primeiro a garantir que o filme argentino seja exibido naquela cidade, Francisco Alves dos Santos,programador de cinema da Fundação Cultural ( Groff / Ritz / Cinemateca ), também veterano frequentador dos festivais de Gramado, acertou durante o evento várias promoções especiais para o seu circuito. Gramado tem um festival válido em todos os aspectos. Mas só pelo encontro das pessoas,do diálogo entre diferentes profissionais e o clima de amizade, já justificaria sua realização. E a continuidade, mérito maior para que se qualquer evento cultural se fortaleça e adquira uma justa promoção. LEGENDA FOTO 1 - Os premiados no palco de cine Embaixador. LEGENDA FOTO 2 - O grande final: Fernanda Torres, melhor atriz, entre outras premiadas, na festa e encerramento do XIII Festival do Cinema Brasileiro de Gramado. LEGENDA FOTO 3 - Cristina Achê ( melhor coadjuvante ) e Aldine Muller em " Noite ", rodado em Porto Alegre - mas decepcionante no Festival. LEGENDA FOTO 4 - Carla Camuratti - ao lado do cineasta Icaro Martins, co-diretor de " Estrela Nua ", durante o debate sobre o filme - na qual aparece deliciosamente nua. LEGENDA FOTO 5 - Helena Menezes e Joana Fomm - ladeando o diretor Antônio Carlos Fontoura, de "Espelho da Carne": um pornô-chic que ficou sem nenhuma prêmiação.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
07/04/1985
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