Maysa, as ilhas & a canção
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 08 de fevereiro de 1977
Da última longa entrevista de Maysa (Figueira Monjardim, (1936-1977), gravada nos estúdios da rádio Ouro Verde, a 1o de dezembro último, para o nosso programa "Domingo Sem Futebol", três declarações sinceras, estão na revista "Fatos & Fotos/Gente", desde sábado nas bancas de todo o Brasil. Sobre a solidão, disse Maysa: "Olha, eu me sinto muito só, até mesmo no plano profissional, no contexto da atual música brasileira. As ilhas estão muito longe.
E como as pessoas não se aproximam de mim, eu também não me aproximo delas. Parece que cada um vive a sua solidão na sua ilha. Outro dia, o Tom Jobim perguntou-me como estou.
Como ia a minha turma e minhas músicas. Foi quando eu me preparava para gravar um Especial para a TV Educativa. Então, eu respondi: "Minha cuca está legal mas eu gostaria de que a minha ilha, esta solidão em que estou vivendo, ficasse mais perto da sua para que a gente pudesse se transar um pouco. O pessoal daquela época, dos anos 50, um período rico de criação musical no Brasil, de certa forma está afastado. O Luizinho Eça é da mesma opinião. Aliás, o Luizinho pra mim ainda é um elo (eu vou escutá-lo todas as noites lá no Chiko's).
Ele sente a mesma coisa. O clima é de cada um na sua, com medo, e isso eu não posso entender. Mas, não tenho que reclamar, não é? Eu, pelo menos, tive a sorte de viver aquela fase de 1957 a 1962, quando todo mundo era uma coisa só. Hoje em dia é como se fosse um outro povo, uma outra cultura, uma outra dimensão. E uma selva aí. Dos meus 20 anos de profissão, a lição que ficou, realmente, é de que é uma pena que todo mundo não tenha tido a oportunidade compulsiva de viver, conviver, absorver, uma incrível força criativa que parece ter envolvido as pessoas, o meio artístico, até 62, por ai".
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Maysa pretendia dedicar-se às artes plásticas, trabalhando principalmente em madeira. Aos 40 anos, liberta de qualquer compromisso (o filho, Jaime, havia casado no ano passado), ela dizia: "Agora, tenho uma liberdade incrível, voltei a guiar meu carro e tenho andado aí pelo Brasil, com as minhas fitinhas lá em casa... e lá vou eu. Não fico em hotel, durmo dentro do carro mesmo. Quando chego numa cidade, procuro uma casa cheia de mocidade que esteja curtindo uma música um tanto quanto regional e curto junto. Vou continuar isto não sei por quanto tempo. Tenho vontade de percorrer o Brasil em trailer, conhecer cada pedacinho, cada recanto lindo. Mesmo vivendo todas as situações, todas as conseqüências do que plantei, agora eu quero colher. Vou juntar tudo e viver. Não consigo cantar para ganhar dinheiro, somente. Eu preciso estar numa boa para cantar".
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Maysa vinha compondo ultimamente e pensava em gravar um disco por sua conta, para, depois, entregar para uma gravadora editá-lo. Já tinha escolhido até o maestro, Eduardo Souza Melo, nome ainda desconhecido, autor de "Férias de Amor", letra do jornalista Tite de Lemos, que chegou a gravar em fita. Das suas trinta e poucas músicas gravadas, a sua predileta era o "Tema de Simone", que compôs para a trilha sonora da telenovela "O Cafona", onde aparecia como uma personagem (Simone), muito parecido com ela própria. A música saiu em compacto simples, pela Phillips e a gravação teve pouca divulgação e venda. Se alguém a possuí, telefone. Precisamos para ilustrar um programa.
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