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Município gasta Cr$ 5 milhões para discutir o que é a ética

Apesar da repercussão que o oportuno e corajoso pronunciamento do professor Alvino Moser, mestre-adjunto do Departamento de Filosofia da Universidade Federal do Paraná provocou nos meios universitários, após a divulgação de seu texto no "Almanaque" ("O Estado do Paraná", 26/03/91), o curso "Ética", que sob os auspícios da Secretaria Municipal de Cultura, inicia no próximo dia 8, deve merecer ainda outros questionamentos. A professora Lúcia Camargo, secretária da Cultura do município, se recusa a comentar os argumentos do professor Moser, "para não baixar o nível da discussão" (sic), embora admita que o reconhecimento desta promoção (paga com recursos municipais), por parte da Universidade Federal do Paraná, não passou pelo Departamento de Filosofia - tendo sido considerado como "curso de extensão universitária" (com direito a certificado mediante 80% de freqüência dos inscritos) através de sua própria intervenção - como professora do setor de Comunicação Social - junto a Pró-Reitoria de Extensão Universitária. O professor Moser - cuja competência não nos cabe aqui discutir, estranhou, a exemplo de centenas de outros curitibanos, que o município vá gastar Cr$ 4.200.000,00 para trazer 26 intelectuais do Eixo Rio-São Paulo para, durante 45 dias, falarem sobre temas ligados a ética, sem que qualquer professor universitário do Paraná tenha merecido a menor consideração para sequer opinar a respeito desta dispendiosa promoção. De princípio, isto significa uma declaração oficial por parte do órgão municipal de cultura de que inexistem no Paraná intelectuais capazes de ao menos opinarem a respeito de um curso extremamente elitista - e cuja realização foi, inclusive, recusada no Rio de Janeiro, restringindo-se apenas a São Paulo - onde teve início na segunda-feira com conferência de Marilene Chauí, coincidentemente secretária (petista) de cultura da administração Erundina. xxx O elitismo que cerca este novo curso organizado pelo filósofo Adauto Novaes, 52 anos, ficou claro na própria cobertura que os jornais televisivos deram a abertura do evento, na noite de segunda-feira, quando mesmo participantes do curso em São Paulo nem sabiam explicar o que seja "ética" e sua importância - enquanto um dos professores do curso, entrevistado pela Rede Manchete, também pouco esclareceu. Independente, entretanto, da oportunidade, importância e méritos deste curso, é a forma com que o mesmo acontece, ocupando um espaço desaconselhável com o Teatro Paiol ("não encontramos outros auditório disponível para os 45 dias que necessitávamos", explica a professora Lúcia), conforme observou a jornalista Adélia Maria Lopes. Segundo a secretária Lúcia Camargo, a iniciativa de patrocinar este curso foi do próprio prefeito Jaime Lerner, que, entusiasmado com o público que, anteriormente, afluiu nos cursos organizados pelo mesmo Adauto Novaes ("O Olhar", 1988 e "Desejo", 1989), realizados no Sesc da Esquina, se comprometeu em que o município traria a Curitiba a sua próxima promoção. Só que os cursos anteriormente organizados por Adauto, eram de iniciativa da Funarte (que hoje inexiste) e patrocinados pelo Sesc que, desta vez, não quis investir na promoção. Com isto, as secretarias municipais de cultura de São Paulo e Curitiba se dispuseram a gastar Cr$ 10 milhões para subsidiar um curso destinado a uma elite de interessados. Em Curitiba, caso sejam ultrapassadas as 250 inscrições (capacidade máxima do Paiol), a idéia da secretária Lúcia Camargo é "transmitir as aulas por sistemas de alto-falantes, em outras dependências do Paiol, em que se acotovelariam os interessados em ouvir assuntos etéreos como "Tragédia e Destino", "O Index, o Fogo e a Questão da Liberdade", "O Sujeito e a Norma", "Dilemas da Moral Iluminista", "A Moral dos Fortes", etc., que constam da extensa programação que iniciando no dia 8, com Marilena Chauí falando sobre "O Público, o Privado e o Déspota", só se encerra no dia 23 de maio, quando Francisco Fernandez Buey, professor da Universidade de Barcelona, Espanha, estará abordando "A Ética na Guerra". Com inscrições a Cr$ 5 mil, será interessante acompanhar para verificar quantos resistirão até o final...
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
20
03/04/1991

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