Na hora da retração, aproveite e compre os bons LPs clássicos
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 01 de abril de 1990
Conseqüência direta do Plano Collor, com o desaquecimento da economia, as gravadoras congelaram seus projetos imediatos e estão reduzindo - ao menos neste trimestre - os lançamentos. Mesmo na produção de álbuns de custos reduzidos - com matrizes importadas e que até em suas capas usam os fotolitos do Exterior - a ordem é economizar. Com isto, o mercado se reduz e edições de clássicos, jazz e, especialmente, de música popular brasileira (estas exigindo maiores investimentos, já que se acrescem os custos de estúdio) - são reduzidas ao máximo.
As lojas, por sua vez, considerando que o disco sempre foi tido como item supérfluo, passam a fazer liquidações e reforçar o balcão de ofertas - o que faz um CD cair até a NCz$ 400,00 (quando antes o custo mínimo era NCz$ 1.200,00), como, desde a semana passada, o astuto Virgílio Savarim está fazendo em suas lojas. Para quem pode dispor ainda de alguns cruzados, está na hora de aproveitar a oportunidade, inclusive porque excelentes lançamentos - que antes estavam com preços na estratosfera da ganância dos segmentos industriais-comerciais - caem agora para preços mais reais. A questão porém é: quem se dispõe a gastar - mesmo que com boas ofertas - em discos (como em livros) neste momento de apertar os cintos?
Por exemplo, alguns lançamentos clássicos de excelente nível, estão agora a preços mais razoáveis - não só de pequenas etiquetas, como também das multi (Polygram, CBS, EMI/Odeon, BMG/Barclay, etc.).
Etiqueta totalmente brasileira, criada pelo organizado e competente Mário de Aratanha, a Kuarup lançou ainda no ano passado um dos melhores discos com o pianista Antônio Guedes Barbosa (João Pessoa, 09/12/1943), interpretando as 14 valsas para piano de Chopin, em gravação feita no Steinway da capela da Columbia University, em Nova Iorque, há 19 anos, que em rematização da Master Estudios, sai agora com excelente qualidade. Discípulo de Arnaldo Estrela, tendo estreado aos 13 anos como solista da Sinfônica Brasileira, Antônio Guedes Barbosa tem acumulado premiações ao longo de sua carreira. Há 10 anos que se baseou nos Estados Unidos, onde estreou, no Carnegie Hall, fazendo uma série de quatro recitais dedicados a obra de Frederic Chopin (1810-1849), que obtiveram tantos elogios que logo seria convidado a fazer uma série de gravações, das quais faz parte o álbum que Mário de Aratanha edita agora no Brasil.
Fazem parte das gravações feitas pelo selo Connoisseur Society e que valeram elogios e premiações da Stereo Review. Embora incluindo outros autores em seu repertório - e viajando pelas principais capitais do mundo para aplaudidos concertos - Guedes Barbosa é considerado especialmente um dos maiores intérpretes de Chopin. Nesta gravação, estão as 14 valsas que o compositor polonês criou entre 1829/1843, as quais, como acentua o crítico Antônio Hernandez, nas notas de contracapa, "transcendem o raio de ação dos seus modelos vienenses, identificáveis formalmente na variedade das seções, dispostas em seqüências contrastantes. Prevalecem, porém, o refinamento do trabalho de composição, a riqueza da invenção melódica e a força varonil do lirismo que respiram, condições compatíveis com o tipo de virtuosidade superficial das valsas de bravura e de concerto dos românticos anacrônicos".
Consideradas ao lado das "Polonaises", como o trabalho mais popular do Chopin, as 14 valsas são refinadas, elegantes e românticas. Diz Guedes Barbosa que "a música brasileira deve muito a Chopin. Basta ouvir as modinhas, ou ainda os choros, principalmente os de Nazareth, que tem o espírito e o bom gosto de Chopin. E o Rio Antigo era a cidade dos pianos". Diz ainda o pianista:
- "Horiziwtz aconselhava que se tocasse Chopin como Mozart, e Mozart como Chopin. Sem levar isto ao pé da letra, ele acredita que tem no seu toque a qualidade da improvisação necessária ao intérprete chopiniano".
Uma boa notícia que o produtor Mário de Aratanha traz: outras gravações da série americana de Antônio Guedes Barbosa também deverão sair nos próximos meses. "A Kuarup Klassics era um velho projeto nosso que agora virou realidade. Enquanto as grandes gravadoras lançam quase só os grandes nomes internacionais da música clássica, o selo Kuarup só faz música brasileira".
Entre os discos prometidos para este ano - se a situação econômica permitir - estão Turíbio Santos tocando a Chaconne e as Suítes de Bach; as versões originais de "Eine Kleine Nachtmusik" e dos "Divertimentos", de Mozart, pelo Quarteto Bessler-Reis; as suítes para violoncelo solo de Bach, com Antônio Menezes; os quartetos de compositores de ópera (Verdi, Gounoud, Carlos Gomes e Puccini) pelos Bessler-Reis.
A boa imagem - Enquanto Mário de Aratanha se preocupa com os clássicos nacionais, outro bravo batalhador pela fonografia de qualidade, Jonas Silva - da Imagem, continua a proporcionar que edições de etiquetas do Leste da Europa sejam conhecidas no Brasil. Assim, tendo a representação da estatal Hungaroton, da Hungria, a Imagem editou um álbum duplo com a Schola Hungarica, sob regência de Dobszay Laslo e Szendrel Janka, trazendo a representação de São Nicolau, com os textos e interpretação de músicos e coralistas húngaros - naturalmente inéditos no Brasil - mas do mais alto nível.
Na mesma linha - e para o mesmo público - temos o álbum simples com a "Paixão Segundo São João", com o coral da Capela Savaria, sob regência de Pal Németh e os destaques dos solistas Martins Klletmann, Gábor Kalar, Jozsef Moldvay, Maria Zadof, Istvan Gati, interpretando em alemão esta notável obra de Haendel.
LEGENDA FOTO - Antônio Guedes Barbosa: um belo álbum com as 14 valsas de Chopin em edição da Kuarup.
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