Música Brasileira está em alta em Nova Iorque
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 11 de fevereiro de 1989
O I Festival de Música Instrumental Brasileira no Town Hall, em Nova Iorque (dias 10 e 11 de março), com patrocínio do Bamerindus, representa uma espécie de consagração de uma bem sucedida invasão sonora que a nossa MPB está fazendo nos EUA - via Big Apple/Los Angeles. Hoje já é praticamente impossível relacionar o número de brasileiros que vivem nos EUA, trabalhando na música, pois ao lado dos que galgaram uma fama internacional - de Airto Moreira e Tânia Maria - há centenas de outros, especialmente instrumentistas, que com maior ou menor conforto, conseguem sobreviver - muitas vezes independente de estarem com seus sonhados green cards (documento de permanência nos Estados Unidos, para poderem trabalhar) em mãos.
Se Celso Locker ainda não conseguiu - apesar da insistência - um espaço maior, outro paranaense, Celso Alberti, se deu melhor - e depois de um período em Los Angeles, de dificuldades, teve da parte de Flora Purim e Airto Moreira o grande empurrão ao ser admitido, temporariamente, no grupo do casal (com eles, veio ao Brasil e chegou a se apresentar em Curitiba em agosto de 1987). Agora, Alberti já tem melhores condições de sobrevivência, inclusive integrando um grupo instrumental ("One Man's Land") - o que o fez merecer ser focalizado na série "Bicho do Paraná".
Kátia Canton, em reportagem enviada de Nova Iorque, na semana passada, para o "Jornal da Tarde" ("Nova Iorque: a MPB em alta", 4/2/89) salientou que o boom de nossa música naquela cidade (e, por conseqüência, nos EUA), não é um fenômeno isolado. "De um lado, existem nos EUA, hoje, uma atração generalizada pelo sons afro-latinos e uma necessidade de investimentos em novos mercados da música estrangeira. De outro, a crise econômica e a falta de perspectivas no Brasil estão fazendo com que muitos artistas sejam atraídos para as terras do Tio Sam."
Assim, Sérgio Mendes, Naná Vasconcelos (de quem está saindo um novo álbum nos EUA), Tânia Maria, Airto e Flor Purim e, especialmente, Antônio Carlos Jobim, são apenas alguns dos artistas que trocaram o Brasil pelos EUA.
A entrada para valer de O Som da Gente - criado há dez anos, por Walter Santos e Teresa Souza, donos do Nosso Estúdio (considerado um dos três melhores estúdios do Brasil), nos EUA - depois de já estar exportando seu excelente catálogo para a Europa e mesmo alguns países da Ásia - não poderia acontecer em melhor momento. David Byrne, líder do grupo Talking Heads, diretor do (excelente) filme "True Stories" ("Histórias Reais, exibido há dois anos em Curitiba), paralelamente à conclusão de um documentário feito na Bahia ("Orixás"), dedicou seu último LP ("Beleza Tropical") a músicas de Caetano, Gil e outros. Em 1987, o Manhattan Transfers gravou o disco "Brazil"; Sarah Vaughan lançou "Brasil Romance"; o flautista Herbie Mann - um dos primeiros instrumentistas de jazz a se voltar à Bossa Nova no início dos anos 60 - dedicou seu álbum "Jasi Bras" (edição no Brasil da CBS) a autores brasileiros. Dezenas de discos de (ou com) músicas(os) brasileiras(os) têm saído nos EUA e aqui permanecem inéditos: desde os magníficos instrumentais dos violonistas Carlos Barbosa Lima e irmãos Assad até trabalhos do vanguardista Arto Lindsay (que viveu muito tempo no Nordeste) com seu grupo, The Ambitious Lovers, que lançaram o LP "Greed", com Caetano Veloso.
Um jornalista especializado em música, Robert Myers, criou uma produtora - a Ijexá - especializada em projetos artísticos ligados ao Brasil e está realizando até um filme sobre o Carnaval.
Nas lojas de discos das principais cidades americanas - especialmente na cadeia de Sam Goody, que fascina os colecionadores brasileiros pela diversificação - é cada vez maior o número de prateleiras dedicadas à música brasileira - classificada desde as seções "exotic souds" até "jazz de vanguarda".
Agora, com a chegada do Som da Gente - nos dois shows no Town Hall (três dias depois, haverá outro com Gal Costa, Dory Caymmi e Tom Jobim) o boom verde-amarelo terá ainda maior marketing promocional e artístico. Aquilo que há
26 anos provocava um irritado livro do sociólogo e crítico J. Ramos Tinhorão, criticando a entrada da Bossa Nova nos EUA - "Agora o Samba Vai?", pode até ganhar a sua reutilização. Mas sem o sarcástico ponto de interrogação final.
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