Login do usuário

Aramis

Nos jogos da qualidade está faltando público

Na sexta-feira, 23, a estréia do Trio D'Alma teve que ser adiada por falta de público. No sábado, até às 21 horas, não havia nenhum espectador. Só o extremo profissionalismo de André, Rui e Ulisses Rocha, fez que apresentassem um recital para menos de 30 espectadores. Quem perdeu não foram eles. O prejuízo financeiro não é o mais importante. Quem perdeu foram as centenas de curitibanos que, teoricamente, apreciam ou se dedicam ao violão e deixaram de ouvir/ver o único trio de violões do País e, até prova em contrário, o primeiro nesta formação em todo o mundo. Afinal, a experiência que John McLaughlin, Paco de Lucia e Al Mateo estão fazendo agora foi, sem dúvida, inspirada no D'Alma. Mais do que o simples registro de uma lamentável ausência de público, o desinteresse pela temporada do D'Alma faz com que os animadores culturais voltem a se preocupar com um problema: a necessidade de motivação de faixas específicas do público para espetáculos de qualidade. Não se trata de culpar a divulgação, criticar os veículos - normalmente abertos a veiculação gratuita de shows, concertos, etc., mas sim de se criar um novo estratagema, novos canais capazes de evitar que três virtuoses do violão, com uma técnica admirável, em sua única temporada na cidade, fiquem desapercebidos, ignorados. Formado há pouco mais de dois anos, o Trio D'Alma tem feito poucas apresentações fora de São Paulo. O primeiro lp do grupo saiu pelo selo Clam, do Centro Livre de Aprendizagem Musical, pertencente ao Zimbo Trio, onde o grupo se formou e na qual Ulisses é ainda professor. Agora, contratados da etiqueta Som da Gente, criado pela admirável Tereza Souza, terão um novo disco lançado nas próximas semanas, cujas músicas pretendiam antecipar na temporada de Curitiba. Frente [à] ausência de público, dificilmente outros grupos instrumentais paulistas virão a Curitiba. O que é lamentável, pois o Medusa, formado por Amilson Godoy (teclados), Chico Medori (bateria/percussão), Claudio Bertrami (baixo) e Heraldo do Monte (guitarra/bandolim), primeiro a ter um disco lançado pelo Som da Gente, pretendia também aqui trazer a sua sonoridade nova, a exemplo de Hector Stocker), 45 anos, guitarrista e compositor, que, como aqui registramos já por várias vezes, residiu em Curitiba quando integrava o quinteto de Breno Sauer, contratado na boate Marrocos. xxx Há necessidade dos agentes culturais e, especialmente, dos dirigentes de escolas, cursos, academias e mesmo professores autônomos de instrumento, agilizarem uma forma de que audições com instrumentistas jovens e talentosos, propondo uma nova linguagem, não fiquem fora de nossos espaços culturais - que tendem a serem dominados apenas por espetáculos de promoção massificada, alta voltagem de poluição sonora como as apresentações de Pepeu Gomes que, naturalmente, conseguiu lotar o Ginásio do Círculo Militar do Paraná. Os intérpretes locais - compositores, músicos e cantores, também se ressentem de uma presença maior em seus espetáculos, em que pese o trabalho pessoal que desenvolvem para divulgar os seus shows. As Nymphas, único grupo vocal do Paraná, organizadíssimas, conseguiram levar um razoável público ao grande auditório do Guaíra onde, mesmo prejudicadas pelo som (que tornava impossível entender as belas letras das músicas inéditas, de compositores paranaenses) mostraram dois espetáculos de qualidade. No final, entre dezenas de agradecimentos - parecendo os filmes da Atlântida, do anos 50, na seqüência final - destacaram O ESTADO que, sempre, deu a maior força ao trabalho das Nymphas e de outros grupos. xxx Até ontem a tarde, pouco antes do recital da Cametara Antiqua, com um Festival Tellerman, o flautista e maestro Norton Morozowicz, primeiro regente convidado para este grupo da Fundação Cultural, mostrava-se preocupado com uma possível ausência de um público mais numeroso no concerto que se realizou no Guaíra. Apesar de curitibano, conhecendo o nosso público e, sem favor algum, o instrumentista da terra que até agora conseguiu, na área erudita, a maior projeção, Norton preocupou-se com o aspecto "público" para o concerto que planejou, cuidadosamente, em homenagem ao 3o centenário de nascimento de Georg Philipp Tellerman (1681-1767), uma efeméride, aliás, que está passando quase desapercebida no Brasil. Falando em música, importante um registro especial: já está sendo distribuído nacionalmente, com boa promoção, o lp contendo a íntegra do bailado "Jogo de Danças", que Edu Lobo compôs especialmente para o Ballet Guaíra, que tendo esta peça como ponto alto de sua temporada de 1981, apresenta-se junto aos públicos das principais capitais brasileiras há uma semana. Um detalhe que até agora não foi registrado, com o destaque merecido: deve-se, de certa forma, ao jornalista Arakem Távora, a produção deste bailado que auxilia o Balé Guaíra a ter uma projeção nacional. Em princípios do ano passado, ao encontrar Edu Lobo numa revendedora Volkswagem, Araken ouviu dele o desejo de que gostaria de compor uma obra para balé. Na semana seguinte, no Palácio Iguaçu, Távora falou ao seu amigo, o governador Ney Braga, do projeto de Edu e Ney, amigo de Fernando Lobo (que foi por ele nomeado para o Conselho Nacional de Direito Autoral, em sua primeira fase) e admirador de Edu, não teve dúvidas: telefonou a Marcelo Marchioro, diretor de arte e programação do Guaíra, e transmitiu a idéia. Reuniões com Edu, inúmeras viagens ao Rio, tempos & contratempos, afinal foram vencidos e o balé estreou em princípios de outubro. Para que a música não se perdesse - como tem acontecido com tantas trilhas sonoras, a Sigla/Som Livre, associou-se e edita agora o lp em sua série "Documento", dirigida por Marilda Pedroso e onde, anteriormente, saíram álbuns documentais da poesia de Ferreira Gullar e um "guia de Salvador na voz de Jorge Amado". Com produção executiva de Cesar Fonseca, ex-diretor do Museu da Imagem e do Som - e que anteriormente já havia produzido os lps com a trilha de "O Contestado" e o documento da visita do Papa João Paulo II a Curitiba (ainda inédito), "Jogos de Dança" apresenta um alto nível. Os melhores instrumentistas foram arregimentados para as gravações dos seis jogos, a qualidade técnica é de primeira e a música de Edu Lobo se inclui entre os grandes momentos da criação instrumental. Naum Alves de Souza, responsável pelos cenários e guarda-roupa do balé, fez também a capa e programação visual de "Jogos de Dança", um dos mais belos lançamentos da Sigla nesta ano, e que se transforma em uma boa promoção nacional do governo Ney Braga.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
6
27/10/1981

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br