O Nilo e suas noitadas com o bom choro e samba
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 12 de maio de 1990
Quem estava no "Nilo Samba & Choro" há duas semanas, numa noite de segunda-feira, teve uma chance única de aplaudir um dos melhores instrumentistas brasileiros mostrar todo o seu talento: Sivuca (Severino Dias de Oliveira), no vigor de seus 60 anos - a serem completados no próximo dia 26 - não resistiu ao clima de informalidade daquela casa e deu mais do que uma canja: acabou fazendo um verdadeiro show - que só não foi acompanhado por Sebastião Tapajós (violão) e Maurício Einhorn (harmônica de boca), porque haviam deixado os instrumentos no hotel. Gilson Peranzetta mesmo que quisesse não poderia dar sua participação: na casa não há piano.
Mas Sivuca valeu como one-man-show, mostrando toda sua dimensão de instrumentista e compositor, tocando com os músicos da casa, sendo acompanhado vocalmente por Leninha e Rosângela, afinadíssimas, e integrando-se ao grupo que ali atua de segunda a segunda.
Não foi a primeira - "e por certo não será a última", diz, com entusiasmo, Nilo Santos, 44 anos, violonista e dono da casa, em relação à inesperada atração que recebeu. Afinal, na noite curitibana, mesmo tendo crescido o mercado de trabalho para os músicos profissionais, o Nilo Samba & Choro (Rua Mateus Leme, 65) é a única casa que tem uma característica especial: só apresenta música brasileira. E com um detalhe, que justifica que se dedique ao bom Nilo um espaço especial: empregando o máximo de profissionais.
- "Já houve época em que cheguei a ter 19, entre músicos e cantores, trabalhando comigo. Agora, com os tempos bicudos da era pós-Collor, fui obrigado a reduzir este número".
Uma redução em termos! Além do grupo fixo de instrumentistas, há cantores e convidados especiais que, a cada noite, somam uma dezena de presenças. Mesmo cobrando um couvert artístico (Cr$ 120,00 de segunda a quinta-feira; Cr$ 150,00 de sexta a domingo), Nilo, 8 anos após ter inaugurado a casa - aberta em 2 de maio de 1982 - diz:
- "Tenho trabalhado para pagar as despesas. Não deu sequer para comprar um carro ou alugar uma casa".
Com a esposa Leninha - simpática e excelente cantora, que com ele divide o trabalho de todas as noites, e mais três de seus cinco filhos - Flávio, 8; Eduardo, 6 e o caçula inesperado, Hudson, 11 meses - o casal vive no sobrado da própria casa noturna.
- "Ao menos ficou mais prático", comenta, com bom humor, Heleninha, que entre um set e outro de apresentação, sobe para ver "como estão as crianças".
Os dois filhos mais velhos de Nilo, de seu primeiro casamento - já estão também ensaiando passos artísticos: Marcos, 21 anos, é exímio no cavaquinho e Jussara, 20, boa cantora, participando inclusive eventualmente de seu grupo.
Reunindo músicos ecléticos como César (acordeon), João (violão), Adelson (violão e cavaquinho), os percussionistas Cuca e Carlos, mais Nilo, o grupo da casa não deixa a peteca sonora cair. Acompanha tanto as crooners Leninha e Rosângela (Santos), como eventuais aparições de vozes, profissionais ou não que, estimuladas pelos aplausos acabam se arriscando em repertórios ecléticos - como a francesa Nina ou a veterana Janete Martins, que mesmo hoje contratadas de outras casas, gastam suas noites de folga para curtir o ambiente - bem mais simpático do que nos estabelecimentos em que atuam. Cuca (Pedro Hergio de Araújo), 43 anos, gaúcho de Butiá, 12 anos de Curitiba, sintetiza o astral:
- "Aqui, todos se integram musicalmente em poucos minutos. E até quem é desafinado acaba aprendendo..."
Capelista do dia 13 de setembro de 1946, bem que Nilo Santos tentou resistir ao germe musical. Seus irmãos mais velhos, seresteiros e boêmios, tiveram problemas profissionais e familiares que ele quis evitar. Assim, tentou outras profissões e procurou se manter longe da noite.
- "Mas qual o que", comenta. "Meu primeiro casamento acabou indo para o brejo e em 1967, já morando em Curitiba, comecei a atuar profissionalmente".
Sua grande escola foi o regional do saudoso Sanguito [?] do Rosário, com o qual trabalhou por muito tempo. Depois veio o grupo "Amantes do Samba", do qual faziam parte Adãozinho no cavaquinho, Rubens no surdo e os filhos Márcio e Jussara. Há oito anos abriu sua própria casa que, com sucesso, o estimulou a tentar manter até uma filial. Não deu certo, "pois isto tem que ser cuidado com muito carinho, pessoalmente". Assim, hoje se dedica a cuidar de sua casa musical, na qual um veterano como o violinista Mosquitinho faz sempre surpresas sonoras.
- "E no qual o melhor fica por conta das revelações inesperadas" - diz, referindo-se ao sucesso que a tv-woman Laís Mann faz cada vez que por lá aparece, ao lado de seu marido, o batuqueiro Gilberto Camargo.
- "Os dois são tão bons que até poderiam se profissionalizar na noite", garante Nilo com sua experiência de quase 30 anos de noite musical.
LEGENDA FOTO 1 - Sivuca entre as cantoras Rosângela e Leninha: uma canja classe "A" no Nilo Samba & Choro.
LEGENDA FOTO 2 - Laís Mann, tv-woman e radialista, mostra que tem samba no pé.
LEGENDA FOTO 3 - Um conjunto fiel à melhor MPB na casa do Nilo: Cuca, César, João, Carlos, Adelson e o líder do grupo.
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