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MPMP, para valorizar os músicos do Paraná

A morte do pianista Braulio Faria Prado, na última sexta-feira, 13, fez com que a exemplo do que aconteceu há 14 anos, quando do falecimento do compositor e instrumentista Lápis (Palmilor Rodrigues ferreira, 1943-1978) muitos fizessem a mesma pergunta: por que é que nossos músicos só são lembrados quando morrem? Apesar de ter mais de 40 (de seus 49) anos de vida artística - considerando que aos 5 anos, [incompletos], já era atração no Clube Mirim M-5, na Rádio Guairacá, Braulio não deixou nenhum disco gravado. Há isto sim, fitas esparsas com momentos de suas diversas fases de pianista e, como cantor - ele que na infância tinha uma belíssima voz - só ficou com uma faixa: justamente "Vestido Branco", a mais conhecida das composições de Lápis, que num estilo cool, quase como se fosse um Chet Baker (de início de carreira vocal) curitibano, incluído no lp "Optimum In Habbeas Coppus", que o empresário Sérgio Bittencourt Martins patrocinou no final de 1990, com produção artística de Arcy Neves. Chega até ser irônico! Além de ter sido o único disco de música popular, de bom nível, feito no Paraná nestes últimos dois anos, esta produção independente, que Serginho praticamente distribui gratuitamente aos clientes de seu estabelecimento (que cerrou suas portas no último dia 26 de janeiro) torna-se já um documento ao menos de duas pessoas muito queridas na noite curitibana: além da faixa com Braulio, outra foi com Arthur Tramujas neto, o promotor público, intelectual nativista e cantor nas horas vagas (crooner dos Megatons em sua adolescência) que também tragicamente morreu há poucas semanas. Ali, Tramujas gravou, com todo seu entusiasmo, um clássico dos irmãos Gerhwin - "Summertime", da ópera "Porgy & Bess". xxx No sábado à noite, num dos poucos endereços na noite curitibana em termos de boa música - o Café Aluara - um pequeno grupo de músicos e este repórter discutiram a necessidade de ser viabilizado um projeto imediato: o Movimento de Prestigiamento ao Músico Paranaense. Uma idéia simples, sem qualquer outro objetivo que não seja a de valorizar os nossos músicos - nisto incluindo tanto instrumentistas, como [cantores] e compositores. Razões não faltam para se mostrar a necessidade de se tentar, de uma forma organizada e ampla criar um movimento amplo, que unindo todas as frentes - comunicação, estabelecimentos noturnos, entidades oficiais ligadas a cultura etc. - e que possa fazer com que os nossos músicos tenham maior prestigiamento e promoção. Os números, quando levantados, são impressionantes. Apesar de milhares de Associados oficialmente à OMB - secção do Paraná, poucos são os músicos no Paraná que tem boas condições de trabalho. Raros os instrumentistas - e especialmente intérpretes - que puderam registrar em discos o seu trabalho. Se comparado com o Rio Grande do Sul - apenas como exemplo - a diferença é brutal: lá, mais de 10 mil títulos compõe uma discografia gaúcha e só em Porto Alegre mais de 100 estabelecimentos noturnos mantém músicos e cantores com pagamentos dignos. A imprensa dá grande cobertura a esta legião de profissionais, e dezenas deles alcançam promoção nacional. No Paraná, o panorama tem sido desolador. Apesar do talento e esforço de muitos que tentaram fazer seus discos - quase todos em sofridas produções independentes - a repercussão fora dos limites municipais foi mínima. Ótimos músicos que trabalham há anos profissionalmente nunca tiveram até hoje uma única referência na imprensa e mesmo as casas em que eles se apresentam jamais procuram capitalizar o fato de que alí se executa música ao vivo. O que custaria, por exemplo, que cada estabelecimento que tem músicos contratados promove-los ao menos com seus nomes e fotos numa vitrine na entrada? Em qualquer cidade civilizada da Europa e Estados Unidos, boites, etc; procuram utilizar o nome de seus contratados - sejam já consagrados ou mesmo ainda jovens artistas. Ao menos três jovens empresários da noite, que neste início de 1992 acreditam ainda ser possível valorizar bons músicos, estão dispostos a, de princípio, se integrarem a este movimento: Luís Felipe Infante, do recém inaugurado "Pier 35" - espaço cultural em Santa Felicidade, no qual se apresentam o pianista Jefferson Sabbag e o baixista José Boldrine e, Hamilton Marques e Rafaelli Canoro, do Aluanda - Café Concerto. De forma prática, eles já estão abrindo espaços a bons profissionais. No Aluara, um dos mais queridos músicos da cidade, Gersinho Bertines, organizou uma promoção inédita, em que a cada noite apresenta uma cantora convidada (*), com excelentes revelações. O Pier 35 - anexo a um dos melhores restaurantes da cidade - Luís Felipe e sua esposa Roberta, querem abrigar eventos musicais, "sempre valorizando os nossos talentos", com instrumentistas e cantores convidados. Nas duas casas, dentro de alguns dias, vitrines estarão mostrando imagens dos contratados - para uma informação prévia aos fregueses. Não é muito, mas já é o início de um movimento que poderá crescer em pouco tempo, com apoio de outros endereços e fazer com que os nossos artistas, a maioria anônimos figurantes de nossa vida musical - e só reconhecidos pelos fregueses mais habituais da noite - ganham, dentro da proporção de seu trabalho e da boa música que mostram, um espaço que, por certo, os veículos de divulgação não negarão. Um primeiro passo para escaladas maiores - como shows em teatros e gravações, o que será discutido futuramente. A semente está lançada. Vamos torcer para que possa florescer! xxx Nota (*) Ao lado do Nilo Samba Choro (Rua Mateus Leme), o Aluara vem dando oportunidade a muitos instrumentistas e, especialmente cantoras, que se alternam todas as noites. Vozes afinadas de belas cantoras como Rogéria, Rita, Lais Mann (que se apresenta às quarta-feiras), cantor Marcelo e o violonista Tartine ali dão exemplo da melhor musicalidade - lembrando os bons tempos do Bebedouro, no Largo da Ordem. Uma freqüência em escalada comprova que há gente interessada em aplaudir a nossa melhor MPB.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
20
18/03/1992

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