Noite Vazia (V-Final) - Nem com o Carnaval, nossos músicos têm mais empregos
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 31 de janeiro de 1992
A redução nos bailes carnavalescos neste ano é mais uma comprovação da crise econômica e que se reflete violentamente contra os músicos. Conforme algumas colunas sociais registram, duas das mais tradicionais sociedades da cidade - Thalia e União Juventus - decidiram fundir seus bailes, como fórmula de reduzir as despesas.
A Sociedade Beneficente protetora dos Operários, o mais famoso e popular clube do Paraná, que durante décadas teve nos bailes carnavalescos - especialmente o dos gays, na noite de segunda-feira - o maior faturamento, este ano substitui aquelas festas que atraíam milhares de curitibanos (e turistas) por familiares bailes da Terceira Idade e o funcionamento de uma lambateria ("Porto Seguro").
A Sra. Francisca Adamo, diretora regional do Escritório Central de Direitos Autorais, até agora não tem idéia de quantos bailes de carnaval serão realizados no Paraná este ano. "Lamentavelmente, vemos uma redução cada vez maior", reconhece seu marido e colaborador, o simpático Álvaro Adamo, comentando o fato de que "muitos clubes estão buscando opções musicais alternativas" - como o 3 Marias Clube de Campo, que já contratou a orquestra Os Montanari.
Uma orquestra com o mínimo de 10 profissionais, para trabalhar nas 4 noites, fazendo 5 bailes (incluindo os infantis) não custa hoje menos de Cr$ 10 milhões, valor que a maioria dos clubes afirma não suportar. O resultado é que as opções têm sido pequenos conjuntos, muito semi-amadorísticos, inclusive vindos de outras cidades - mesmo do Interior. Com isto, reduziu-se ainda mais um mercado já reduzido para os profissionais da música, cada vez mais a buscar formas alternativas de sobrevivência.
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Embora não existam dados exatos, como diz o Sr. Álvaro Adamo - mesmo o Ecad buscando atualizar-se mensalmente - não passam de 600 endereços, em todo o Paraná, os que registram música ao vivo.
- "Isto, entretanto, não dignifica que hajam 600 locais que ofereçam empregos regulares - ou mesmo sazonais - aos instrumentistas" - acrescenta Osval Dias de Siqueira, 61 anos, pistonista, durante mais de 30 anos maestro de uma das mais conceituadas orquestras do Paraná, ex-presidente da Ordem dos Músicos do Brasil. Preocupado com o mercado cada vez mais estreito - este ano, pela primeira vez, sua orquestra não estará trabalhando no Carnaval, conforme aqui registramos na quarta-feira. Osval acrescenta:
- "Há poucos locais, seja em Curitiba ou Interior, em que trabalham mais de 2 ou 3 músicos, ao menos por 4 dias por semana. Ao contrário, na maioria das casas que declaram possuir música ao vivo, exibem-se modestos - e quase sempre anônimos - violonistas ou tecladistas".
Para o Ecad, são computados para fins de cobrança de direito autoral - uma questão polêmica, que há anos é motivo de pelejas jurídicas e muitas reclamações - todo evento que utilize música - seja mecânica (gravadas) ou executada. Assim, até a cerimônia de um casamento ou aniversário, desde que tenha músico (mesmo não sendo profissional ou remunerado) atuando, o promotor obriga-se ao recolhimento de taxas que variam de acordo com o local, espaço, número de pessoas presentes e, naturalmente repertório apresentado. "Uma promoção musical numa rua ou praça é música ao vivo, explica Álvaro Adamo, dentro daquilo que a lei prevê".
Assim, uma das alegações mais comuns feitas pelos donos de casas noturnas para justificar a suspensão até de som gravado - músicos contratados nem pensar! - "são as elevadas taxas cobradas pelo Ecad".
Dezenas - até centenas - de comerciantes prefere correr o risco e não pagar as taxas devidas, mesmo podendo ter suas casas fechadas.
- "Infelizmente, nos últimos meses de funcionamento do Crystal, não tinha condições de pagar a taxa mensal" - reconhece Eduardo de Cardoso, 33 anos, dono do bar que também cerrou suas portas há meses - e no qual havia boa música instrumental ao vivo.
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