Poucos produtos da indústria cultural/entretenimento têm uma mídia tão grande como o vídeo. Espaços generosos se abrem na imprensa, revistas e jornais especializados são lançados e mesmo na televisão - em si, concorrente ao vídeo - também há programas que abrigam as novidades do setor, como o "Cinemania" que Wilson Cunha apresenta na "Manchete". Assim, repetir o óbvio, falando de quase meia centena (ou mais) de vídeos que as distribuidoras colocam mensalmente nas locadoras nos parece repetitivo. Preferimos, então, destacar, em rápidos registros, os lançamentos - especialmente de filmes já conhecidos de maior importância cultural, os quais, infelizmente, são relegados pelo grande público. A ignorância do consumidor habitual de vídeo e a falta de qualquer visão dos donos das locadoras - para as quais tanto faz vender qualidade quanto mediocridade, pois o que importa é o lucro imediato - faz com que pouquíssimas locadoras ofereçam os melhores títulos. É claro que quando há um consultor atento e bem informado como Aníbal Marques, da Master Vídeo, ou do jovem Francisco Pernalta, da Disc-Tape, trabalhos de primeira categoria são adquiridos, ao menos em uma unidade, pelas locadoras mais profissionais. Entretanto, como reconhece outro consultor, Roberto Belotti, a necessidade de fazer com que o comerciante que loca filmes atenda a uma demanda primária, impede que títulos significativos sejam incluídos nas locadoras de segunda e terceira categoria que aumenta cada vez mais na cidade. Por exemplo, quais as locadoras que dispõem de "MacBeth - Reinado de Sangue", 1948, de Orson Welles, lançado pela Hebert Richers? Mesmo com o poderio da UIP, poucas locadoras se disporão a adquirir o vídeo com "Profissão: Repórter" (The Passenger), 1975, de Michelangelo Antonioni, mestre do cinema italiano, com uma obra personalíssima e que há quatro anos já teve o seu "A Noite" (La Notte, 1960) lançado pela Globo Vídeo. Simultaneamente à edição de "Profissão: Repórter", a Sagres lança "Deserto Vermelho" (Deserto Rosso), 1963, realizado logo após "O Eclipse", e que foi seu primeiro filme em cores. Último filme da série estrelada pela sua ex-esposa, Mônica Vitti, "Deserto Rosso" - que, no Brasil se chamou "o Dilema de uma Vida" (agora sai como "Deserto Vermelho"), ainda tinha a linha hermética, de personagens angustiados e sofridos que marcou a carreira do Antonioni entre 1950/67. Só a partir de "Depois Daquele Beijo" (Blow Up), rodado na swinging London do final da década de 60, Antonioni se libertaria de uma temática existencialista, que fez sua fama mas que o tornou um cineasta para um público elitizado. "Deserto Vermelho" está sendo lançado pela Sagres - no único título aliás de nível artístico que esta distribuidora que, há dois anos, iniciou uma proposta de privilegiar o cinema-arte, inclusive voltando-se à melhor produção brasileira, editando filmes políticos como "Terra para Rose", de Tetê Moraes e "Que Bom Te Ver Viva", de Luiza Murat. Mas, a exemplo de outras distribuidoras, também a sagres teve que se voltar a lançamentos tipo "Saga de um Mercenário", "Espiões do Espaço" e "ouro Maldito" - além de até incluir a apresentadora Angélica para introduzir as estórias de "Pumuckel" - como forma de garantir o mínimo de vendas. xxx Em termos de qualidade, a Transvídeo está lançando um dos melhores filmes do ano: "O Cozinheiro, O Ladrão, Sua Mulher e o Amante", de Peter Greenway. Melhor Filme - Tucano de Ouro - e Melhor Atriz - Tucano de Prata para Helen Mirren no FestRio/Fortaleza, mesmo perdendo muito em sua redução para a telinha é uma obra-prima do diretor de "Afogando em Números" e "O Sonho do Arquiteto" (ambos também disponíveis em vídeo). De uma imensa beleza estética, mesmo com um tema chocante, "The Cook..." é o maior exemplo do novo cinema inglês, criativo, vigoroso e que vem conquistando espaços internacionais.

Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:

Veiculo: Estado do Paraná

Caderno ou Suplemento: Almanaque

Coluna ou Seção: Nenhum

Página: 3

Data: 11/11/1990

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