Os separatistas do Iguaçu e o país com que sonha Tramujas
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 10 de novembro de 1990
Ao contrário de Ildo Marx, outro gaúcho separatista, Sérgio Alves de Oliveira, defendia há três anos a criação de uma República Sulina - "Independência do Sul" (Martins Livreiro Editor, 80 páginas, 1988) na qual incluía também o Paraná. Marx preferiu ficar apenas com parte de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, ignorando totalmente o Paraná - apesar da forte presença migratória gaúcha nas regiões Oeste e Sudoeste.
Possivelmente não faltariam(rão) adeptos das teses separatistas destes gaúchos, se o assunto ganhar fórum de seriedade - capaz até de preocupar autoridades. Dos quase 1500 Centros de Tradição Gaúcha que hoje existem em vários Estados, 150 já estão no Paraná.
- "Estes são os oficialmente registrados, pois há muitos que nem se tem conhecimento oficial" - diz César Setti, 26 anos, paranaense de Pato Branco mas filho de pais gaúchos, editor de "Galpão de Estância" (O Estado do Paraná, edições dominicais; Tribuna do Paraná, nas quintas-feiras), produtor e apresentador do programa "Galpão da Estância", na Rádio Clube Paranaense (domingos, 20/22h30). Apaixonadíssimo pelo nativismo, acompanhando os principais eventos que acontecem no Sul (e organizando alguns deles no Paraná), Setti diz que o boom gauchesco no Paraná aconteceu nos últimos anos.
- "A primeira entidade regionalista foi o Centro Gaúcho do Paraná, fundado em 1954, mas só em 1963, o pioneiro Tobias do Vale organizaria o I Rodeio, em São Luís do Purunã, promovido pelo CTG Vila Velha. De repente, nestes últimos anos, começaram a pipocar CTGs em todos os municípios".
Junto com os CTGs cresceu a chamada "indústria nativista" - churrascarias, bailões, "bolichos", lojas que comercializam produtos regionais, discos, artistas gaúchos em temporadas locais etc. Hoje, a tendência de "texanizar" os rodeios - com doma de bois - preocupa Setti.
- Isto já foge das tradições e nada tem em comum com a cultura regional do Sul. É o colonialismo americano, via country style, que chega pelo Centro-Oeste e Interior de São Paulo - reclama.
Professora universitária, neta de um dos homens-símbolos da intelectualidade dos anos 20 - o poeta e filósofo Dario Velloso, Roselys Velloso Roderjan passou os últimos sete anos estudando a questão da presença dos paranaenses na colonização do Sul e como resultado escreveu a tese "Formação de Comunidades Paranaenses e Sua Expansão para o Sul", defendida há um ano como dissertação de mestrado na área de História junto a Universidade Federal de Santa Catarina. Revisando agora os originais para a edição em livro - com o título "Raízes e Pioneiros do Planalto Médio do Rio Grande do Sul" (Edição da Universidade de Passo Fundo/Prefeitura de Carazinho, aproximadamente 200 páginas, lançamento previsto para 1991), Roselys tem sólidas opiniões em torno da presença dos paranaenses na criação de várias comunidades gaúchas - especialmente Cruz Alta, Passo Fundo, Carazinho etc. - e também sobre o expansionismo dos pampas. Só que, discreta e para evitar polêmicas, mostra-se reservada em relação aos movimentos tradicionalistas, "que crescem não só no Paraná, mas também em outros Estados".
Separatismo não é novidade e, com maior ou menor voltagem, lideranças das regiões Oeste de Santa Catarina e Paraná, volta e meia, ameaçam com movimentos para a criação de um novo Estado. A idéia do Iguaçu - aproveitando parte dos dois Estados - que é remanescente do período em que existia o Território Federal do Iguaçu, se tornou ponto de campanha de muitos políticos. Ainda agora, o advogado Edi Siliprandi, de Cascavel, conseguiu uma vaga na Câmara Federal pela legenda do PDT, fazendo 17.315 votos e tendo como principal bandeira lutar para a criação do Estado do Iguaçu.
Só que embora com algum apoio na região, Siliprandi - de quem pouco se ouviu falar até agora no Sul - vai enfrentar muita oposição às suas propostas divisionistas. César Setti, percorrendo o Estado regularmente junto ao circuito nativista, admite, entretanto, que a questão deva ser tratada "sem paixões, com argumentos razoáveis". Já o promotor público Arthur Tramujas Neto, 40 anos a serem completados no próximo dia 27 de dezembro, é contrário à idéia. Apaixonado por nativismo, autor do polêmico ensaio "Passe a Cuia, Tchê!" (Edições Leite Quente/Fundação Cultural de Curitiba, 30 páginas, 1989), Tramujas dedicou seus últimos 10 anos a formar uma imensa biblioteca de assuntos sulinos e mergulhar na cultura nativista (o que não o fez abandonar a paixão pelo jazz e música americana, tanto é que gravou "Summertime", dos irmãos Gershwin, no lp "Optimun In Habbeas Corpus, lançamento no próximo dia 19). Durante os seis meses que passou na Europa (janeiro/julho), pesquisou nas bibliotecas de Milão, Barcelona e Sevilha, voltando com documentação que comprova que o uso do chimarrão não nasceu nem no Rio Grande do Sul, nem em Guaíra - como havia colocado em sua tese -, mas em Tindiquera, Araucária, "ou seja bem pertinho de Curitiba".
Reportando-se à história e lembando que Gumercino Saraiva (José Higydio Farinha, Arroio Grande, 13/1/1852 - Santa Clara de Olimar, RS, 10/8/1894), ao liderar a Revolução Federalista, à frente dos Maragatos já defendia a República Sulina, Tramujas - que é curitibano mas criado em União da Vitória -, diz:
- Sou contra o Estado do Iguaçu mas totalmente favorável à República do Sul, Tchê!
Prova disso é que à frente de um grupo de amigos que faz sua happy hour no folclórico Bar Botafogo, no Alto das Mercês, Tramujas ali redigiu o anteprojeto da nova república, orientou Dino Mazarotto, dono do bar, a confeccionar 500 t-shirts com a frase "O Sul é o meu país" e junto com o catarinense Dante Mendonça, propôs que a nova moeda da República do Sul se chame "Píla".
- "Com o valor de uma por dez dólares"!
LEGENDA FOTO - Tramujas: a República do Sul de seus Sonhos
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